Esfera administrativa

MPF insiste em usar provas de acordo de leniência invalidadas pelo STF

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27 de março de 2024, 15h48

Utilizando o argumento de que a decisão do Supremo Tribunal Federal que invalidou as provas obtidas a partir do acordo de leniência da Odebrecht com a finada “lava jato” vale apenas para processos judiciais, o Ministério Público Federal do Paraná insiste em usar essas provas em procedimentos administrativos em andamento.

Odebrecht, hoje Novonor, tem recebido requisição de informações em procedimentos administrativos

O órgão tem solicitado à construtora informações obtidas por meio do sistema Drousys, as quais, conforme decidiu o ministro Dias Toffoli, são imprestáveis em qualquer âmbito ou grau de jurisdição do país.

Na visão do MPF, porém, os processos que tramitam na esfera administrativa não foram objeto da decisão judicial, primeiro porque não existe qualquer determinação do STF nesse sentido — o ministro Toffoli apenas disse que tais provas não podem ser usadas em quaisquer ações.

Segundo, porque a decisão determina que o exame sobre a necessidade de arquivar inquéritos e ações que estejam contagiados pelas provas inválidas deve ser feito pelo juízo natural do feito.

Procedimento administrativo

O esclarecimento foi feito à defesa da Novonor, nome assumido pela Odebrecht em 2020, nos autos de um procedimento administrativo aberto em 2015 pelo MPF paranaense com o propósito de “controle das cooperações internacionais do caso lava jato”.

Em 2023, o MPF solicitou à Novonor informações sobre a existência de contas vinculadas ao grupo financeiro no Principado de Andorra, além de documentos, extratos, procurações e solicitações de transferências.

A empresa, então, questionou se essa solicitação de informações estava de acordo com a decisão do STF que tornou imprestáveis os elementos de prova oriundos e derivados dos sistemas Drousys e MyWebDay.

Na resposta, o MPF apontou que a decisão do ministro Dias Toffoli não abrange procedimentos administrativos. E destacou que busca dados sobre pagamentos de propinas com relação a terceiros, não especificamente com a construtora.

Ministro Dias Toffoli invalidou todas as provas decorrentes da leniência da Odebrecht

Para a Novonor, no entanto, o MPF paranaense faz uma aparente tentativa de reduzir a eficácia da decisão do ministro Dias Toffoli, transferindo para si próprio o poder de decidir sobre a validade das informações já declaradas inválidas no STF.

Assim, a empresa peticionou ao Supremo um pedido de nulidade da requisição. E pediu também que o MPF seja obrigado a se abster de exigir a apresentação de provas já declaradas imprestáveis pela corte.

A construtora ainda destaca que, no despacho de resposta, o MPF declarou que, caso não esclareça se os dados que ela apresentou no acordo de leniência são fidedignos ou não, a validade do próprio acordo passaria a ser questionada.

A petição afirma que esse raciocínio visa a constrangê-la a convalidar atos jurídicos ilegais praticados por integrantes da “lava jato” e pelo juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, os quais levaram à invalidação das provas em questão.

Arquivos problemáticos

Segundo o MPF, os sistemas My Web Day e Drousys eram utilizados pelo departamento de operações estruturadas da Odebrecht. Dados desses sistemas foram usados para embasar ações penais contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No entanto, os peritos da Polícia Federal admitiram que os documentos copiados do “setor de operações estruturadas” da Odebrecht podem ter sido adulterados.

Foram constatadas inconsistências, como o fato de que documentos que incriminavam Lula tinham data posterior à sua data de apreensão na Suíça.

Também foi revelado em mensagens entre procuradores da “lava jato”, obtidas por hackers e apreendidas pela PF, que o material que embasou a acusação contra Lula em 2018 era transportado em sacolas de supermercado.

Em maio de 2023, o MPF paranaense destruiu, com autorização judicial, sete discos rígidos com as cópias dos sistemas da empreiteira, informações que foram extraídas em 2018 de uma cópia da Polícia Federal, cuja integridade era contestada.

O acordo de delação da Odebrecht — o maior da história da Justiça brasileira — foi homologado em 2017 e, apesar de fazer muito barulho, resultou em muitas nulidades e poucas condenações.

Rcl 43.007

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