Opinião

Dissidências do julgamento unânime da Suprema Corte sobre Donald Trump

Autor

  • Herick Feijó Mendes

    é advogado mestrando em Segurança Pública Cidadania e Direitos Humanos (UERR) especialista em Direito Público e ex-membro da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais (CFOAB).

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5 de março de 2024, 11h15

Ontem, dia 4 de março, a Suprema Corte dos Estados Unidos concluiu o julgamento Trump J. Donald v. Norma Anderson, Et. Al., revertendo a decisão do Tribunal do Colorado, no sentido de que a responsabilidade pela aplicação da Seção 3 contra titulares de cargos federais e candidatos cabe ao Congresso e não aos estados.

O Tribunal analisou a decisão do Colorado a partir da Seção 3 da Emenda XIV (1868) e da Seção 3 da Emenda XX (1933), que dizem o seguinte:

EMENDA XIV
Seção 3 Não poderá ser Senador ou Representante, ou eleitor do Presidente e Vice-Presidente, ou ocupar qualquer emprego civil ou militar subordinado ao Governo dos Estados Unidos ou de qualquer dos Estados aquele que, como membro da legislatura de um Estado, ou funcionário do Poder Executivo ou judiciário desse Estado, havendo jurado defender a Constituição dos Estados Unidos, tenha tomado parte em insurreição ou rebelião contra essa Constituição, ou prestado auxilio e apoio a seus inimigos. O Congresso pode, porém, mediante o voto de dois terços dos membros de cada uma das Câmaras, remover a interdição.

EMENDA XX
Seção 3 Se na época marcada para o início do período presidencial houver falecido o Presidente eleito, assumirá as funções de Presidente o Vice-Presidente eleito. Se não houver sido eleito o Presidente antes da época marcada para o início do período, ou se o Presidente eleito não preencher as qualificações exigidas, então o Vice-Presidente exercerá a Presidência até que um Presidente satisfaça as qualificações. No caso em que nem o Presidente nem o Vice-Presidente eleitos possuam as devidas qualificações, o Congresso, por lei, determinará quem deve agir como Presidente, ou como se fará a indicação, cabendo à pessoa designada assumir o cargo, até que um Presidente ou Vice-Presidente seja escolhido.

As teses levadas à Suprema Corte defendiam, por parte da defesa, que (argumento 1): A Seção 3 não desqualifica uma pessoa de concorrer a um cargo público; (argumento 2):  A Seção 3 indica que essa desqualificação é removível exclusivamente pelo Congresso Nacional; (Argumento 3): Mesmo que o Tribunal do Colorado esteja certo de que o Presidente Trump não possa assumir o cargo no dia da posse, aquele tribunal não tinha base para mantê-lo fora da disputa eleitoral e, posteriormente, buscar a remoção de suposta desqualificação pelo Congresso, podendo o vice-presidente exercer a função até uma possível desqualificação. (petição de Defesa)

A Suprema Corte finalizou o julgamento sobre o assunto, afirmando que a Secção 3 visava evitar tal ressurgimento, impedindo a cargo “aqueles que, uma vez tendo feito juramento de apoiar o Constituição dos Estados Unidos, posteriormente entrou em rebelião contra o governo dos Estados Unidos”. Cong. Globe, 41º Cong., 1ª Sess., 626 (1869) (2024, p. 1)

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Donald Trump

Enfatizou-se que “permitir a aplicação estatal da Secção 3 contra titulares de cargos federais e candidatos levantaria sérias questões sobre o alcance desse poder.

A justice Amy Coney Barrett concordou com a conclusão de que os estados não têm o poder de fazer cumprir a Secção 3 contra os candidatos presidenciais e disse que “não é o momento de ampliar o desacordo com estridência. O Tribunal resolveu uma questão politicamente carregada na época volátil de uma eleição presidencial. Particularmente nesta circunstância, os escritos sobre o Tribunal deveriam diminuir a temperatura nacional, não aumentar.” (2024, p.14)

Apesar da unanimidade da tese fixada, os justices Sonia Sotomayor, Elena Kagan e Ketanji Brown Jackson passaram a tratar dos pormenores por trás dessa concordância, demonstrando preocupação com o julgado.

Manifestaram-se dizendo que o tribunal não estava decidindo “apenas este caso, mas desafios que possam surgir no futuro”.

“Neste caso, o Tribunal deve decidir se o Colorado pode manter um candidato presidencial fora da votação com base no fato de que ele é um insurrecionista violador de juramento e, portanto, desqualificado para ocupar cargos federais nos termos da Seção 3 do a 14ª Emenda.”

Alertam os justices que “permitindo que o Colorado faça isso concordamos que criaria uma colcha de retalhos caótica estado por estado, em desacordo com os princípios do federalismo da nossa nação. Aquilo é suficiente para resolver este caso”. (2024, p. 15).

Os justices, com certa dissidência, destacam que “a maioria vai mais longe”.

“Embora ‘todos os nove membros do Tribunal’ concordem que esta justificativa independente e suficiente resolve este caso, cinco juízes continuam. Eles decidem novas questões constitucionais para isolar este Tribunal e o peticionário de futuras controvérsias. Embora apenas um Estado individualação está em questão aqui, a maioria opina sobre qual os intervenientes podem fazer cumprir a Secção 3 e como o devem fazer.” (2024, p. 16)

Enfatizam que o tribunal, talvez, esteja indo além da resolução do caso em si, anunciando que “uma desqualificação para a insurreição só pode ocorrer quando o Congresso aprova um tipo particular de legislação de acordo com a Seção 5 da 14ª Emenda”. “Ao fazê-lo, a maioria fecha a porta a outros meios potenciais de aplicação federal.” (2024, p. 16)

Esclarece-se, os justices “dissidentes” ao alargamento interpretativo, que “a seção 5 fornece ao Congresso o ‘poder de fazer cumprir [a Emenda] por meio de legislação apropriada'”. “Contudo, não é necessária legislação corretiva de qualquer tipo. Todas as alterações de reconstrução (incluindo o devido processo e garantias de proteção igualitária e proibição da escravidão) ‘são autoexecutáveis’, ou seja, que não dependem de legislação.” Cidade de Boerne v. Flores, 521 US 507, 524 (1997); veja Casos de Direitos Civis, 109 EUA 3, 20 (1883).

Continuam dizendo que

Da mesma forma, outras normas constitucionais de desqualificação, como o limite de dois mandatos na Presidência, não exigem legislação de implementação. (2024, p. 19-20). A importância democrática das emendas são devidamente avivadas pelos dissidentes, pois a “a Seção 3 desempenha um papel importante, embora raramente necessário na nossa democracia”. “O povo americano tem o poder de votar e eleger candidatos para cargos nacionais, e isso é uma coisa grande e gloriosa. Os homens que redigiram e ratificaram a 14ª Emenda, no entanto, testemunharam uma ‘insurreição [e] rebelião’ para defender a escravidão. Eles queriam garantir que aqueles que haviam participado naquela insurreição, e em possíveis insurreições futuras, não poderia retornar a papéis de destaque.” (2024, p. 19)

Os justices Sotomayor, Kagan e Jackson finalizam seus votos relatando que

Hoje, a maioria vai além das necessidades deste caso para limitar como a Seção 3 pode impedir que um insurrecionista violador de juramento se torne Presidente. Embora concordemos que o Colorado não pode fazer cumprir Seção 3, protestamos contra o esforço da maioria em usar este caso para definir os limites da aplicação federal dessa disposição.” (2024, p. 20).

Diferentemente do que se noticia, os votos dissidentes evidenciam que a unanimidade na conclusão de que a aplicação da Seção 3, contra titulares de cargos federais e candidatos, cabe ao Congresso e não aos estados, foi para além dos limites da resolução do caso, alargando restrições na fiscalização federal contra insurrecionistas.

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Referências

Fonte (Íntegra da Petição dos Advogados de Donald Trump): aqui

Decisão da Suprema Corte. Trump v. v. NORMA ANDERSON, ET AL. ON WRIT OF CERTIORARI TO THE SUPREME COURT OF COLORADO https://www.supremecourt.gov/opinions/23pdf/23-719_19m2.pdf

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