Estratégia defensiva

Suprema Corte ajuda Trump a procrastinar julgamento até após eleições

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2 de março de 2024, 8h53

A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos de conceder writ of certiorari ao pedido para julgar se presidentes são imunes a processos criminais por atos cometidos durante o mandato contém algumas implicações significativas. A mais óbvia delas é que a decisão ajuda a estratégia do ex-presidente Donald Trump de procrastinar o julgamento do caso de insurreição para depois das eleições presidenciais de 5 de novembro.

Donald Trump

Donald Trump deve ser candidato a presidente dos EUA neste ano

Na ordem de concessão de certiorari, a corte marcou para 22 de abril a primeira audiência de sustentação oral do processo. A decisão final do caso deverá ser anunciada até o fim de junho. Quando o processo regressar ao tribunal federal de primeiro grau, o juiz deverá conceder prazos para a acusação e a defesa protocolarem petições, cumprirem o processo de discovery, fazer audiências preliminares etc.

Assim, o julgamento poderá começar, com a seleção do júri, em agosto ou, mais provavelmente, em setembro. O Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) tem a política de não processar candidatos a 60 dias das eleições, mas a decisão de iniciar o julgamento ou não é do juiz. Se o julgamento acontecer e Trump for condenado, ele poderá recorrer ao tribunal federal de recursos.

Se o caso rolar até depois das eleições e Trump for eleito, ele poderá tomar medidas para encerrar o processo: poderá conceder a ele mesmo perdão presidencial (uma medida que ainda não tem precedente para se saber se é possível) ou poderá pedir ao procurador-geral que nomear para o DoJ que solicite à Justiça o trancamento do processo.

Outra vantagem para Trump, caso não seja condenado antes das eleições, é que ele não vai entrar na disputa eleitoral como um candidato criminoso, apesar de o juiz ter de se dar um prazo para proferir a sentença que, no caso, prevê pena de prisão. Enfim, tudo dependerá da capacidade — e da vontade — do juiz de acelerar os procedimentos judiciais, sob os protestos da defesa, que se empenhará para “enrolar” o caso tanto quanto possível.

Suprema Corte limita decisão

Um aspecto que intriga alguns juristas dos EUA é a limitação que a Suprema Corte impôs, em sua ordem de concessão de certiorari, a uma única questão que deverá decidir:

“A petição é concedida, limitada à seguinte questão: se e se for assim, até que ponto um ex-presidente goza de imunidade presidencial contra processo criminal por conduta que supostamente envolveu atos oficiais durante o seu mandato?”.

Como se vê, a corte limitou a questão da imunidade a “ex-presidente”, em vez de “presidentes” em geral. E não se propôs a decidir se o ex-presidente Trump se engajou em atos oficiais quando tentou subverter o resultado das eleições de 2020 e incitou seus seguidores a invadir o Congresso em 6 de janeiro de 2021, para impedir a certificação da vitória de Joe Biden. Nem a decidir qual é o âmbito de um ato oficial.

Para alguns juristas, essa é uma indicação de que a corte admite a possibilidade de responder “sim” à questão sobre se um presidente ou ex-presidente tem imunidade absoluta. Significaria dizer que um presidente poderia ordenar o assassinato de seus inimigos ou exilar seus adversários impunemente. Ele seria uma espécie de rei, o único cidadão acima da lei. Se a resposta for “sim”, os processos na Justiça Federal contra Trump serão trancados — e fim de história.

Porém, se a corte decidir que “não”, que um ex-presidente não é imune a processos criminais, prevalecem as decisões da juíza Tanya Chutkan, em primeiro grau, e do colegiado de três juízes do Tribunal Federal de Recursos, em Washington, D.C., que rejeitaram os argumentos da defesa de Trump. Isso já poderia ter acontecido se a Suprema Corte rejeitasse o pedido de certiorari para julgar o caso. O “não” desencadeia os procedimentos do processo criminal.

De qualquer forma, a Suprema Corte não teve a intenção explícita de ajudar a estratégia de Trump de procrastinar o julgamento. Foi consequência de uma decisão anterior. Em dezembro, a corte rejeitou o pedido do procurador especial do DoJ, Jack Smith, para julgar, em regime de urgência, se presidentes têm imunidade absoluta. A corte declarou que só examinaria o caso depois de o processo completar seu trâmite nos tribunais inferiores.

No processo contra Trump na Justiça Federal em Washington, classificado como “interferência eleitoral”, o ex-presidente responde por quatro crimes: conspirar para fraudar os Estados Unidos; obstruir um procedimento oficial; conspirar para obstruir um procedimento oficial; e conspirar para privar milhões de eleitores do direito de ter os seus votos contados.

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