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Busca e apreensão de menor não autoriza invasão e revista de domicílio, decide STJ

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8 de junho de 2023, 8h48

O cumprimento de mandado de busca e apreensão de menor que descumpriu medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade não autoriza o ingresso em seu domicílio, nem a revista em busca de drogas, por policiais militares.

Com esse entendimento e por maioria de votos, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado pela Defensoria Pública de Minas Gerais em favor de um homem condenado por porte de drogas e colaboração com grupo criminoso.

Rafael Luz/STJ
Relator, ministro Saldanha Palheiro aplicou jurisprudência da 6ª Turma sobre o tema
Rafael Luz/STJ

Esse homem foi alvo de mandado de busca e apreensão para explicar às autoridades por que havia descumprido a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade a que fora condenado quando era menor de idade. No momento do cumprimento do mandado, ele já havia completado 18 anos.

Quando os policiais chegaram ao local e foram recebidos na porta, escutaram o som de um rádio comunicador que estava em cima de uma televisão e que podia ser facilmente visualizado. Pelo aparelho, ouviram conversas relacionadas à função de olheiro do tráfico.

Esse fato motivou a invasão do domicílio e a busca, que culminou com a apreensão de 16 gramas de maconha e um grama de cocaína. As provas embasaram o oferecimento da denúncia e levaram à condenação a dois anos de reclusão, no regime aberto. A pena foi substituída por restritivas de direitos.

Dentro ou fora
Na 6ª Turma, a maioria considerou a ação policial ilegal porque os próprios agentes informaram que perceberam a presença do rádio comunicador quando já estavam dentro da residência. Assim, não havia justa causa para a entrada no local, nem mesmo diante do mandado de busca e apreensão.

Relator da matéria, o ministro Antonio Saldanha Palheiro apontou que o artigo 283, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal diz que, em cumprimento de mandado, a prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, "respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio".

"O ingresso na casa onde foram apreendidas as drogas e o rádio comunicador não teve fundadas razões, ao contrário, porquanto a expedição de mandado de busca e apreensão de menor não autoriza o ingresso no domicílio", resumiu o relator.

A votação reforçou a posição da 6ª Turma sobre o tema, já manifestada em outros casos, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico. Acompanharam o voto os ministros Sebastião Reis Júnior e Rogerio Schietti e o desembargador convocado Jesuíno Rissato.

Ficou vencida a ministra Laurita Vaz, para quem houve o encontro fortuito de provas. Assim, segundo ela, não houve um desvirtuamento do uso do mandado de busca e apreensão de menor, pois o rádio comunicador estava visível na sala e os policiais puderam escutar conversas.

"Ao flagrar a prática delitiva, era dever dos policiais atuar, ainda que de ofício, para coibi-la e comunicá-la aos órgãos competentes, sob pena de prevaricação", afirmou a ministra. "Dadas as peculiaridades do caso concreto antes explicitadas, não há falar em ilicitude da prova amealhada", concluiu ela no voto vencido.

Jurisprudência vasta
A análise da legalidade da invasão de domicílio por policiais militares é tema constante na pauta das turmas criminais do STJ. Caso após caso, elas vêm delineando os limites de identificação de fundadas razões para ingressar na casa de alguém sem mandado judicial.

No precedente mais incisivo, a 6ª Turma decidiu que a invasão só pode ocorrer sem mandado judicial e perante a autorização do morador se ela for filmada e, se possível, registrada em papel. A 5ª Turma também adotou a tese. Nesse ponto, a ordem foi anulada por decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, em dezembro de 2021.

Além disso, em outras situações, o STJ entendeu ilícita a invasão nas hipóteses em que a abordagem é motivada por denúncia anônima; pela fama de traficante do suspeito; por tráfico praticado na calçada; por atitude suspeita e nervosismo; cão farejador; perseguição a carro; ou apreensão de grande quantidade de drogas.

Também anulou as provas quando a busca domiciliar se deu após informação dada por vizinhos e depois de o suspeito fugir da própria casa ou fugir de ronda policial. Em outro caso, entendeu ilícita a apreensão feita após autorização dos avós do suspeito para ingresso dos policiais na residência.

O STJ também decidiu que o ingresso de policiais na casa para cumprir mandado de prisão não autoriza busca por drogas. Da mesma forma, a suspeita de que uma pessoa poderia ter cometido o crime de homicídio em data anterior não serve de fundada razão para que a polícia invada o domicílio de alguém.

Por outro lado, o ingresso é lícito quando há autorização do morador ou em situações já julgadas, como quando ninguém mora no local; se há denúncia de disparo de arma de fogo na residência ou flagrante de posse de arma na frente da casa; se é feita para encontrar arma usada em outro crime — ainda que por fim não a encontre —; se ocorrer em diligência de suspeita de roubo; ou se o policial, de fora da casa, sente cheiro de maconha, por exemplo.

REsp 2.009.839

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