Com ajuda da Suprema Corte, estratégia de defesa de Trump começa a funcionar
25 de dezembro de 2023, 13h55
A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos de rejeitar o pedido de certiorari, feito pelo Departamento de Justiça (DOJ), para julgar, em regime de urgência, se presidentes têm imunidade absoluta contra processos criminais, deu uma ajuda à estratégia de defesa do ex-presidente Donald Trump — mesmo que essa não tenha sido a intenção.
Até o momento, Trump enfrenta quatro processos criminais, com 91 acusações, para os quais tem uma estratégia de defesa principal: matar todos com uma cajadada só. A estratégia consiste em impedir que os processos sejam julgados antes de ser eleito presidente em novembro de 2024, no que ele aposta — o que é possível, segundo as pesquisas de intenção de voto.
Ao tomar posse, ele poderá fazer duas coisas: 1) conceder a ele mesmo perdão presidencial; ou 2) ordenar ao Departamento de Justiça que providencie o trancamento de todos os processos, com base na política já estabelecida de que um presidente, enquanto ocupa o cargo, não pode ser processado criminalmente.
É uma estratégia que pode dar certo, se seus advogados continuarem a ter sucesso na tática de criar empecilhos, no tanto que as leis lhes permitem, para adiar, adiar e adiar todos os procedimentos judiciais pelo menos até 30 de junho de 2024 — o dia em que se encerra o ano judicial 2023-2024.
Tudo poderá ficar pendente até o dia em que a Suprema Corte, mais uma vez com a batata quente nas mãos, decida uma questão fundamental: se Trump é ou não protegido por imunidade presidencial absoluta contra processos criminais, considerando que suas palavras e ações, em seus esforços para reverter o resultado das eleições presidenciais de 2020, incluindo sua responsabilidade pela invasão do Congresso em 6 de janeiro de 2021, ocorreram em um tempo em que ele era presidente do país.
Por enquanto, a questão volta a tramitar no Tribunal Federal de Recursos do Distrito de Colúmbia, em Washington — um julgamento que o procurador especial do DOJ, Jack Smith, tentou pular, fazendo um pedido de emergência à Suprema Corte para conter as táticas de adiamento dos advogados de Trump.
Em primeiro grau, a juíza federal Tanya Chutkan negou a reivindicação de imunidade de Trump. “Quatro anos de serviço como chefe do Executivo não garantem a ele o direito divino dos reis de escapar da responsabilidade criminal que governa os cidadãos”, escreveu em sua decisão.
Agora, todos os olhos se concentram no calendário. O tribunal de recursos já deu prazos para as partes apresentarem argumentos por escrito e marcou para 9 de janeiro a audiência de sustentação oral. No sábado (23/12), a defesa de Trump protocolou sua petição alegando que ele agiu dentro de suas funções de presidente, para “assegurar a integridade das eleições, quando alegadamente tentou reverter o resultado da eleição”.
A petição alega ainda que as denúncias contra Trump são inconstitucionais porque presidentes não podem ser processados criminalmente por seus “atos oficiais”, a não ser que sofram impeachment pelo Congresso.
“Antes que qualquer procurador possa processar um presidente por sua conduta, a Câmara dos Deputados precisa aprovar o impeachment e o Senado tem de condená-lo. O Senado absolveu Trump.”
Tempo contado
Votando ao calendário: se sair uma decisão rápida, como até o fim do mês, o próximo passo depende do que for decidido pelo colegiado de três ministros — um nomeado pelo republicano George Bush e dois nomeados pelo democrata Joe Biden. Se a decisão for a favor de Trump, o DOJ vai recorrer à Suprema Corte. Se for contra Trump, seus advogados vão recorrer ao tribunal pleno do próprio tribunal de recursos.
Se o tribunal pleno aceitar julgar o caso, algumas semanas ou um mês poderão decorrer até que saia uma decisão — pode ser, por exemplo, até o final de fevereiro. Qualquer que seja a decisão, a parte inconformada vai recorrer à Suprema Corte — para o que tem um prazo de 90 dias. Se for Trump, seus advogados certamente usarão os três meses a que têm direito (pode ser março, abril e maio).
A Suprema Corte terá, então, de decidir, mais uma vez, se concede certiorari ou não aos peticionários, o que poderá durar alguns dias ou semanas. Mas, provavelmente, não haverá tempo para, no restante de junho, fazer a audiência de sustentação oral, uma conferência dos ministros para apurar os votos previstos e escolher um relator, a redação dos votos e, finalmente, a divulgação da decisão.
A corte o fará, provavelmente, no próximo ano judicial (2024-2025), que se inicia nos primeiros dias de outubro. Costumeiramente, os ministros programam as audiências de sustentação oral para o primeiro semestre do ano judicial e os demais procedimentos para o segundo — isto é, a qualquer tempo, até 30 de junho de 2025. Se eleito, Trump tomará posse em 20 de janeiro de 2025 — e já terá feito as manobras imaginadas para se livrar dos processos.
Esses são os cálculos em que se baseia a estratégia de defesa de Trump para resolver pelo menos boa parte de seus imbróglios jurídicos de uma maneira mais simples. No entanto, a realidade pode ser outra. Por exemplo, os juízes do tribunal de recursos (colegiado e tribunal pleno) podem agir de forma expedita, para que o processo aterrisse na Suprema Corte em tempo recorde.
A Suprema Corte, por sua vez, poderá decidir não decidir, deixando a decisão final do tribunal de recursos prevalecer, qualquer que seja ela. Essa é uma opção mais atraente para os ministros conservadores-republicanos da corte, caso o tribunal de recursos decida contra Trump.
Isso porque será menos constrangedor para eles — três dos quais foram nomeados por Trump — se livrar de assinar votos contra Trump se concluírem antecipadamente que o ex-presidente não tem direito à imunidade presidencial absoluta. Bastará o despacho conciso de sempre: “Pedido de certiorari negado” — e ninguém saberá exatamente por quem e por quê.
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