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STF ordena inspeção em desocupação em SP que pode afetar 800 famílias

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20 de abril de 2024, 16h34

Por constatar descumprimento de precedente vinculante da corte, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal determinou, em um caso de desocupação, o cumprimento das regras estabelecidas em um julgamento do Plenário, o que inclui a inspeção judicial. A sessão virtual se encerrou nesta sexta-feira (19/4).

Caso voltou ao Supremo Tribunal Federal  em uma segunda reclamação

O caso é o da reintegração de posse de um terreno no distrito de Cidade Líder, na Zona Leste da cidade de São Paulo, que pode afetar 800 famílias socioeconomicamente vulneráveis.

Primeira reclamação

Em 2021, a Defensoria Pública paulista e o Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos ajuizaram uma reclamação no STF para contestar decisões da Justiça estadual que haviam ordenado a reintegração de posse de uma porção de terra pertencente a um empreendimento imobiliário.

Os autores da ação alegaram que não foram tomadas as medidas necessárias para realocar as famílias em condições adequadas, sobretudo em relação ao isolamento social, conforme decidido pelo STF à época.

Em junho daquele ano, o ministro Luís Roberto Barroso havia suspendido desocupações de áreas que já eram habitadas antes da crise de Covid-19.

Em setembro de 2021, o ministro Alexandre de Moraes, relator da reclamação, determinou a suspensão da reintegração de posse na Cidade Líder. Ele constatou evidências de que a operação estava sendo planejada sem as cautelas previstas na decisão de Barroso.

Informações corroboradas pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e pelo Ministério Público estadual indicavam que reuniões preparatórias feitas no batalhão da Polícia Militar não se destinaram ao cumprimento das condições impostas pelo STF, mas apenas à organização das forças policiais para o cumprimento da reintegração de posse.

Mesmo assim, a 1ª Vara Cível do Foro Regional de Penha de França, na capital paulista, ordenou novamente o cumprimento imediato da reintegração de posse. O Tribunal de Justiça de São Paulo negou efeito suspensivo e a operação foi retomada.

Segunda reclamação

No mês de novembro de 2022, o Plenário do STF determinou um regime de transição a ser adotado para retomada das desocupações. Uma das condições estipuladas para isso foi a promoção de inspeção judicial prévia às reintegrações de posse.

Em seguida, uma nova reclamação apresentou o argumento de que o cumprimento da reintegração de posse na Cidade Líder vinha ocorrendo sem inspeção judicial. A inicial também indicou que não foram esgotadas as alternativas de mediação e reiterou a falta de medidas para realocação das famílias.

Já no último mês de março, Alexandre, novamente relator, rejeitou a segunda reclamação. O magistrado entendeu que não houve descumprimento da decisão mais recente do Plenário quanto às desocupações.

Na ocasião, o ministro apontou que o juízo de primeiro grau cumpriu a decisão do STF e enviou o processo à Comissão de Conflitos Fundiários. A tentativa de conciliação não deu certo, e só então a vara determinou a reintegração de posse “com suporte necessário de encaminhamento das famílias a locais de acolhimento, para a execução pacífica da desocupação”.

Na sequência, foram apresentados embargos de declaração que reiteraram os argumentos da reclamação e alegaram que Alexandre não os havia analisado.

Julgamento colegiado

A maioria da 1ª Turma divergiu do relator e determinou a inspeção judicial na reintegração de posse na Cidade Líder. Prevaleceu o voto do ministro Cristiano Zanin, acompanhado pelos ministros Flávio Dino e Luiz Fux.

Zanin lembrou que a inspeção judicial prévia foi uma condição estabelecida pelo STF na decisão de 2022. Ele apontou que a vara cível afastou a necessidade de tal procedimento, com o argumento de que seria desnecessário.

A decisão de primeiro grau dizia que a inspeção era “mais um instrumento da Comissão de Soluções Fundiárias na tentativa de mediação”. O juízo entendeu que as tentativas de mediação já haviam sido empreendidas e não considerou que a inspeção poderia alterar a situação.

Mas, na visão de Zanin, “a mera realização de audiências de mediação” no Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse (Gaorp) do TJ-SP “não é suficiente para dispensar a realização da inspeção judicial”.

O ministro ainda ressaltou que o caso envolve mais de 800 famílias, com crianças, adolescentes e idosos. Isso torna a inspeção judicial “ainda mais relevante”, pois permitirá que o Judiciário e os demais envolvidos “possam participar de eventual reintegração forçada com pleno conhecimento do local e das pessoas que lá estão”.

Ficaram vencidos Alexandre, que ratificou os fundamentos de sua decisão de março, e a ministra Cármen Lúcia, que acompanhou o relator.

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Rcl 66.502

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