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STF tem maioria a favor de regra que exclui petróleo e derivados do regime fiscal da ZFM

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8 de março de 2024, 9h44

Sem constatar alteração no cenário legal, o Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria, nesta sexta-feira (8/3), para validar a regra que excluiu as operações com petróleo e derivados do regime fiscal da Zona Franca de Manaus (ZFM). A sessão virtual se encerrará oficialmente às 23h59.

Lei de 2021 retirou operações com petróleo e derivados do regime fiscal da ZFM

Prevalece o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso. Até o momento, ele já foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luiz Edson Fachin, Flávio Dino e André Mendonça.

Contexto

A Zona Franca de Manaus tem um regime de benefícios e incentivos fiscais voltados à preservação do desenvolvimento regional. A ideia é induzir investimentos na região. Até 2073, o local é uma área livre de comércio, exportação e importação.

Apesar disso, a Lei 14.183/2021 definiu que o regime não se aplica às exportações, reexportações, importações e operações feitas dentro do território nacional com petróleo, lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo por empresas localizadas na ZFM. A norma alterou o Decreto-lei 288/1967, que regulava a ZFM à época.

O partido Cidadania contestou a regra de 2021 no STF. Segundo a legenda, a medida violou o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que mantém a ZFM até 2073.

De acordo com a agremiação, a legislação pode apenas aumentar o nível dos incentivos, mas nunca eliminá-los ou reduzi-los. Outro argumento usado foi que a exclusão da isenção é contrária ao objetivo de diminuir as desigualdades regionais.

Voto do relator

Barroso lembrou que o STF já definiu o ADCT como um “obstáculo constitucional a toda política que, de algum modo, possa implicar o esvaziamento do estímulo de desenvolvimento da Zona Franca de Manaus”.

Segundo o magistrado, o decreto-lei de 1967 “representa o quadro normativo pré-constitucional de incentivo fiscal à ZFM”, que “foi alçado à estatura constitucional” pelo ADCT.

A redação original do artigo 37 do decreto-lei (alterado pela lei de 2021) dizia que as regras não se aplicavam ao estabelecido na legislação da época sobre a importação, exportação e tributação de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo.

Para Barroso, com a alteração de 2021, “não houve inovação jurídica redutora do alcance da proteção constitucional deferida à ZFM”.

Na sua visão, a norma apenas “reproduziu o mesmo teor das exceções ao tratamento fiscal favorecido naquela região” e explicitou ou aperfeiçoou a redação de 1967.

O relator ainda destacou que “a assimetria tributária na importação de combustíveis e a aquisição de significativa vantagem competitiva por importadores localizados na Zona Franca podem ocasionar indesejável desequilíbrio concorrencial nesse segmento econômico nas demais regiões do país”.

Legislação da época

Regra de 2021 abrange operações com combustíveis derivados do petróleo

Já Toffoli votou por declarar a inconstitucionalidade das novas regras. Ele destacou dois pontos da redação de 1967.

O primeiro é que o artigo 37 mencionava apenas “lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo”, mas não o petróleo de forma isolada — “o qual não se confunde com os produtos dele derivados”.

Ou seja, a redação original não previa exceção ao petróleo, que era, sim, alcançado pelos incentivos fiscais estabelecidos para a ZFM.

Assim, segundo o magistrado, a lei não poderia ter revogado a aplicação dos incentivos para operações com petróleo. Ao fazer isso, ofendeu o ADCT.

O outro ponto é que o artigo 37 tinha uma limitação temporal, pois definia que as regras não se aplicavam à “legislação atual” — ou seja, a legislação de 1967 sobre importação, exportação e tributação de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo.

Por outro lado, de acordo com Toffoli, pela redação da época, os incentivos da ZFM se aplicavam às legislações posteriores sobre tributação de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo.

Desta forma, quando entrou em vigor o sistema tributário inaugurado pela Constituição de 1988, os efeitos da limitação temporal estabelecida em 1967 já estavam esgotados, pois já existiam legislações posteriores sobre tributação de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo.

Toffoli listou as diferenças do sistema tributário nacional em 1967 e atualmente. À época, existia, por exemplo, o imposto único sobre lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos, de competência da União.

Mas, com a Constituição de 1988, esse imposto deixou de existir e surgiram novas legislações sobre tributação. Hoje, são os estados e o Distrito Federal que cobram ICMS sobre os produtos em questão, enquanto a União pode cobrar imposto de importação e de exportação. De lá para cá, a legislação sobre o imposto de exportação também passou por mudanças.

“É evidente que as novas legislações tributárias, incluídas as do ICMS, não estão abarcadas por aquela ‘legislação atual’ a que fazia referência a redação original do artigo 37”, assinalou.

Além disso, o PIS e a Cofins ainda não existiam em 1967. Portanto, na interpretação de Toffoli, o PIS e a Cofins sobre lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo estão sujeitos aos incentivos fiscais da ZFM.

Como a exportação de mercadorias para consumo ou industrialização na ZFM equivale à exportação para o exterior e as receitas de exportação são imunes ao PIS e à Cofins, esses tributos não podem ser cobrados sobre receitas decorrentes da exportação de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo para consumo na ZFM.

Em resumo, “quando da entrada em vigor do sistema tributário nacional previsto na Constituição Federal de 1988, as operações com petróleo ou lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de petróleo gozavam sim dos favores fiscais previstos no Decreto-Lei 288/1967, não podendo elas serem excluídas dessas benesses pelo legislador ordinário”.

O ministro concluiu que a lei de 2021, ao revogar a cláusula de limitação temporal estabelecida em 1967, violou o ADCT, o que a torna inconstitucional.

Toffoli foi acompanhado por Luiz Fux.

Ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no STF

Jabuti

Kassio Nunes Marques também votou pela inconstitucionalidade das regras de 2021. Ele concordou com parte da fundamentação de Toffoli, mas também acrescentou novos argumentos.

O ministro confirmou que o petróleo “não se confunde” com lubrificantes ou combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo. Assim, para ele, quando a lei incluiu o petróleo na lista das exceções ao regime da ZFM, diminuiu a aplicação dos incentivos e violou o ADCT.

“Cada nova política setorial que retire isenções e, portanto, modifique a natureza da ZFM precisa compor um quadro de adequado planejamento, não podendo traduzir, como parece nesta hipótese, uma norma avulsa e encaixada em projeto de conversão de MP”, pontuou.

Nunes Marques ainda definiu as novas regras como “jabutis legislativos”. Isso porque a lei de 2021 foi resultado da conversão de uma medida provisória do mesmo ano, que não tinha relação com a ZFM.

A MP 1.034/2021 aumentava a alíquota da CSLL de empresas do setor financeiro, modificava a isenção de IPI para pessoas com deficiência na compra de automóveis, revogava a tributação especial relativa à nafta e a outros produtos destinados a centrais petroquímica e instituía crédito presumido de PIS e Cofins para produtos usados em hospitais, clínicas, consultórios médicos e campanhas de vacinação.

Durante a tramitação do projeto de conversão da MP em lei, foram incluídos os trechos sobre a exclusão das operações com petróleo e derivados do regime fiscal da ZFM. Ou seja, um tema estranho à MP se tornou lei.

O ministro explicou que uma MP tem uma tramitação própria e abreviada, “inerente ao caráter imediatista que lhe é peculiar”. Por isso, exige-se “correlação do tema do texto originário” com o produto final.

“Não se pode converter a tramitação excepcional da medida provisória em atalho ao devido processo legislativo, inserindo-se conteúdo a ela estranho, ou mesmo impertinente, sob o risco de criar-se, de maneira açodada, normas sem a reflexão e a deliberação intrínsecas ao princípio democrático”, concluiu.

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ADI 7.239

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