Prática reiterada

MP-RJ pede apuração sobre omissões de informações de árbitro da venda da Eldorado

 

25 de janeiro de 2024, 18h48

O Ministério Público pediu nesta terça-feira (23/1) que a 11ª Vara Criminal do Rio de Janeiro determine novo interrogatório do advogado Anderson Schreiber para a polícia verificar se há um padrão de conduta dele “a configurar o cometimento reiterado de ações ou omissões penalmente relevantes” no exercício da atividade de árbitro.

Árbitro que validou a venda da Eldorado Celulose omitiu informações

O caso tem como pano de fundo a disputa entre a J&F Investimentos e a Paper Excellence pelo controle acionário da Eldorado Brasil Celulose. O valor da multa imposta à J&F pelo acordo de leniência firmado com lavajatistas obrigou o grupo a vender empresas, e a Eldorado entrou no pacote para salvar o conglomerado.

Porém, a violação de itens do contrato de compra pela Paper Excellence levou a J&F a questionar a transação, mas uma câmara arbitral determinou, em 2021, que o controle acionário da Eldorado fosse transferido para a Paper Excellence. Anderson Schreiber atuou como árbitro nesse julgamento.

A 2ª Câmara de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) suspendeu a decisão por indícios de falta de imparcialidade do advogado. Schreiber omitiu relações com o escritório Stocche Forbes Advogados, representante da Paper Excellence, e também deixou de revelar outros impedimentos para julgar o caso que tem como parte a J&F. Entre os indícios levados em consideração pelo TJ-SP estão o compartilhamento de espaço físico, linhas telefônicas e recepcionista — ou seja, custos — entre Anderson Schreiber e o Stocche Forbes.

Depois da decisão do TJ-SP, Schreiber renunciou ao posto de árbitro do processo por meio de uma carta de 40 páginas enviada à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI). No texto, o advogado minimizou os fatos, mas não os negou, e abandonou o caso.

Investigação criminal
A Polícia Civil do Rio de Janeiro abriu inquérito para investigar se Schreiber havia omitido vínculos com o Stocche Forbes e outras informações relevantes, e, com isso, praticado o crime de falsidade ideológica. A apuração foi arquivada, mas o MP-RJ aceitou o pedido de sua retomada feito pela J&F com base em novas informações.

A companhia citou notícias que apontam que Schreiber praticou irregularidades em outros casos em que atuou como árbitro, incluindo um procedimento envolvendo a JBS, controlada pela J&F. No principal deles, o advogado renunciou à presidência do processo arbitral de quase R$ 1 bilhão em que acionistas minoritários da Petrobras cobram da empresa indenização por prejuízos causados por denúncias da extinta “lava jato”. Estima-se que o valor de mercado da petrolífera tenha caído de R$ 600 bilhões para R$ 100 bilhões devido à ação da República de Curitiba.

Schreiber e seu sócio, Eduardo Gomes Matoso, participaram da criação de uma entidade de acionistas minoritários — e da decisão da associação de processar a Petrobras. A ata da assembleia extraordinária da associação que aprovou a decisão de entrar na Justiça, datada de 24 de junho de 2016, é assinada por Matoso como advogado. Nada disso foi informado por Schreiber, que depois renunciou ao caso.

Ao ordenar a reabertura do inquérito, o procurador-geral de Justiça do Rio, Luciano Mattos, afirmou que o caso exige uma investigação mais aprofundada para apurar “um modus operandi de Schreiber”, que pode indicar “uma conduta reiterada” a “apontar um padrão de conduta em não revelar informação importante para se ver nomeado como juiz arbitral”.

Mattos ordenou ao promotor do caso “sopesar todos os elementos de prova e verificar, no contexto, se há um padrão de conduta do noticiado em sede arbitral, a configurar o cometimento de ação ou omissão penalmente relevante”.

Dessa maneira, o promotor Alexandre Themístocles pediu que a 11ª Vara Criminal do Rio determine que a Delegacia de Defraudações faça, em até 90 dias, “nova oitiva de Anderson Schreiber e minuciosa averiguação de sua vida pregressa (artigo 6º, incisos V e IX, do CPP), devendo a autoridade policial, com discrição e prudência, escrutinar sua atuação profissional, avaliando sua conduta na totalidade, levando em consideração todas as ocorrências registradas contra ele (ROWeb, Folha de Antecedentes Criminais, OAB, Receita Federal, Portal da Segurança, INFOSEG, etc…), nos últimos 20 anos, em especial as que envolvam a Petrobras, de modo a verificar se há um padrão de conduta do noticiado a configurar o cometimento reiterado de ações ou omissões penalmente relevantes”.

Além disso, o promotor requereu nova oitiva de Eduardo Matoso e Aurélio Valporto, mencionados nas reportagens sobre as irregularidades de Schreiber, e análise da documentação apresentada pela J&F.

Procurado pela revista eletrônica Consultor Jurídico, Anderson Schreiber não se manifestou até a publicação desta reportagem.

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Processo 0030615-96.2022.8.19.0001

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