Imunização coletiva

Vacinação obrigatória é constitucional

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17 de dezembro de 2020, 20h19

O Estado pode determinar que a vacinação da população seja obrigatória, inclusive contra a Covid-19, sendo afastadas medidas invasivas como o uso da força para exigir a imunização. O entendimento foi firmado pelo Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (17/12). 

Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Ministros definiram que Estado tem o dever de vacinar a população
Marcello Casal Jr./Agência Brasil

O colegiado definiu que a vacinação compulsória pode ser implementada por medidas indiretas, como a restrição ao exercício de certas atividades ou à presença em determinados lugares.

Também foi definido que pais são obrigados a levar os filhos para vacinação conforme prevê o calendário de imunização, devendo ser afastadas convicções filosóficas.

Foram analisadas em conjunto duas ações diretas de inconstitucionalidade, que tratavam da vacinação contra a Covid-19, e ainda um recurso extraordinário. Prevaleceram os entendimentos dos relatores, ministros Ricardo Lewandowski e Luís Roberto Barroso, respectivamente.

Ontem, em um voto longo, Lewandowski afirmou que o Estado é obrigado a proporcionar a toda a população interessada o acesso à vacina para prevenção da Covid-19. A saúde coletiva, disse, "não pode ser prejudicada por pessoas que deliberadamente se recusam a ser vacinadas, acreditando que, ainda assim, serão egoisticamente beneficiárias da imunidade de rebanho". 

Hoje, ele recebeu elogios de seus pares pela profundidade da análise. Os ministros concordaram com que as limitações podem ser implementadas tanto pela União como pelos estados e municípios. Todos reforçaram que o fato de a vacinação ser compulsória não significa vacinação forçada. 

No julgamento das ações, o placar foi de 10 votos contra 1. Vencido, Nunes Marques apresentou ressalvas sobre a obrigatoriedade, defendendo que ela é "medida extrema, apenas para situação grave e cientificamente justificada e esgotadas todas as formas menos gravosas de intervenção sanitária". Defendeu que a vacinação obrigatória pode ser sancionada por medidas indiretas, como a imposição de multas.

Decisão unânime
Nesta quinta, Barroso defendeu que o direito à saúde coletiva e, particularmente, das crianças e dos adolescentes, deve prevalecer sobre a liberdade de consciência e de convicção filosófica. Caracteriza como ilegítimo que, em nome de um direito individual, frustre-se o direito da coletividade. 

O recurso analisado discute se pais podem deixar de vacinar seus filhos menores de idade, com fundamento em convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais. Na origem, pais veganos e contra intervenções médicas invasivas deixaram de cumprir o calendário de vacinação determinado pelas autoridades sanitárias.

Segundo Barroso, no entanto, "o poder familiar não autoriza que os pais, invocando convicção filosófica, coloque em risco a saúde dos filhos". Para o ministro, este é um dos raros casos em que se justifica o Estado ser paternalista. 

A tese fixada, de repercussão geral, foi a seguinte: "É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no programa nacional de imunizações; (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei; (iii) seja objeto de determinação da união, estados e municípios, com base em consenso médico científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar".

O ministro foi acompanhado por unanimidade.

Tese em ADI
A corte também inovou ao fixar tese em ação direta de inconstitucionalidade, quando a praxe é a de não definir teses em ações de controle abstrato, conforme lembraram os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. 

Foi definido que:

"(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, porquanto facultada sempre a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e

i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes,
(ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes,
(iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas,
(iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade e
(v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente;

(II) tais medidas, com as limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência."

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ADIs 6.586 e 6.587
ARE 1.267.879

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