Opinião

A fiscalização do acesso à biodiversidade no Brasil: resultados e perspectivas

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4 de janeiro de 2024, 15h25

Em 2021, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) deflagrou uma ampla operação fiscalizatória com o objetivo de verificar o cumprimento da legislação de acesso à biodiversidade brasileira e da repartição de benefícios explorados em locais protegidos. Denominado “Terra Brasilis”, esse trabalho envolveu tanto visitas in loco quanto a solicitação de informações, mediante envio de notificações, em diversos estados brasileiros.

Esse foi o primeiro grande esforço concentrado de fiscalização do Ibama envolvendo a Lei 13.123/2015, o novo marco legal da biodiversidade brasileira. Embora tenha entrado em vigor no fim de 2015, sua efetiva implementação, no início, dependia da adoção de uma série de ações — materiais e de regulamentação — pelo governo, e do cumprimento de determinadas obrigações de transição pelos usuários, incluindo a regularização de suas atividades. Por isso, foi natural que órgãos de fiscalização aguardassem um tempo antes de dar início às averiguações de cumprimento, o que só ocorreu em 2021.

Levantamento feito via Lei de Acesso à Informação sobre a chamada “Operação Terra Brasilis” demonstra que, desde o seu início, 78 autos de infração já foram lavrados pelo Ibama contra 47 empresas diferentes. Entre as penalidades já aplicadas estão duas advertências e diversas multas, em valores arbitrados entre menos de R$ 1 mil e mais de R$ 4 milhões, sendo R$ 260,4 mil o valor médio de cada auto de infração.

As infrações à Lei 13.123/2015 identificadas pelo Ibama até aqui foram: (1) exploração de produto acabado sem notificação prévia no Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (SisGen); (2) a comercialização de produto intermediário sem cadastro de acesso; (3) a ausência de regularização no prazo legal previsto no artigo 38; e (4) remessa em desacordo com as exigências legais. Por outro lado, verifica-se que não houve registro de descumprimento das regras relativas ao acesso ao conhecimento tradicional associado, a pedidos de propriedade intelectual ou ao pagamento de repartição de benefícios.

Além dessas infrações específicas, a operação também identificou o descumprimento de outras normas ambientais, o que gerou respectivas autuações. Em especial pelo desenvolvimento de atividades sem licença de operação; armazenamento inadequado de produtos perigosos; e ausência ou inadequação do Cadastro Técnico Federal (CTF). Nesse último caso, chama atenção o número de autuações relacionadas à não inclusão das categorias específicas relativas ao acesso ao patrimônio genético no CTF e à ausência e/ou atraso no envio dos Relatórios Anuais de Atividades Potencialmente Poluidoras e Utilizadoras de Recursos Ambientais.

As empresas autuadas pertencem aos setores de cosméticos, químico (incluindo ingredientes para cosméticos), alimentos, saneantes e farmacêutico. Elas estão localizadas em todas as cinco regiões do Brasil, mais precisamente nos estados de São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Pernambuco, Sergipe, Ceará, Piauí, Paraíba, Tocantins, Pará e Rondônia.

Apesar dos resultados já alcançados, a operação do Ibama ainda não foi finalizada. Por isso, novos autos de infração podem ser lavrados tanto nas fiscalizações em curso quanto em ações ainda a ocorrer. Vale ressaltar que, de acordo com o Plano Nacional Anual de Proteção Ambiental aprovado pelo órgão para 2024, constam entre as diretrizes aprovadas fiscalizar: (a) as atividades de acesso ao patrimônio genético nacional em desacordo com a Lei nº 13.123/2015 e o Decreto nº 8.772/2016, com vistas a assegurar a soberania nacional sobre os seus recursos genéticos; (b) o acesso ilegal ao conhecimento tradicional associado em terras indígenas, quilombolas ou de comunidades tradicionais visando assegurar os direitos dos povos e comunidades tradicionais sobre seu conhecimento associado ao patrimônio genético; e (c) a devida repartição de benefícios pela exploração econômica de produtos oriundos do acesso ao patrimônio genético nacional ou do conhecimento tradicional associado.

Tudo isso reforça a relevância do adequado conhecimento da legislação de acesso à biodiversidade brasileira, em especial a Lei 13.123/2015, o seu regulamento e as normativas editadas pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen), assim como do cumprimento das obrigações previstas na lei por todas as empresas e entidades que utilizam espécies da biodiversidade em suas atividades. Como a própria operação do Ibama mais uma vez demonstrou, essas normas são transversais e de ampla abrangência, alcançando setores diversos localizados em todas as regiões brasileiras.

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