Opinião

Impossibilidade de reparação civil do dano ambiental por processo administrativo

Autores

  • Fernanda Barreto Campello Walter

    é advogada com atuação no contencioso e consultivo ambiental mestre em Direito Internacional e Relações Internacionais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa pós-graduada em Ciências Criminais pela UFPE MBA em Agronegócio pela USP-Esalq (em andamento) e graduada em Direito pela UFPE.

  • Bruna Maria Nunes Lima

    é graduanda em Direito pela FDR/UFPE e técnica em Meio Ambiente pela Escola Técnica Estadual Almirante Soares Dutra (Teasd).

7 de maio de 2024, 19h33

A responsabilidade por danos ambientais é tríplice e independente. Isso porque o mesmo dano ambiental pode ensejar a responsabilidade do agente poluidor nas esferas cível, administrativa e penal, separadamente, conforme prevê a Constituição Federal no §3° de seu artigo 225.

Arquivo/Agência Brasil

Assim, enquanto independentes, as três responsabilidades possuem características distintas. A responsabilidade civil ambiental é objetiva à luz do §1° do artigo 14 da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei n° 6.938/81), ou seja, a obrigação de reparar o dano independe da comprovação de intenção ou culpa do agente de causar os danos.

Além da previsão legal, a natureza objetiva da responsabilidade civil ambiental é ponto pacífico no Superior Tribunal de Justiça, desde o julgamento dos Temas Repetitivos 681 (Recurso Especial n° 1.354.536/SE) e 707 (Recurso Especial 1.374.284/MG).

A seu turno, a responsabilidade penal ambiental possui natureza subjetiva, isto é, depende da comprovação de culpa ou dolo do agente, consubstanciados em negligência, imprudência, imperícia ou a intenção de causar o dano, de acordo com o artigo 2° da Lei de Crimes Ambientais (Lei n° 9.605/1998). O mesmo ocorre em relação à responsabilidade administrativa ambiental que também segue a lógica subjetiva, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n° 1.318.051/RJ em 2019.

Pretensão para reparação do dano

Cabe destacar uma outra distinção entre as esferas da responsabilidade por danos ambientais: a pretensão do Estado de reparação do dano ambiental na esfera cível é imprescritível, ou seja, inexiste prazo determinado para que o agente causador do dano ambiental possa vir a ser responsabilizado. O Supremo Tribunal Federal fixou esse entendimento por meio do julgamento do Tema 999 (Recurso Extraordinário 654.833/AC) da seguinte forma: “é imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental”.

Spacca

O mesmo não ocorre na esfera administrativa, na qual a pretensão para a reparação do dano ambiental prescreve em cinco anos a contar da prática do ato danoso, ou sendo este continuado em relação ao meio ambiente, a contar do dia em que tiver cessado.

Desse modo, conforme dispõe o artigo 21, §1° e §2° do Decreto 6.514/2008, após os prazos acima destacados, a administração pública não possui mais o condão de buscar em sua esfera a reparação do dano ambiental ocorrido. Além disso, o mesmo artigo prevê no §4º que a prescrição da pretensão da administração não impede a obrigação de reparar o dano na esfera cível.

Nesse sentido, percebe-se que as formas de reparação por dano ambiental nas esferas cível e administrativa são distintas e não se confundem.

A esfera administrativa possui mecanismos próprios para chegar à reparação do dano ambiental seguindo a forma legal do processo administrativo e seus prazos prescricionais. Os processos administrativos tramitam em autarquias e agências ambientais, como, por exemplo, Ibama e ICMBio ou a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), em Pernambuco. Esses mecanismos não se confundem com aqueles da esfera cível, que correm por meio de ações judiciais próprias, podendo a reparação ser buscada a qualquer momento.

Assim, descabida é a pretensão que se tem observado em órgãos administrativos ambientais de buscarem a reparação civil no bojo dos processos administrativos. Na prática advocatícia, tem-se observado, reiteradamente, cancelamentos de processos administrativos pela nulidade de autos de infração, com a consequente revogação das multas ambientais, mas com a manutenção da penalidade de recomposição do dano, sob o argumento de que embora o auto de infração esteja revogado, mantém-se a penalidade sob o argumento da “imprescritibilidade da pretensão da reparação do dano ambiental”.

A administração ambiental, inclusive, tem exigido o cumprimento imediato da reparação através de notificações para elaboração e cumprimento de Prad (Plano de Recuperação de Área Degradada). E o que é pior: o Poder Judiciário não tem revisado esse erro grotesco da administração.

A imprescritibilidade é inerente à responsabilidade civil ambiental, sendo indevida sua invocação no âmbito da responsabilidade administrativa ambiental, assim como é ilegal exigir-se o cumprimento de obrigação cível através de processo administrativo, ainda mais quando anulado!

Autores

  • é advogada, especialista em contencioso e consultivo ambiental, mestre em Direito Internacional e Relações Internacionais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, pós-graduada em Ciências Criminais pela UFPE, MBA em Agronegócio pela USP-Esalq (em andamento) e graduada em Direito pela FDR- UFPE.

  • é graduanda em Direito pela FDR/UFPE e técnica em Meio Ambiente pela Escola Técnica Estadual Almirante Soares Dutra (Teasd).

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