Julgamento Interrompido

Supremo tem três votos para mudar regra sobre divisão de sobras eleitorais

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21 de fevereiro de 2024, 19h51

O Plenário do Supremo Tribunal Federal suspendeu nesta quarta-feira (21/2) o julgamento que discute a distribuição das chamadas sobras eleitorais — cálculo usado para preencher parte das vagas de deputados federais e estaduais e vereadores. O ministro Kassio Nunes Marques pediu vista, mas devolverá o caso na próxima semana. A retomada da análise está marcada para a próxima quarta-feira (28/2).

Julgamento sobre sobras eleitorais deve ser retomado na próxima semana

A corte decidirá se todos os partidos podem participar da última fase da distribuição das sobras eleitorais ou somente aqueles que alcançaram o patamar de 80% do quociente eleitoral, como estabelecido na Lei 14.2011/2021 e na Resolução 23.677 do Tribunal Superior Eleitoral.

Até o momento, prevalece o voto do relator da matéria, ministro Ricardo Lewandowski (aposentado). Para ele, excluir partidos da divisão das sobras diminui a pluralidade política e pode levar à extinção de legendas menores. Assim, todos os partidos poderiam participar da última fase, independentemente de terem atingido o patamar de 80% do quociente eleitoral.

“Toda e qualquer norma que tenha por escopo restringir a pluralidade dos partidos políticos, limitando a eleição de seus representantes, notadamente no sistema proporcional, viola os fundamentos de nosso Estado democrático de Direito”, considerou Lewandowski.

Ainda segundo ele, a regra hoje em vigor pode beneficiar candidatos com votação consideravelmente menor do que seus adversários.

Por exemplo, um candidato com muitos votos, que atinja a marca de 20% do quociente eleitoral, mas cujo partido não alcance 80% desse quociente, ficaria sem a vaga. E a cadeira poderia ficar com alguém que teve muitos votos a menos, mas de um partido que tenha atingido a marca de 80%.

“Considero ser inaceitável que o STF chancele interpretação da norma que permita tamanho desprezo ao voto, mormente em favor de candidato com baixíssima representatividade e, conforme os critérios empregados na segunda fase, pertença a agremiação já favorecida pela atual forma de cálculo.”

Até o momento, Lewandowski foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. O relator, porém, votou por modular a decisão para que ela só valha a partir das eleições deste ano. Alexandre e Gilmar, por outro lado, entenderam que eventual alteração já se aplicaria às eleições de 2022. Ou seja, a depender do resultado, alguns deputados federais podem perder suas cadeiras. São eles:

  • Sonize Barbosa (PL);
  • Prof. Goreth (PDT);
  • Dr. Pupio (MDB);
  • Silvia Waiãpi (PL);
  • Gilvan Máximo (Republicanos);
  • Lebrão (União);
  • Lázaro Botelho (PP).

Eles seriam substitutídos pelos seguintes candidatos:

  • Aline Gurgel (Republicanos);
  • André Abdon (PP);
  • Prof. Marcivania (PCdoB);
  • Paulo Lemos (Psol);
  • Rodrigo Rollemberg (PSB);
  • Rafael Fera (Podemos);
  • Tiago Dimas (Podemos).

Alexandre disse que um levantamento solicitado ao Tribunal Superior Eleitoral mostrou que a mudança não afetaria mandatos de deputados estaduais.

Demais votos
Para Alexandre, é inconstitucional a regra que exclui da distribuição das sobras eleitorais os partidos políticos que não alcançaram o patamar de 80% do quociente eleitoral. Essa exclusão, afirma ele, viola os princípios da razoabilidade, da soberania popular, do pluralismo político e da democracia representativa, bem como o sistema proporcional nas eleições.

“Aqui nós temos uma discussão muito importante, porque dependendo dessa discussão, a dificuldade do crescimento de novos partidos e da pluralidade democrática vai aumentar. O que se criou foi uma sucessiva cláusula de desempenho. Um favorecimento aos grandes partidos”, disse o ministro.

“Na hora que vem a sobra, o candidato que recebeu 150 mil votos, mas o partido tem 75% do quociente eleitoral, observará que as sobras são divididas entre os grandes partidos de novo. E aquele que teve 30 mil votos vai prevalecer sobre o candidato que teve 150 mil”, prosseguiu.

Para Alexandre e Gilmar, o adiamento dos efeitos da decisão perpetuaria a regra considerada inconstitucional e impediria que uma quantidade significativa de votos válidos fosse aproveitada na composição da legislatura atual do Congresso.

O ministro André Mendonça divergiu do relator. Ele disse não ver critério obstativo, arbitrário ou irrazoável nas normas impugnadas, tendo sido acompanhado até o momento pelo ministro Edson Fachin.

“Não ofende a Constituição Federal, sobretudo os princípios do pluralismo político, da pluralidade de partidos e do sistema proporcional, disposição normativa que exclua de fase de distribuição de cadeiras da Câmara dos Deputados agremiação que não logrou obter o número de votos fixado em lei”, disse Mendonça.

Para Fachin, a corte deve respeitar a deliberação do Legislativo sobre o tema. Ele também disse não ver violação ao pluralismo político. “Entendo deva ser respeitada compreensão manifestada pelas duas casas do Congresso Nacional a respeito da interpretação a ser dada à regra que se discute.”

Entenda
No sistema proporcional, que vale para os cargos de deputados federal, estadual e distrital e vereador, primeiramente são computados os votos do partido ou federação ao qual o candidato está coligado, e, em uma segunda etapa, os votos de cada candidato.

Ao computar os votos, a Justiça Eleitoral verifica quais foram os partidos vitoriosos e, dentro dessas agremiações, quem conseguiu um número mínimo de votos. Para isso, são feitos os cálculos do quociente eleitoral e do quociente partidário.

O quociente eleitoral estabelece o número de votos que um partido ou federação precisa receber para eleger pelo menos um deputado. O cálculo é feito assim: o total de votos válidos é dividido pelo número de vagas em disputa.

Se, por exemplo, houve um milhão de votos para dez vagas, o quociente é de cem mil votos. Os partidos precisam obter esse mínimo para eleger um deputado.

Já no quociente partidário, o número de votos do partido é dividido pelo quociente eleitoral. Em um cenário em que o quociente eleitoral é de cem mil votos e um partido consegue 630 mil, ele vai eleger seis deputados. Só é considerada a parte inteira da divisão.

Na primeira fase da partilha das cadeiras, o número que representa o espaço de cada partido nem sempre é inteiro, o que gera as chamadas sobras.

Em um primeiro momento, essas sobras são divididas entre os partidos que obtiveram ao menos 80% do quociente eleitoral e em que há candidatos com votação igual ou superior a 20% do quociente eleitoral.

Em alguns casos, essa etapa não é suficiente para distribuir todas as cadeiras restantes. Então são distribuídas as chamadas “sobras das sobras”, etapa da qual podem participar só os partidos que atingiram 80% ou mais do quociente eleitoral, sendo eliminado o critério de 20% para os candidatos.

O julgamento do Supremo afeta somente essa última fase. A depender do resultado, todos os partidos poderão participar da última parte da divisão, independentemente de terem obtido 80% do quociente eleitoral.

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