jurisprudência consolidada

Quem pede salvo-conduto por maconha medicinal não busca crime, diz TRF-6

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4 de abril de 2024, 8h23

A pessoa que busca salvo-conduto para plantar maconha com fins medicinais sem o risco de prisão não tem a intenção de praticar um crime, pois não procura o entorpecimento recreativo, mas apenas o cuidado de sua saúde.

TRF-6 seguiu jurisprudência do STJ e concedeu salvo-conduto

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região concedeu Habeas Corpus preventivo em favor de um homem que deseja plantar maconha para produzir óleo canabidiol na própria casa.

Trata-se do primeiro precedente do TRF-6 nesse sentido, o que leva a corte a se adequar à forma como o Superior Tribunal de Justiça vem reiteradamente tratando o tema.

Dores crônicas

O salvo-conduto beneficia um homem que sofre de dores crônicas decorrentes de um acidente. O canabidiol foi receitado por um médico para contornar os efeitos colaterais do tratamento. Importado, o remédio custa R$ 1,1 mil a dose.

O autor da ação pediu autorização para importar 30 sementes para o cultivo de até 60 mudas anuais de maconha, de modo a produzir o próprio óleo. Ele comprovou que fez cursos especializantes sobre cultivo orgânico e extração do óleo medicinal.

Relator da matéria, o desembargador Pedro Felipe Santos observou que a utilização de substância ilícita para fins terapêuticos não é ilícita, inclusive porque esse acesso vem sendo admitido para profissionais da Medicina há séculos no Brasil.

Tipicidade afastada

Em sua análise, a conduta também não é típica — ou seja, ela não se adequa a uma conduta prevista pela lei penal. Isso porque a Lei de Drogas protege a saúde coletiva ao tentar evitar a lesão do tecido social causada pela atuação do narcotráfico.

“Nessa lógica, deve-se reconhecer que aquele que impetra habeas corpus preventivo para o plantio da Cannabis sativa a fim de cuidar de uma doença, em vez de lesar a saúde pública, a promove”, afirmou o relator.

“Quando o indivíduo vem à Justiça requerer seu direito de produzir seu próprio medicamento, amparado em laudo médico, a oneração do erário diminui. Portanto, não há senão benefícios à sociedade e à promoção da saúde pública quando se permite ao Paciente que, às suas custas, realize o tratamento médico prescrito”, acrescentou ele.

O voto, por fim, faz referência à jurisprudência construída pelo STJ e por outros Tribunais Regionais Federais.

“Considero que este Tribunal Regional da 6ª Região, ao alinhar-se aos precedentes supracitados, contribui para a harmonização da interpretação do Direito no âmbito federal e para conferir maior coerência à sua aplicação”, concluiu o relator. A votação foi unânime.

O advogado Lucas Fratari, que atuou no caso, destacou a mudança de postura do TRF-6 sobre o tema.

“Na contramão das pesquisas científicas e da jurisprudência do STJ, o TRF da 6ª Região ainda não vinha reconhecendo o direito do paciente cultivar a planta da qual extrai a sua medicação de uso contínuo. Tal situação de fato acaba por afastar diversos pacientes do acesso ao tratamento médico com utilização de cannabis, o que é um retrocesso”, disse ele. “É uma decisão inaugural no TRF da 6ª Região, que abre portas para um olhar mais sensível da corte para questões dessa natureza.”

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HC 1008531-49.2023.4.06.0000

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