reparação possível

STJ autoriza particular a executar TAC firmado após desastre de Brumadinho

Autor

28 de dezembro de 2023, 8h47

As vítimas do rompimento da barragem de Brumadinho (MG), ocorrido em 2019, têm legitimidade para ajuizar execuções individuais e cobrar da mineradora Vale os valores que foram acordados em um termo de ajustamento de conduta (TAC) assinado com a Defensoria Pública de Minas Gerais.

Bombeiros realizam buscas após rompimento da barragem de rejeitos de mineração em Brumadinho (MG), em 2019

A conclusão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu permitir que lesados pelo desastre ambiental peçam na Justiça o pagamento de R$ 100 mil, valor previsto no TAC àqueles que sofreram danos à saúde mental/emocional.

O julgamento foi encerrado em 12 de dezembro e representa uma mudança de posição do colegiado. Em outubro, a 3ª Turma estabeleceu que cabe à Defensoria Pública avaliar se o acordo está sendo cumprido e, apenas se a resposta for negativa, tomar as medidas cabíveis.

A revisão foi feita por sugestão da ministra Nancy Andrighi. Ela entendeu que caberia uma melhor análise e chegou a uma nova conclusão, que acabou acompanhada por maioria de votos na 3ª Turma.

Para ela, impedir os particulares de executar o TAC vai dificultar o recebimento das indenizações, além de desprestigiar o trabalho executado pela Defensoria Pública mineira.

“Se o termo de ajustamento de conduta realizado não pode ser executado e as vítimas permanecem a sofrer as consequências sem qualquer compensação, a realização do TAC constitui, em verdade, perda de tempo”, defendeu.

Questão de legitimidade
Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, o caso de Brumadinho levantou debate sobre a legitimidade para execução de acordos de ajustamento de conduta, um instrumento usado por órgãos públicos para correção de atos contrários à lei.

O TAC em questão foi assinado entre Defensoria Pública e Vale com o objetivo de viabilizar o pagamento de indenizações às milhares de vítimas do rompimento da barragem. Segundo a empresa, já foram pagos R$ 1,35 bilhão em indenizações.

O acordo estabelece parâmetros e critérios para as indenizações. A cláusula 15.7, que motivou as tentativas de execução, prevê pagamento de R$ 100 mil à vítima de dano à saúde mental/emocional e pensão, desde que haja incapacidade comprovada.

Para a ministra Nancy Andrighi, a legitimidade para executar o TAC se relaciona com a natureza do direito tutelado. No caso da Vale, o termo tutela direitos individuais homogêneos. Assim, pode ser executado por qualquer dos particulares lesados no episódio de 2019.

Por outro lado, se o TAC versasse sobre direitos difusos e coletivos, os únicos legitimados seriam os órgãos públicos competentes.

Ministra Nancy Andrighi propôs mudança de posição do STJ sobre a exequibilidade do TAC firmado em MG

Liquidez do título
Como o TAC é considerado título extrajudicial, sua execução depende de sua liquidez. No caso, o TAC de Brumadinho estabelece dois tipos de obrigação: de fazer (realização de acordos extrajudiciais com as vítimas) e de pagar (as indenizações).

As obrigações de pagar já estão quantificadas e, portanto, possuem liquidez. A indenização por dano emocional é apenas um dos exemplos listados no TAC. Há valores pré-definidos também para óbito de familiares, lesão corporal permanente e perda de animais domésticos, entre outros.

A ministra Nancy Andrighi também rejeitou a argumentação de que o TAC só poderia ser executado mediante o descumprimento do acordo, situação que caberia ser avaliada por quem assinou o termo — a Defensoria Pública de Minas Gerais.

“Descabe às vítimas, quando do ajuizamento da execução individual, comprovar a inércia da contraparte nas tratativas individuais ou a negativa de indenização extrajudicial, sob pena de imputar à parte vulnerável o ônus de constituir prova negativa”, apontou.

Voto vencido
Votaram com a relatora os ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro. Abriu a divergência o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que ficou vencido ao lado de Marco Aurélio Bellizze.

Para os divergentes, a 3ª Turma deveria manter a posição adotada em outubro e vetar a execução individual do TAC. Ela dependeria do descumprimento do acordo, o que só pode ser averiguado pela Defensoria Pública mineira.

“A demonstração de que a obrigação não foi cumprida é pressuposto para o ajuizamento da execução. Na hipótese dos autos, o exequente não demonstrou que o TAC foi descumprido, até porque não disporia dos dados necessários para essa constatação”, disse Cueva.

Em sua análise, o TAC não trata de obrigação de pagar quantia individualizada, mas de obrigação de fazer, consubstanciada na disponibilização de canais extrajudiciais para que esses pagamentos sejam feitos com a realização de acordos.

“Assim, como não está previsto no TAC um direito de titularidade direta do recorrido que foi descumprido, não há como reconhecer a ele legitimidade para a execução”, concluiu.

Clique aqui para ler a decisão
REsp 2.059.781
REsp 2.100.105

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!