Anuário da Justiça

Confira as teses aprovadas pelo Carf depois do fim do voto de qualidade

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18 de julho de 2022, 7h42

*Reportagem publicada no Anuário da Justiça Brasil 2022, lançado no dia 30 de junho na TV ConJur. A publicação está disponível gratuitamente na versão online (clique aqui para ler) e à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa (clique aqui para comprar)

O Carf tem vivido momentos de grandes transformações, tanto de jurisprudência quanto em sua rotina de procedimentos. A mudança na legislação, que extinguiu o voto de qualidade nas disputas que terminavam empatadas (clique aqui para ler a primeira parte da reportagem), reverteu para o contribuinte a vantagem que favoreceu a Fazenda Pública desde a criação do conselho. 

O órgão é dividido em três seções, cada uma delas composta por quatro câmaras de julgamento que abrangem turmas ordinárias. O conselho também conta com a CSRF (Câmara Superior de Recursos Fiscais), responsável por uniformizar a jurisprudência do órgão. A 1ª Turma da CSRF é responsável por uniformizar a jurisprudência da 1ª Seção do conselho; a 2ª Turma, a da 2ª Seção; e a 3ª Turma, a da 3ª Seção.

Confira abaixo os principais casos julgados nas três turmas da Câmara Superior que foram afetados pelo fim do voto de qualidade e resultaram em mudança na jurisprudência.

1ª Turma da CSRF
Competência: IRPJ | CSLL
A 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais julga processos relacionados ao IRPJ (Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas); CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido); IRRF (Imposto de Renda Retido na Fonte), antecipação do IRPJ; demais tributos, quando o caso é reflexo do IRPJ; e Simples Nacional.

Julga também casos relacionados a penalidades pelo descumprimento de obrigações acessórias por pessoas jurídicas relacionadas aos tributos de competência da 1ª Seção; e a tributos, empréstimos compulsórios, anistias e matéria correlata não incluídos na competência das outras seções. Em razão de sua competência, costuma julgar causas com valores mais altos em comparação com a 2ª e a 3ª Turma.

Ao menos sete casos sofreram reversão de jurisprudência ao chegarem à 1ª Turma. Em outubro de 2020, seis meses após a extinção do voto de qualidade, o empate entre os conselheiros resultou na decisão de que não podem ser aplicadas ao mesmo tempo a multa de ofício e a multa isolada. O acúmulo resultaria em um excesso de punições.

Contudo, em outubro de 2021, a competência para julgar o caso foi estendida à 3ª Turma da CSRF. Em fevereiro de 2022, a 3ª Turma mudou novamente a jurisprudência em favor do Fisco com a possibilidade de as multas serem aplicadas ao mesmo tempo. E em abril, a 1ª Turma voltou a firmar jurisprudência neste sentido.

Um empate na 1ª Turma, em setembro de 2021, resultou no entendimento de que não é aplicável ao contribuinte o limite de 30% na compensação de prejuízos no caso de extinção da pessoa jurídica. A aplicação resultaria em uma oneração fiscal do patrimônio em substituição à renda. Outros julgamentos neste sentido ocorreram em dezembro de 2021 e em janeiro e fevereiro de 2022.

Também em setembro de 2021, foi decidido que o contribuinte não precisa pagar a CSLL em casos anteriores ao STF declarar a constitucionalidade da contribuição. Outra decisão neste sentido ocorreu em outubro. Nesse mês, o desempate pró-contribuinte resultou na conclusão de que não existe vedação legal para o contribuinte efetuar a dedução de juros sobre o capital próprio de períodos anteriores no IRPJ.

Em outubro de 2021, e janeiro de 2022, a 1ª Turma entendeu que não deve ser feita a adição do ágio na apuração da CSLL por não haver norma prevendo a adição. Duas outras decisões resultaram na jurisprudência de que, em relação ao IRPJ, não devem ser incluídos no cálculo do preço praticado os fretes, os seguros e os tributos do preço em casos em que há mais de uma pessoa jurídica vinculada. O entendimento foi de que não há fundamentação legal.

E em março de 2022, um empate entre os conselheiros resultou na jurisprudência de que não deve ser aplicada sobre os contribuintes a multa qualificada em substituição à multa de ofício comum na autuação de ágio interno. A multa ordinária é calculada a partir de 75% do valor do tributo devido. Já a multa qualificada corresponde ao dobro da multa comum.

Alexandre Evaristo Pinto, representante dos contribuintes, afirma que o fim do voto de qualidade teve grande impacto na 1ª Turma. “Os casos mais controversos, os que envolvem os maiores valores, são geralmente as chamadas bolas divididas. É possível você interpretar tanto de um jeito favorável à Fazenda como de modo favorável ao contribuinte. São interpretações que são possíveis e razoáveis dos dois lados. E, nesse sentido, muitas dessas teses controversas davam empate. Agora passam a dar empate favorável ao contribuinte”, explica.

TESES APROVADAS
1. Não se aplicam ao mesmo tempo a multa de ofício e a multa isolada.
PROCESSO: 9101-005.080
2. Não se aplica ao contribuinte o limite de 30% na compensação de prejuízos no caso de extinção da pessoa jurídica.
PROCESSOS: 9101-005.728; 9101-005.794; 9101-005.896; 9101-005.922
3. O contribuinte não deve pagar CSLL em casos anteriores à data em que o STF declarou a sua constitucionalidade.
PROCESSOS: 9101-005.706; 9101-005.731
4. O contribuinte pode efetuar a dedução de juros sobre o capital próprio de períodos anteriores no IRPJ.
PROCESSOS: 9101-005.757; 9101-005.810
5. Não deve ser feita a adição do ágio na apuração da CSLL.
PROCESSOS: 9101-005.773; 9101-005.936
6. Em relação ao IRPJ, não devem ser incluídos no cálculo do preço praticado os fretes, seguros e tributos do preço em casos em que há mais de uma pessoa jurídica vinculada.
PROCESSOS: 9101-005.798; 9101-005.916
7. Não deve ser aplicada a multa qualificada em substituição à multa de ofício comum na autuação de ágio interno.
PROCESSO: 9101-005.973

2ª Turma da CSRF
Competência: IRPF | INSS | ITR
A 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais é responsável por julgar processos relacionados ao IRPF (Imposto de Renda de Pessoa Física); ao IRRF (Imposto de Renda Retido na Fonte) em casos relacionados à pessoa física; ao ITR (Imposto Territorial Rural); às contribuições previdenciárias; e a penalidades pelo descumprimento de obrigações acessórias pelas pessoas físicas e jurídicas relacionadas aos tributos de responsabilidade da 2ª Seção.

Para João Aldinucci, conselheiro representante dos contribuintes, o fim do voto de qualidade impactou menos a 2ª Seção por atingir somente três temas. “As demais questões ainda têm sido decididas por maioria de votos”, avalia. A mudança afetou nos casos de incidência de ITR sobre áreas invadidas e áreas de preservação permanente. Também afetou os casos de contribuições previdenciárias sobre o ticket-alimentação pago por empresas não inscritas no Programa de Alimentação do Trabalhador.

O desempate pró-contribuinte resultou no entendimento de que a apresentação de Ato Declaratório Ambiental é desnecessária para comprovar o direito à não incidência do ITR em áreas de preservação permanente. Um empate garantiu o entendimento de que deve ser respeitado o Parecer Vinculante BBL 4 da AGU que determina que o ticket-alimentação não integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias. E foi decidido que não há incidência de ITR sobre áreas invadidas já que o proprietário não tem legitimidade passiva após ter o imóvel invadido.

TESES APROVADAS
1.
Não há incidência de ITR sobre áreas de preservação permanente.
PROCESSOS: 9202-009.343; 9202-009.67
2. Não há incidência de ITR sobre áreas invadidas.
PROCESSOS: 9202-010.172; 9202-010.309
3. Contribuições previdenciárias não incidem sobre o ticket-alimentação pago por empresa que não está inscrita no Programa de Alimentação do Trabalhador. PROCESSOS: 9202-009.986; 9202-009.989

3ª Turma da CSRF
Competência: IPI | PIS | COFINS | COMEX
A 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais é responsável por julgar processos relacionados à contribuição para o PIS/Pasep; à Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), à Finsocial (Contribuição para o Fundo de Investimento Social); ao IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados); à CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira); ao IPMF (Imposto Provisório sobre a Movimentação Financeira); ao IOF (Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro e sobre Operações Relativas a Títulos e Valores Mobiliários); às CIDE (Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico); ao II (Imposto sobre a Importação); ao IE (Imposto sobre a Exportação); a contribuições, taxas e infrações cambiais e administrativas relacionadas com a importação e a exportação; e a questões aduaneiras.

Para Tatiana Midori Migiyama, conselheira representante dos contribuintes, o fim do voto de qualidade produziu efeitos relevantes nas sessões virtuais da 3ª Turma. Entretanto, ela avalia que o efeito poderia ter sido maior se não tivesse havido o cancelamento de sessões de julgamento por falta de quórum devido à ausência de conselheiros fazendários. “É inegável que muitos processos importantes não tiveram a oportunidade de serem apreciados.”

O empate entre os conselheiros resultou na decisão de que, no caso de tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo decadencial aplicável será contado a partir da data da ocorrência do fato gerador. O entendimento se baseou no artigo 150, parágrafo 4º, do Código Tributário Nacional para a autoridade fiscal exigir determinado tributo.

Na sessão de 19 de janeiro de 2022, cinco casos resultaram em reversão de jurisprudência em favor dos contribuintes após empate no colegiado. Foi firmado o entendimento de que as sobras registradas pelas sociedades cooperativas não são tributadas pela Cofins. De acordo com a decisão, as cooperativas de crédito não são tributariamente equiparáveis às instituições financeiras, apesar de também serem reguladas pelo Banco Central.

Por falta de previsão legal, a Cebas (Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social) também não deve ser exigida das entidades de educação e de assistência social sem fins lucrativos para que haja imunidade ou isenção das contribuições de seguridade social. Foi decidido, ainda, que não há incidência de IPI nas atividades relacionadas aos serviços gráficos personalizados. A razão seria as atividades terem natureza de serviço, e não de industrialização.

A 3ª Turma entendeu ainda que as despesas com fretes de produtos acabados podem ser usadas como crédito de PIS e Cofins não cumulativo, contrariando o Parecer Normativo 5/2015 da Receita Federal.

Outra decisão foi no sentido de que a contagem do prazo decadencial para lançamento do IOF considera o dispositivo que trata do fato gerador. A 3ª Turma entendeu que o termo inicial para a contagem do prazo decadencial não deve considerar a base de cálculo. Outra decisão foi que a receita de locação de vagas em estacionamento de shopping center não compõe a base de cálculo do PIS/Cofins devido a não envolver personalidade jurídica.

TESES APROVADAS
1.
No caso de tributos sujeitos a lançamento por homologação, o prazo decadencial aplicável será contado a partir da data da ocorrência do fato gerador.
PROCESSO: 9303-011.558
2. As sobras registradas pelas sociedades cooperativas não são tributadas pela Cofins.
PROCESSO: 9303-011.966
3. A Cebas não deve ser exigida de entidades de educação e de assistência social sem fins lucrativos para que haja imunidade ou isenção das contribuições de seguridade social.
PROCESSO: 9303-010.974
4. Não há incidência de IPI nas atividades relacionadas aos serviços gráficos personalizados.
PROCESSO: 9303-012.269
5. Despesas com fretes de produtos acabados podem ser usadas como crédito de PIS e Cofins não cumulativo.
PROCESSO: 9303-012.684
6. A contagem do prazo decadencial para lançamento do IOF considera o dispositivo que trata do fato gerador.
PROCESSO: 9303-012.247
7. A receita de locação de vagas em estacionamento de shopping center não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins.
PROCESSO: 9303-012.244 
8. A suspensão do IPI nas vendas de matéria-prima, produtos intermediários e materiais de embalagem destinados a estabelecimentos que se dediquem à elaboração dos produtos do artigo 29 da Lei 10.637/02 se aplica para as saídas desses itens, além do estabelecimento industrial, do equiparado a industrial.
PROCESSO: 9303-012.818
9. O IRPJ e a CSLL, por serem tributos com lançamento por homologação, estão sujeitos ao prazo quinquenal fixado pelo artigo 150, parágrafo 4º, do CTN.
PROCESSO: 9303-012.808 
10. A demora de capitalização na AFAC (Aporte para Futuro Aumento de Capital) afasta a incidência de IOF.
PROCESSO: 9303-012.913

Para ler a primeira parte da reportagem sobre o Carf, clique aqui: Carf passa por transformações após o fim do voto de qualidade

Assista ao lançamento do Anuário da Justiça Brasil 2022 (clique aqui)

Anuário da Justiça Brasil 2022
ISSN: 2179981-4
Edição: 2022
Número de páginas: 288
Editora ConJur
Versão impressa: R$ 40, exclusivamente na Livraria ConJur (clique aqui)
Versão digital: acesse gratuitamente pelo site http://anuario.conjur.com.br e pelo app Anuário da Justiça

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