Opinião

O papel dos EUA no golpe e na democracia do Brasil

Autores

  • James N. Green

    é historiador professor de história e cultura brasileira na Universidade Brown (EUA); autor de 11 livros sobre o Brasil e presidente do Conselho Diretivo do WBO (Washington Brazil Office).

  • Paulo Abrão

    É professor de direito da PUC-RS e presidente da Comissão de Anistia.

28 de março de 2024, 9h15

Os Estados Unidos tiveram papel preponderante no golpe de Estado que, em 1964, depôs o presidente João Goulart e instituiu uma ditadura que perduraria por 21 anos no Brasil, até 1985. Da embaixada americana no Rio de Janeiro, o então embaixador Lincoln Gordon informava o presidente Lyndon Johnson sobre os acontecimentos e aconselhava-o a apoiar os militares golpistas.

Parte importante desse apoio veio na forma de pressão militar, quando navios de guerra norte-americanos desceram em direção à costa brasileira para dissuadir qualquer eventual resistência de tropas fiéis a Goulart e para encorajar os golpistas a levarem a cabo seu plano.

Na Guerra Fria, convinha aos EUA de então fomentar os ataques à democracia que eram perpetrados por uma elite política, econômica e militar latino-americana fiel a Washington e paranoica com o socialismo.

Levou anos até que a Casa Branca e o Departamento de Estado americano começassem a modular o apoio dado aos generais latino-americanos. Casos de tortura, execução sumária, desaparecimento forçado e até o sequestro de bebês foram elevando o custo do apoio irrestrito de Washington aos regimes militares.

2022

Passados 60 anos, os americanos voltaram agora, em 2022, a desempenhar papel central num golpe — só que, desta vez, do lado dos que defendem a democracia. O governo do presidente Joe Biden respaldou a confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro e a lisura do processo que culminou na escolha de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente.

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Ditadura militar, Exército, totalitarismo

Essa guinada não apaga o passado. Também não redime os EUA, tampouco substitui uma antiga tutela ditatorial por uma nova tutela, a democrática. O apoio americano à democracia brasileira em 2022 tem de ser entendido pelo que é: uma confluência de interesses entre dois países que vivem o assédio de uma extrema direita golpista e conectada internacionalmente.

Se em 1964 a Casa Branca agia praticamente sozinha, ecoando interesses das elites econômicas ligadas às cúpulas do poder, em 2022 vemos que o Congresso americano assume papel preponderante, de maneira conectada e concertada com a sociedade civil organizada.

Essa é uma das novidades, 60 anos depois: uma boa articulação entre as organizações e movimentos sociais dos dois países, entre as academias e a imprensa do Brasil e dos EUA, entre blocos parlamentares unidos por interesses comuns nas mais diversas áreas —meio ambiente, questão racial, combate à desinformação e melhores condições de trabalho.

Autores

  • é historiador, professor de história e cultura brasileira na Universidade Brown (EUA); autor de 11 livros sobre o Brasil e presidente do Conselho Diretivo do WBO (Washington Brazil Office).

  • é doutor em direito, foi secretário-executivo da CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos), secretário nacional de Justiça e presidente da Comissão de Anistia; diretor-executivo do WBO.

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