Opinião

Possibilidade de incluir IPI não recuperável na base dos créditos do PIS/Cofins

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6 de março de 2024, 20h54

As contribuições ao PIS e Cofins são objeto de alterações significativas, sendo a mais recente e importante referente à primeira etapa da reforma tributária, visto que a Emenda Constitucional nº 132/2023 modificou o Sistema Tributário Nacional, principalmente no que se refere à tributação do consumo.

Tal ponto demonstra o protagonismo dessas exações na atualidade, situação não menos evidenciada no Judiciário em razão dos litígios, visto que modificações em legislações e normas regulamentadoras ensejaram em afronta aos princípios basilares aplicáveis no Direito Tributário.

Dentre tais alterações se destaca o disposto no artigo 171, parágrafo único, da Instrução Normativa nº 2.121/2022. Em sua literalidade, a saber:

“Art. 171. Para efeito de cálculo dos créditos de que trata esta Seção, integram o valor de aquisição (…)
Parágrafo único. Não geram direito a crédito:   (Incluído(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 2152, de 14 de julho de 2023)
I – o ICMS incidente na venda pelo fornecedor (Lei nº 10.637, de 2002, art. 3º, § 2º, inciso III, incluído pela Lei nº 14.592, de 2023, art. 6º; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 3º, § 2º, inciso III, incluído pela Lei nº 14.592, de 2023, art. 7º);   (Incluído(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 2152, de 14 de julho de 2023)
II – o ICMS a que se refere o inciso II do § 3º do art. 25 (Lei nº 10.637, de 2002, art. 3º, § 2º, inciso II, incluído pela Lei nº 10.865, de 2004, art. 37; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 3º, § 2º, inciso II, incluído pela Lei nº 10.865, de 2004, art. 21); e   (Incluído(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 2152, de 14 de julho de 2023)
III – o IPI incidente na venda pelo fornecedor”
 

Por meio da referida instrução normativa, os contribuintes sujeitos ao regime de não cumulatividade das contribuições do PIS e Cofins se depararam com a redução do creditamento do PIS e Cofins visto a não inclusão do IPI não-recuperável, logo, essa situação ensejou a análise (inclusive no Judiciário) acerca da validade jurídica da referida restrição imposta.

Não cumulatividade do PIS e da Cofins

Pois bem, primeiro ponto a ser abordado se refere a definição e aplicação da não cumulatividade ao PIS e a Cofins, o qual se reveste como corolário constitucional (mandatório), nos termos do artigo 195, parágrafo 12º, a saber:

“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:   (…)
§ 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.” 

O normativo infraconstitucional operacionaliza a referida sistemática por meio dos artigos 3ºs das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, os quais adotam a metodologia denominada com “base contra base”.

Método subtrativo indireto

Em síntese, a referida metodologia indica que, nas apurações das contribuições ao PIS e Cofins, os custos ou despesas são contrapostos ao valor das receitas, sendo deduzido da base de cálculo aquilo que autorizado por lei, logo, não se considera o que necessariamente incidiu na operação anterior.

Spacca

Ou seja, nas apurações destas exações é aplicada uma alíquota sobre o valor de determinados custos e despesas e esse crédito financeiro é descontado do montante calculado a título de débito do PIS e da Cofins. O referido procedimento também é denominado como “método subtrativo indireto”.

O método é “indireto” justamente pelo fato de não considerar diretamente o valor dos tributos destacados ou recolhidos na etapa anterior de circulação econômica, por exemplo, por determinada empresa fornecedora de bens ou mercadorias, mas exclusiva e indiretamente o valor do custo (ou despesa) incorrido pela empresa adquirente com a aquisição desses bens ou mercadorias.

Além disso, o método é “subtrativo” porque permite que a empresa contribuinte subtraia o valor do crédito apropriado do valor inicialmente apurado mediante aplicação das alíquotas das contribuições sobre suas receitas.

A mecânica desse método fica clara no § 1º do artigo 3º das Leis 10.637/02 e 10.833/03, a qual evidencia que o método eleito pelo legislador para operacionalizar o regime não cumulativo do PIS/Cofins (o chamado “método indireto subtrativo”) se limita sempre (e exclusivamente) no valor dos bens, mercadorias, insumos entre outros.

Com base no mencionado, conclui-se que sob a perspectiva do método indireto subtrativo, para fins de definição do crédito a ser apropriado, é indiferente o quantum recolhido pelo fornecedor, interessando apenas o valor da respectiva aquisição.

Discrepância

Verifica-se assim, inequivocamente, a discrepância entre os preceitos aplicáveis à não cumulatividade das contribuições ao PIS e Cofins e, por via contrária, o estipulado na Instrução Normativa nº 2.121/2022, a qual indevidamente mitigou/reduziu a base de cálculo dos créditos em razão da não inclusão do IPI não-recuperável.

Contudo, a Constituição Federal não conferiu poderes para que uma norma secundária seja capaz de impor comportamento ao largo da legislação, em outras palavras, a novel medida ao “legislar” e determinar a exclusão do IPI não recuperável do custo de aquisição e, portanto, do cálculo do crédito de PIS e Cofins afrontou os corolários constitucionais aplicáveis à sistemática da não cumulatividade das contribuições em comento.

Inclusão do IPI não-recuperável

Com base no cenário acima delineado, resta evidente que o cerne da questão se refere a possibilidade da inclusão do IPI não recuperável na base de cálculo (desconto) dos créditos das contribuições do PIS e COFINS. Logo, mediante as inúmeras posições divergentes, a matéria foi objeto de análise pelo Judiciário.

Desta feita, em posição recente o Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região reconheceu e assegurou ao contribuinte o aproveitamento dos créditos, conforme se verifica da decisão abaixo relacionada [1], a saber:

“Assim, em análise sumária, reconheço o direito da parte impetrante, para fins de apuração do valor das contribuições ao PIS e COFINS, ao aproveitamento de créditos calculados em relação ao IPI não-recuperável incidente na aquisição de bens para revenda sujeitos ao regime não-cumulativo plurifásico.

Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal para assegurar à parte agravante o direito de, para fins de apuração do valor das contribuições ao PIS e COFINS, aproveitar créditos calculados em relação ao IPI não-recuperável incidente na aquisição de bens para revenda sujeitos ao regime não-cumulativo plurifásico.”

Limites da IN

Importante, por oportuno, indicar que no referido precedente judicial foram analisados os limites da instrução normativa, conforme se observa:

“O poder regulamentar é uma das formas de manifestação da função normativa do Poder Executivo, que no exercício dessa atribuição pode editar atos normativos que visem explicitar a lei, para sua fiel execução. No ordenamento jurídico brasileiro (artigo 84, IV, da CF), nos limites do princípio da legalidade, o ato regulamentar se limita a estabelecer normas sobre a forma como a lei será cumprida pela Administração, de sorte que não pode estabelecer normas contra legem ou ultra legem, nem pode inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, medidas punitivas” (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2024, p. 132-133).

Em análise mais detida sobre a questão, revendo posicionamento anteriormente manifestado, tenho que à pretensão de regulamentação sobreveio indevida inovação jurídica, com restrição de direitos do contribuinte, em manifesta violação ao disposto no artigo 13 do Decreto-Lei n.º 1.598/1977 e nos artigos 3º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003.”

O brilhante entendimento levado a efeito pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região é de extrema relevância aos contribuintes de PIS e Cofins, visto que a inovação imposta por meio do artigo 171, da Instrução Normativa nº 2121/2022, ao impor impeditivos ao crédito, incorre em medida descabida, desarrazoada e contrária aos princípios da não cumulatividade e capacidade contributiva.

Inclusive, o entendimento levado a efeito pelo referido tribunal é de extrema relevância à conjuntura tributária do Brasil, visto que, conforme suscitado anteriormente, as contribuições ao PIS e Cofins são objeto da aclamada reforma tributária, sendo que impactos relevantes devem ser observados. Logo, avaliar os itens passíveis de creditamento pode ensejar uma ótima oportunidade e com o devido incremento do compliance.

Ademais, ainda neste diapasão, deve se observar que o aumento de crédito enseja pontos de extrema relevância, quais sejam (1) redução do custo de aquisição dos produtos; e (2) aumento de créditos de PIS e Cofins.

Portanto, os contribuintes sujeitos à sistemática da não cumulatividade das contribuições do PIS e Cofins devem ficar atentos ao supra posicionamento do Judiciário, visto o consequente incremento financeiro na base de crédito das exações com a inclusão do IPI não recuperável, situação que enseja redução de custo nas aquisições e aumento da competitividade.

 


[1] Agravo de Instrumento nº5001847-87.2024.4.03.0000

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