Opinião

Uma luz no fim do túnel para os processos de execução estagnados na Justiça

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3 de março de 2024, 15h26

De acordo com as estatísticas publicadas no relatório “Justiça em Números” pelo Conselho Nacional de Justiça em 2022, o número total de casos pendentes no sistema judiciário brasileiro alcançou 77,3 milhões, dos quais mais de 40 milhões estão na etapa de execução, seja por meio de títulos judiciais ou extrajudiciais.

Destes, 15,3 milhões de casos encontram-se suspensos, em espera ou arquivados temporariamente, à espera de uma resolução legal futura, contribuindo para o acúmulo de processos sem resolução efetiva e provocando um congestionamento significativo no sistema.

A fase de execução demonstra ser a mais lenta, resultando em uma maior taxa de acumulação de processos quando comparada à fase de conhecimento. A discrepância nas taxas de congestionamento entre as duas fases processuais fases chega a 17 pontos percentuais, sendo 68,1% para a fase de conhecimento contra 85% para a fase de execução.

Prescrição intercorrente e a Lei 14.195/21
É evidente que processos de execução que não apresentam chances de sucesso, devido à falta de ativos para a satisfação da dívida, não devem permanecer indefinidamente em tramitação. Há um momento no processo em que é necessário concluir.

A prescrição intercorrente serve justamente a esse propósito no âmbito dos processos de execução, atuando como um mecanismo de defesa significativo para o devedor, pois pode resultar na extinção do processo, conforme o artigo 924 do Código de Processo Civil.

Este tema adquire uma relevância ainda maior com a recente promulgação da Lei 14.195/21, que alterou completamente o regime de prescrição intercorrente em execuções civis, harmonizando-o com o regime aplicado às execuções fiscais. A introdução dessa legislação tem como claro objetivo incentivar e simplificar a aplicação da prescrição durante o processo de execução, provocando amplo debate sobre suas implicações práticas.

Sancionada em 26 de agosto de 2021, a Lei nº 14.195 aborda diversos assuntos, incluindo mudanças significativas no Código de Processo Civil, como a alteração no artigo 921, que se refere à prescrição intercorrente em processos de execução.

Com essas modificações, tornou-se substancialmente mais simples encerrar processos de execução por meio da prescrição intercorrente, representando uma valiosa estratégia defensiva em benefício do devedor.

Regime unificado
Contudo, a Lei 14.195/21 gerou considerável controvérsia, com argumentos de que poderia ser inconstitucional, originando-se da Medida Provisória 1.040/2021. Diferentemente de outras leis, ela não passou por um período de “vacatio legis” antes de entrar em vigor, o que aconteceu imediatamente em 26/8/2021. Até o momento, o Supremo Tribunal Federal ainda não emitiu um parecer sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 7.005) que questiona a lei.

A despeito das alegações de falhas formais, existe uma forte possibilidade de que o Supremo Tribunal Federal não declare a lei inconstitucional. Isso se deve ao fato de que a lei, ao modificar o artigo 921 do Código de Processo Civil para instituir um regime atualizado de prescrição intercorrente, harmonizou suas diretrizes com as já estabelecidas na Lei de Execução Fiscal. Com essa atualização, os princípios da prescrição intercorrente aplicados às execuções civis e fiscais foram unificados.

Portanto, é totalmente viável argumentar a favor da existência de um regime unificado de prescrição intercorrente, visto que as normativas do artigo 40 da Lei de Execução Fiscal foram integradas ao Código de Processo Civil, estendendo-se igualmente às execuções civis. Além disso, essa nova configuração da prescrição atende às expectativas do Conselho Nacional de Justiça, que defende que os processos de execução não devem se prolongar sem limites.

Circunstâncias e a contagem do prazo
No sistema jurídico brasileiro, pode-se distinguir três tipos de prescrição. Conforme mencionado anteriormente, a prescrição está tradicionalmente ligada à noção de inatividade.

A nova lei estabelece duas circunstâncias específicas durante o processo de execução que podem iniciar a contagem de prazo de prescrição intercorrente: a) não localizar o devedor para citação ou intimação, e b) não encontrar bens do devedor que possam ser alvo de penhora ou outra forma de restrição judicial.

A outra mudança da lei é que, uma vez que o prazo de prescrição intercorrente comece, para que seja interrompido, é necessária a efetivação da citação do devedor ou a concretização da penhora de bens.

Portanto, meras solicitações por parte do credor ao Judiciário, (como ocorria anteriormente à nova Lei), como o fornecimento de um novo endereço para citação ou sugestões para a penhora de bens, não são mais suficientes para interromper o período de prescrição intercorrente já iniciado.

Mesmo que o credor demonstre diligência, mantendo o processo ativo através de solicitações contínuas ao judiciário para localizar o devedor ou seus bens, a prescrição intercorrente pode ainda assim ocorrer, a menos que a citação do devedor ou a penhora de bens sejam efetivamente realizadas. Essa nova abordagem destaca que, independentemente da atuação do credor, a interrupção da prescrição intercorrente agora depende exclusivamente da efetivação desses atos processuais.

Conclusão
O novo modelo de prescrição intercorrente em execuções civis gera amplo debate, e será responsabilidade do Superior Tribunal de Justiça harmonizar as opiniões conflitantes. Nesse ínterim, o papel do advogado envolvido nesses processos torna-se crucial.

O campo das execuções judiciais representa uma área de atuação profissional significativa, dada a alta prevalência de dívidas e inadimplência na população. Com o elevado número de processos de execução tramitando na Justiça brasileira sem resolução efetiva, o novo regime desempenhará um papel fundamental na redução da carga dos tribunais, que estão sobrecarregados com casos sem solução, facilitando a conclusão e o arquivamento dos processos.

Nesse contexto, é crucial reconhecer que, em várias situações, o direito de receber o crédito do credor, considerado também um direito fundamental, poderá ser comprometido pela ausência de bens do devedor passíveis de penhora. Isso sublinha a importância crescente de uma atuação jurídica que seja tanto específica quanto especializada.

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