Opinião

Bens passíveis de execução: compreendendo as limitações e responsabilidades

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  • é assistente judiciário do Tribunal de Justiça de São Paulo graduado em Direito pela Universidade Nove de Julho (2017) pós-graduado em Direito Constitucional pela Damásio de Jesus (2021) e pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Metropolitanas Unidas (2019).

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22 de março de 2024, 18h19

No contexto das execuções judiciais, nem todos os bens podem ser utilizados como pagamento das dívidas do executado. Existem limitações e nuances legais que merecem atenção e estudo aprofundado. Neste artigo, exploramos essas limitações, responsabilidades e as disposições legais pertinentes, visando a fornecer uma compreensão abrangente dos bens passíveis de execução.

Uma das limitações fundamentais está estabelecida no artigo 836 do Código de Processo Civil (CPC), que determina que a penhora não será realizada se ficar evidente que o valor dos bens do executado não é suficiente sequer para cobrir as custas da execução.

Esse cenário configura o que é conhecido como execução ou penhora frustradas. Em tais casos, o oficial de justiça descreverá os bens encontrados na residência ou estabelecimento do executado, nomeando-o depositário provisório até ulterior determinação judicial.

“Art. 836.  NÃO se levará a efeito a penhora quando ficar evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução.

§ 1º Quando não encontrar bens penhoráveis, independentemente de determinação judicial expressa, o oficial de justiça descreverá na certidão os bens que guarnecem a residência ou o estabelecimento do executado, quando este for pessoa jurídica.

§ 2º Elaborada a lista, o executado ou seu representante legal será nomeado depositário provisório de tais bens até ulterior determinação do juiz.”

Outra limitação, de natureza política, refere-se às impenhorabilidades. O artigo 833 do CPC lista as impenhorabilidades absolutas, enquanto o artigo 834 estabelece as relativas. Além disso, a Lei do Bem de Família (Lei nº 8.009/90) e o artigo 100 do Código Civil também influenciam nesse contexto.

A possibilidade de renúncia voluntária, embora ainda não totalmente consolidada na jurisprudência, também é uma limitação a ser considerada. Conforme o artigo 190 do CPC, é viável, por exemplo, renunciar a um bem de família para obter um empréstimo.

Os bens passíveis de execução estão detalhados no artigo 790 do CPC, abrangendo diversas situações, como bens do sucessor, sócio, devedor, cônjuge ou companheiro, entre outros. Cada uma dessas categorias implica diferentes responsabilidades e obrigações.

Por exemplo, os bens do sucessor podem responder pela dívida em casos de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória. Da mesma forma, os bens do sócio podem ser alvo de execução, especialmente em casos de responsabilidade tributária e desconsideração da personalidade jurídica, embora haja a possibilidade de se valer do benefício da ordem.

“Art. 790.  São sujeitos à execução os bens: I – do sucessor a título singular, tratando-se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória; II – do sócio, nos termos da lei; III – do devedor, ainda que em poder de terceiros; IV – do cônjuge ou companheiro, nos casos em que seus bens próprios ou de sua meação respondem pela dívida; V – alienados ou gravados com ônus real em fraude à execução; VI – cuja alienação ou gravação com ônus real tenha sido anulada em razão do reconhecimento, em ação autônoma, de fraude contra credores; VII – do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica.”

De acordo com doutrina, o estudo da responsabilidade remete à compreensão da dualidade entre shuld e haltung [1]: “Os bens de terceiros, por vezes, sujeitam-se à execução por dívida alheia. Há aí responsabilidade (Haftung) sem débito (Shuld). Quando a responsabilidade patrimonial recai sobre aquele a quem se imputa o débito, há responsabilidade primária; do contrário, quando se imputa responsabilidade a quem não tem o débito, há responsabilidade secundária”.

Execução dos bens

Continuando nossa análise sobre os bens passíveis de execução, no terceiro inciso, encontramos a possibilidade de o bem do devedor ser responsável, mesmo que esteja sob posse de terceiros. Em outras palavras, a execução pode ocorrer independentemente de quem detenha o bem.

No quarto inciso, há a contemplação da responsabilidade dos bens do cônjuge ou companheiro em casos de dívida contraída em benefício da economia doméstica. Vale ressaltar que, em casamentos sob os regimes de comunhão universal ou parcial, as dívidas contraídas em prol do casal são asseguradas pelo patrimônio comum, mesmo se originadas por apenas um dos cônjuges.

É crucial mencionar a Súmula STJ 251, que estabelece que a meação só será responsabilizada por ato ilícito quando o credor, em execução fiscal, comprovar que o enriquecimento decorrente desse ato beneficiou o casal. Essa súmula enfatiza a necessidade de prova do benefício à família na execução fiscal por parte do credor.

Súmula STJ 251 A meação só responde pelo ato ilícito quando o credor, na execução fiscal, provar que o enriquecimento dele resultante aproveitou ao casal.”

A fraude à execução é um aspecto crucial a ser considerado. Configura-se como um ato atentatório à dignidade da Justiça e pode ocorrer em diversas situações, como alienação ou oneração de bens pendentes de ação judicial ou com pretensão reipersecutória. Nesses casos, a alienação é considerada ineficaz em relação ao exequente.

Segundo a doutrina [2]: “A fraude à execução constitui ato atentatório à dignidade da Justiça e ilícito penal. Trata-se de manobra do executado que visa a subtrair à execução bem de seu patrimônio. Se reconhecida, a alienação ou oneração realizada em fraude à execução considera-se ineficaz com relação ao exequente”.

Fiadores responsabilizados

No que diz respeito aos fiadores, estes podem ser responsabilizados na execução, podendo exigir o benefício de ordem para que os bens do devedor principal sejam executados antes dos seus. O mesmo se aplica ao espólio, que responde pelas dívidas do falecido, mas com ressalvas após a partilha dos bens entre os herdeiros.

O elenco presente no artigo 792 do CPC é apenas exemplificativo, já que o inciso V abre a possibilidade para que a legislação estabeleça outras formas de fraude à execução. É importante observar que, para caracterizar a fraude contra credores, não é necessário provar a intenção deliberada de enganar, como destaca a doutrina. Basta a configuração das situações descritas.

Entre as hipóteses legais que configuram a fraude à execução, podemos citar a alienação ou oneração de um bem quando já há registro de uma ação envolvendo direitos reais. Da mesma forma, se a execução foi admitida pelo juiz e averbada no registro do bem, qualquer transação feita nesse período será considerada fraude.

Outras situações incluem a alienação após o registro de uma hipoteca judicial ou ato de constrição, bem como a realização de negócios quando o devedor está prestes a ser declarado insolvente por meio de uma ação judicial.

Nesses casos, a alienação em fraude à execução é ineficaz somente em relação ao exequente, ou seja, a venda é válida para outros propósitos, mas o juiz pode determinar a restrição sobre o bem. O §4º estabelece que o juiz deve intimar o terceiro adquirente antes de declarar a fraude, permitindo-lhe contestar a decisão em até 15 dias.

Em relação a bens não registrados, o terceiro precisa demonstrar sua boa-fé por meio de documentos, enquanto para bens registrados, presume-se a fraude, a menos que o desconhecimento da execução seja comprovado.

Em suma, os bens passíveis de execução estão sujeitos a diversas nuances legais e limitações. Compreender essas disposições é essencial para garantir a efetividade dos processos de execução e a proteção dos direitos das partes envolvidas.

 


[1] MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz e MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado, 2ª edição, rev., ampl. e atual., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 859.

[2] MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz e MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado, 2ª edição, rev., ampl. e atual., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 862.

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  • é assistente judiciário do Tribunal de Justiça de São Paulo, graduado em Direito pela Universidade Nove de Julho (2017), pós-graduado em Direito Constitucional pela Damásio de Jesus (2021) e pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Metropolitanas Unidas (2019).

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