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Visual law: como melhorar a comunicação forense

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2 de janeiro de 2024, 18h07

Feliz 2024. O primeiro texto do ano é um convite à reflexão quanto à implementação de estratégias de comunicação visual [visual law e animation law]. Antes de continuarmos, entretanto, você está lendo o texto porque o título capturou a sua curiosidade. A continuidade da leitura dependerá da sua aposta quanto às novidades que entregaremos. Aliás, Claude Shannon afirmou que informação é novidade. Do contrário, é redundância [repetição; mais do mesmo].

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Alexandre Morais da Rosa com tarja

O que é? Visual law é a incorporação de estratégias relacionadas à comunicação visual no ambiente jurídico com a finalidade de transmitir de modo eficaz o conteúdo da mensagem. Busca favorecer a compreensão dos contextos [casos; documentos; decisões etc.] por meio da integração de elementos visuais em layout funcional [gráfico; linha de tempo; storymap; imagem; áudio; vídeo; diagrama; infográfico; bullet; tabela; grafos etc.].

Motivo: Se você já leu uma peça jurídica monótona, chata e repetitiva, com dificuldades de entender o que o subscritor pretendia dizer, talvez você tenha maiores condições de entender o impacto do visual law no ambiente jurídico. Ninguém gosta de alocar o precioso tempo em leituras repetitivas e monótonas. Quantas vezes você se manifestou sobre petições iniciais, contestações ou recorreu de decisões longas, desarticuladas e chatas. Se o seu tempo é precioso, então, por dever de coerência, é inválido impor ao destinatário da mensagem, a horrorosa experiência de coisas mal escritas, complexas demais, desprovidas de preocupação com a experiência do leitor [usuário].

◊ Aplicações:

  • Documentos jurídicos
  • Ensino jurídico
  • Audiências
  • Julgamentos
  • Comunicação com clientes e leigos

O que não é? O visual law não é sobre cores, enfeites, figurinhas, memes ou questões exclusivamente estéticas. Também não exige que o profissional do Direito se torne um designer. É uma nova perspectiva para a comunicação eficaz no Direito. Reordena a representação gráfica de argumentos, transformando petições em documentos mais acessíveis e impactantes.

Impulso: O movimento ganhou fôlego em face dos trabalhos conduzidos pela professora Margaret Hagan junto ao Open Law Lab e ao Legal Tech Design da Universidade de Stanford, EUA. Desde então ampliou-se significativamente, conferindo vantagem competitiva a quem saber usar, sem excessos, os recursos disponíveis. No Brasil, além as práticas estão sendo fomentadas conforme pesquisa e material indexado por Bernardo de Azevedo [aqui], com diversas iniciativas profissionais e acadêmicas, inclusive com estímulo por parte do Conselho Nacional de Justiça [Resolução 347/2020 e Recomendação nº 144/2023].

Processo Eletrônico: No contexto do Processo Eletrônico, com ferramentas de design cada vez mais disponíveis, além dos recursos em geral desconhecidos do Microsoft Word, Power Point e Excel [ou as alternativas open source], é injustificável a manutenção do modelo narrativo herdado da máquina de escrever. É que o Processo Eletrônico promove experiências diferenciadas ao usuário, com vantagens e desvantagens decorrentes do formato dos autos. No que podemos melhorar a experiência do usuário, a apresentação estruturada e funcional do conteúdo melhora as condições de legibilidade e compreensão dos argumentos das partes.

STF: Embora ainda seja novidade para muitos, as estratégias melhoram a forma de apresentação, a hierarquia das informações mais relevantes, a navegabilidade documental e a compreensão do conteúdo, conferindo vantagem competitiva ao usuário. O ministro Gilmar Mendes sublinhou:

“Destaco que o uso do Processo Eletrônico, especialmente com grande volume de dados, pode adotar estratégias de otimização da navegabilidade quanto ao conteúdo, favorecendo o acesso e a compreensão. Os recursos estão disponíveis no contexto tecnológico e, em geral, não são utilizadas pelas partes, com a simples anexação de documentos sequer estruturados [COELHO, Alexandre Zavaglia; SOUZA, Bernardo de Azevedo. Legal Design e Visual Law no Poder Judiciário. São Paulo; RT, 2021]. O dever de cooperação processual também de refere ao acesso otimizado ao conteúdo.” [STF, HC 230.432, min. Gilmar Mendes, j. 18/7/2023]

◊ Autos Eletrônicos: Aproveitar os recursos disponíveis no ambiente digital é o desafio. Em documentos judiciais, evoluir é melhorar a redação do texto com objetividade e coesão, realizar formatação usando as fontes de letra mais legíveis, com espaçamento coerente, elementos visuais que facilitem a compreensão, referências objetivas aos argumentos [sugerimos o mapeamento dos argumentos], com menção à localização das provas nos autos.

◊  Vantagens:

  • Compreensão favorecida: O conteúdo visual é processado mais rápido e com melhor entendimento do que a leitura, especialmente de contextos complexos
  • Eficácia da transmissão: A estrutura, hierarquia e relacionamento entre os elementos do contexto favorecem o entendimento, com a redução dos ruídos de comunicação.
  • Tração cognitiva: A estratégia visual constrói a sequência de eventos de modo objetivo, atraente e funcional, ampliando a probabilidade de engajamento, empatia e reciprocidade do leitor [usuário].
  • Navegabilidade: A construção estruturada favorece a localização das coordenadas dos documentos, argumentos e peças, evitando a busca ativa do usuário.

◊ Uso Prático: Um exemplo narrado por Bernardo de Azevedo e Pedro Borges Mourão, membro do Ministério Público do Rio de Janeiro, auxilia na compreensão da proposta. Além da petição padrão da ação civil pública, constou da inicial o storymap a seguir, conferindo as condições para entendimento do contexto de modo direto, assertivo e objetivo. O esforço cognitivo do órgão julgador foi facilitado, transformando a experiência da leitura da peça e dos pedidos:

◊ Atualização comunicativa: A forma de se comunicar mudou. A quantidade de trabalho aumentou. O tempo parece ter diminuído, inundados de informações e ampliação das exigências de produtividade. Melhorar a comunicação é evoluir, atuar com uma nova perspectiva, transformada, direta, objetiva, clara, respeitando o tempo do outro, a atenção do leitor, o grau de conhecimento do destinatário da mensagem. Quem sabe este conteúdo desperte seu interesse em novas competências que acompanham o ritmo dinâmico do campo jurídico e respeitam o tempo de todos os envolvidos na leitura de seu conteúdo profissional. Afinal, seu tempo não vale mais do que dos demais, principalmente se você quiser ser efetivamente lido com atenção.

◊ Conteúdo: É verdade que a embalagem do produto não substitui a qualidade [precisão e acurácia]. Entretanto, a qualidade sem uma boa embalagem, sustenta-se apenas pela fidelidade do consumidor. Muitas pessoas herdaram da geração anterior o Leite de Rosas, sem que a embalagem tivesse se modernizado ao longo do tempo, situação diversa dos produtos Granado, que, após inovadora repaginação, escalaram o mercado. A proposta do visual law é a integrar conteúdo e comunicação visual com o escopo de melhorar o desempenho jurídico-comunicativo.

◊ Uso moderado: A clareza visual e a organização fortalecem argumentos, simplificam conceitos complexos e são compreendidos de maneira mais rápida, conectando-se de forma mais impactante com o leitor. O uso moderado de elementos visuais impacta positivamente, traz clareza à informação, destaca os pontos mais importantes, melhora a tração cognitiva, traz todos os dados em uma única leitura, dispensando o acesso a documentos externos, conferindo fluidez e inteligibilidade.

◊. Limites atuais: No futuro, quem sabe, possam ser incorporados: memes, emojis, gifs, TikTok etc. Por isso, preservada a tradição e certa liturgia do espaço forense, é inadequado que o julgador ou a parte manifeste-se sobre algo por emojis: 👍👎. Ademais, não se pode simplificar abusivamente a complexidade, preservando-se a completude e integridade do caso, observados os padrões éticos e normativos. Ainda que haja certa resistência, a tendência atual é a da assimilação das práticas de visual law [confira o site da Lawatta ou o instagram da Fernanda: visuallawoficial]. Aproveite os dias de recesso para aprofundar um pouco mais sobre o tema, com a ampliação do seu portfólio de recursos comunicacionais úteis.

. Sugestões: Deixamos algumas dicas:

  • 1 – Considere usar em um processo judicial recurso visuais como: quadro resumo, linha do tempo, gráfico com hierarquia de relações, fluxograma explicando etapas do caso, linha de tempo [obrigatório], tabelas comparativas, recorte de imagens, referências das provas [print]. Nada disso é novidade. A inovação está no estímulo a esta prática colaborativa.
  • 2 – Nunca faça relatório dos autos ou transcreva a decisão recorrida. Motivo: estão nos autos, você está repetindo porque não usa um sistema de gestão de caso e/ou gerencia o processo por pastas, anotações desestruturadas ou qualquer outra metodologia amadora. Se você precisou fazer o relatório para “inteirar-se” do caso, não repasse adiante o sintoma do amadorismo. O correto é destacar os argumentos principais, os pontos controvertidos e o conteúdo da decisão. Todo resto é redundante [entulho de informação]. Adote recursos na petição: [a] bullets; [b] prints; e, [c] tópicos.
  • 3 – Se for juntar aos autos algum material autônomo [card; gráfico, infográfico, considere entregar no gabinete do julgador 3 versões impressas em tamanho grande [A1 ou A2] e de boa qualidade [várias empresas prestam o serviço perto de você]. O motivo é que a leitura no computador é ruim e, ademais, restringe as anotações pessoais do julgador.
  • 4 – Visual law não é “enfeitar”, “colorir” ou “poluir” as petições com cores, desenhos ou gráficos amadores, surgidos da criatividade do subscritor. É atividade profissional. Não transforme a petição em “pinheirinho de natal” ou numa “penteadeira”. O minimalismo faz parte da tendência, conforme apontado semana passada [aqui].

Resumo: Escreva o documento da maneira como você gostaria de ler: utilizando resumos, indo direto ao ponto, começando pelos argumentos mais fortes, fazendo esquemas visuais para facilitar, deixando de lado o que não faz diferença na informação. E diante deste cenário, neste novo ano, quem deixar de usar as melhores ferramentas disponíveis, mantendo o padrão anterior, em pouco tempo, estará desatualizado, colocando em risco a reputação e a obtenção do melhor desempenho possível. Chegou a hora de adotar novos instrumentos comunicativos, em sua maioria, gratuitos e intuitivos. O desafio está lançado. Agora é com você. Se quiser bibliografia e recursos gráficos, a Fernanda BB te encaminha inbox pelo insta @visuallawoficial.

 

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