Caso internacional

Acusada de favorecer prostituição é absolvida porque vítimas já se prostituíam

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24 de abril de 2024, 7h51

O crime de favorecimento de prostituição (artigo 228 do Código Penal) pressupõe as condutas de induzir ou atrair alguém a se prostituir. Desse modo, o delito não se caracteriza se a suposta vítima já se prostituía.

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Duas das pretensas vítimas da ré já se dedicavam à prostituição

Com esse entendimento, a juíza Paula Mantovani Avelino, da 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, absolveu uma brasileira, moradora em Portugal, da acusação de favorecer a prostituição de três mulheres supostamente aliciadas no Brasil para fazerem programas sexuais nos Estados Unidos.

Conforme a julgadora, ficou demonstrado nos autos que duas das pretensas vítimas já se dedicavam à prostituição antes da ida aos Estados Unidos, porque exerceram essa atividade em viagem pretérita ao Catar, na qual a ré não teve qualquer participação.

A juíza anotou que, segundo entendimento pacífico da doutrina brasileira, apenas quem não se dedicava anteriormente à prostituição pode ser sujeito passivo das condutas de atrair e induzir descritas no tipo penal. Em relação à terceira suposta vítima, também não houve crime porque ela não chegou a se prostituir nos EUA.

A absolvição foi fundamentada no inciso III do artigo 386 do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal). Com essa decisão, foi determinada a restituição à acusada dos R$ 20 mil que ela pagou de fiança para responder ao processo solta. A ré teve mandado de prisão preventiva cumprido por agentes da Interpol em Portugal.

Denúncia inepta

Os advogados Marcelo José Cruz e Yuri Cruz sustentaram a tese de atipicidade da conduta ou de inexistência de provas de autoria, porém, preliminarmente, apontaram a denúncia como inepta por descrever os fatos de forma “genérica”, sem individualizá-los.

“A leitura do trecho da peça de acusação acima transcrito não deixa margem para dúvidas no sentido de que aquela não atende aos requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal, especificamente no que concerne à obrigação de descrição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias”, destacou Paula Avelino.

Porém, a juíza não acolheu a preliminar defensiva de inépcia, apesar de reconhecê-la, com a justificativa de ter assumido os autos após a instrução, quando eles já estavam conclusos para sentença, e do princípio da primazia do julgamento de mérito.

De acordo com a julgadora, a denúncia, “em alguns pontos, tangencia, realmente, com a inépcia”. Porém, ela optou por examinar mesmo assim o feito, “considerando, nessa análise, além da apreciação da materialidade, autoria e tipicidade, as questões relacionadas à imprestabilidade das iniciais alegada pelos acusados”.

O Ministério Público Federal juntou nos autos diálogos entre a acusada e o corréu em um aplicativo de mensagens, nos quais eles conversaram sobre prostituição, valores a serem pagos e divisão de comissões, citando os nomes de algumas garotas.

Contudo, ao citar tais diálogos na denúncia, o MPF não estabeleceu relação direta com as três vítimas. “Cabe ao titular da ação penal descrever o fato criminoso que imputa aos acusados, descrição essa que não foi realizada, ao menos da forma como determina nossa legislação processual penal”, frisou a juíza.

‘Book rosa’

A denúncia é derivada de investigação da Polícia Federal contra rede de tráfico internacional de mulheres para a prostituição de luxo. Com base nessa mesma apuração, o MPF ofereceu mais quatro denúncias, sendo todas reunidas na mesma ação penal.

A magistrada que recebeu os autos conclusos para a sentença criticou a realização da instrução do processo sem o desmembramento das denúncias. “É medida heterodoxa, que tornou dificultosa a tramitação dos autos”. As cinco iniciais totalizaram sete réus e 30 vítimas.

Segundo a denúncia específica contra a brasileira presa em Portugal, com o fim de “lucro fácil” e se valendo do serviço de “book rosa”, ela auxiliou o corréu, apontado como líder do esquema, denunciado em todas as ações, a induzir e atrair as vítimas para a prostituição.

Processo 5003525-82.2020.4.03.6110

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