Lobo em pele de cordeiro

Discurso de proteção pode camuflar interesses econômicos, diz Streck

18 de abril de 2024, 8h24

A defesa da diminuição das áreas agricultáveis no Brasil por parte da comunidade internacional pode camuflar interesses econômicos (e protecionistas) de parte das nações desenvolvidas.

Lenio Streck em painel sobre democracia e populismo na 24ª Conferência da Advocacia

Streck afirma que a proteção neocolonial tem por trás interesses econômicos

Esse fenômeno, que Blanco de Morais batizou de “neocolonialismo”, foi comentado pelo advogado e professor Lenio Streck em entrevista exclusiva à revista eletrônica Consultor Jurídico.

Segundo ele, é legítimo que a França, por exemplo, queira defender seus próprios interesses e proteger o mercado interno da agricultura, mas esse protecionismo não pode se esconder por trás do discurso da proteção ambiental no Brasil.

“A grande questão é qual o tamanho das aspas que se coloca nesse conceito de proteção. Uma proteção neocolonial tem por trás interesses econômicos que, uma vez explicitados, abririam uma nova dimensão ao debate sobre essa pretensa proteção ao meio ambiente”, refletiu Streck.

“E países como o nosso precisam estar muito atentos, porque estão em jogo questões ligadas à soberania e ao nosso grande tesouro, que é o território, e o que esse território produz. É nisso que nós temos de apostar agora.”

Arcabouço normativo

Lenio Streck aponta que o arcabouço normativo que garante a soberania do território brasileiro está “todo pendurado” no artigo 190 da Constituição, que determina que a lei vai limitar a aquisição ou o arrendamento de propriedade rural por estrangeiros. A questão está regulamentada na Lei 5.709/1971.

“O que se tem, principalmente, é a limitação de compra de terras por estrangeiros”, explica. Essas medidas são importantes para que as terras do país não sejam alienadas, especialmente em um momento em que o mundo inteiro precisa cada vez mais de alimentos.

Investimentos estrangeiros

A limitação, que é diferente do veto, é o que garante que não sejam afastados investimentos estrangeiros. Na verdade, Streck defende que os investimentos estrangeiros se concentrem em áreas que não sejam críticas para a soberania do país.

O princípio da soberania deve se sobrepor às vantagens econômicas, segundo ele. “O Direito vale mais do que a análise econômica, evidentemente”.

Ele compara a análise econômica ao canto das sereias, que enfetiçam homens na Odisseia. Odisseu pede que seus companheiros o amarrem ao mastro e não obedeçam a nenhuma ordem posterior sua, porque disso depende a sobrevivência de todos.

“As sereias são as maiorias. São os desejos morais, a análise econômica, às vezes a análise política. Mas o Direito tem de permanecer firme”, conclama.

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