Barbárie em Brasília

Brasil teve sua própria invasão do Capitólio, e foi muito fácil participar dela

Autor

8 de janeiro de 2023, 21h04

O Brasil teve neste domingo (8/1) sua própria invasão do Capitólio, com o apoio ou complacência da Polícia Militar do Distrito Federal.

Tiago Angelo/ConJur
Interior do prédio do STF, em Brasília,
depredado pelos vândalos terroristas
Tiago Angelo/ConJur

Há poucas vias de acesso à Praça dos Três Poderes, local onde ocorreram os atos terroristas. Com isso, sempre foi relativamente fácil para as forças de segurança controlar a entrada e saída de pessoas na Esplanada dos Ministérios e nas sedes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.

No último dia 7 de setembro, por exemplo, era preciso passar por barricadas policiais e revistas para chegar aos atos. Na posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), só era possível descer a Esplanada dos Ministérios a pé. As duas vias laterais que dão acesso à Praça dos Três Poderes, a S2 e a N2, estavam fechadas. 

Neste domingo, no entanto, era possível chegar de Uber perto da praça, sem ser parado por ninguém, no momento em que STF, Congresso Nacional e Palácio do Planalto já estavam tomados pela turba de bolsonaristas inconformados com o resultado das eleições. Antes disso, os terroristas foram escoltados pela PM rumo à Esplanada dos Ministérios.

O jornal O Estado de S. Paulo chegou a flagrar policiais deixando uma das poucas barreiras para comprar água de coco em frente à Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida. Agentes também tiraram fotos com os participantes. 

Havia policiais, mas eram poucos, e os grupos de bolsonaristas desciam a Esplanada dos Ministérios e as duas vias laterais sem que os agentes impedissem aglomerações maiores na Praça dos Três Poderes, onde ocorreram as depredações.

Tiago Angelo/ConJur
Bolsonaristas orando por intervenção militar
Tiago Angelo/ConJur

 

Em resposta, a Advocacia-Geral da União pediu a prisão do secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (PL). 

Torres está nos Estados Unidos. O pedido de prisão foca na postura do ex-ministro em relação às movimentações terroristas deste domingo: já se sabia que ocorreriam atos, e grupos bolsonaristas se movimentavam nas redes sociais durante todo o fim de semana. 

Ibaneis Rocha (MDB), governador do Distrito Federal, responsabilizou o Exército pela invasão. Ele disse à CNN Brasil que a Força deveria ter "acabado com acampamento" bolsonarista que há no DF, mas "não o fez". Ainda assim, exonerou Torres

O presidente Lula decretou intervenção na segurança pública do DF por causa dos atos não reprimidos em Brasília. O decreto foi lido por ele em um pronunciamento em que condenou a atuação dos vândalos. 

No STF, a barbárie
A revista eletrônica Consultor Jurídico acompanhou os atos terroristas. Por volta das 15h40, bolsonaristas já estavam dentro do plenário do Supremo, retirando cadeiras, destruindo equipamentos e quebrando janelas.

Tiago Angelo/ConJur
Bolsonarista escreve 'perdeu, mané' na estátua 'A Justiça'
Tiago Angelo/ConJur

No mesmo andar em que fica o plenário, os alarmes de incêndio foram acionados e começou a sair água dos sprinklers, molhando todo o salão. Para entrar, era preciso ficar com a água na altura da canela. A água escorreu para os andares de baixo, e ainda não é possível saber o nível do estrago. 

A escultura "A Justiça", que fica em frente à corte, foi pichada. Uma manifestante escreveu a frase "perdeu, mané", em referência a uma declaração do ministro Luís Roberto Barroso quando foi abordado por bolsonaristas em Nova York depois da vitória de Lula. 

Os manifestantes arrancaram a porta do armário em que é guardada a toga usada pelo ministro Alexandre de Moraes. Cadeiras e um brasão da República também foram retiradas do prédio do STF. 

A polícia começou a retirar os terroristas do Supremo por volta das 17h. Parte deles teve de quebrar vidros do interior da corte para conseguir sair. O prédio ficará interditado nesta segunda-feira (9/1) para perícia. 

Tiago Angelo/ConJur
Momento em que a polícia conseguiu dispersar os manifestantes do prédio do STF
Tiago Angelo/ConJur

Intervenção militar
Havia de tudo em Brasília no show de horrores deste domingo: manifestantes batendo palmas para helicópteros da polícia antes de serem atingidos por bombas lançadas pelas próprias aeronaves; grupo de oração por intervenção militar; pichações pedindo acesso ao código-fonte das urnas, que já está liberado desde outubro de 2021 para as entidades fiscalizadoras; e discussões entre bolsonaristas.

Havia duas correntes: uma afirmava que era necessário o caos para que os militares agissem. Foi com base nesse argumento que um homem defendeu atear fogo em um carro da Polícia Legislativa que foi lançado no espelho d'água do Congresso. A outra corrente afirmava que depredar era se equiparar "aos bandidos". 

Os bolsonaristas invadiram o Congresso por volta das 15h. O local foi o último a ser liberado pelas forças de segurança: o ato em frente ao prédio do Legislativo só começou a ser esvaziado por volta das 20h. Uma faixa em que estava escrito "intervenção" foi estendida.

Tiago Angelo/ConJur
Carro da Polícia Legislativa no espelho d'água do Congresso; manifestantes ameaçaram atear fogo no veículo
Tiago Angelo/ConJur

 Veja a lista de itens danificados por bolsonaristas:

  • Tela "A Mulata", do pintor Di Cavalcanti, que fica no terceiro andar do Planalto;
  • Brasão da República, que fica no plenário do STF;
  • Cadeiras dos ministros do STF;
  • Porta do armário das togas do ministro Alexandre de Moraes;
  • Objetos e móveis que ficam na sala da primeira-dama, Janja da Silva;
  • Vitral da artista plástica Marianne Peretti, no Congresso Nacional;
  • Vitrines do Congresso e do Planalto, que exibiam objetos históricos;
  • Vidraças do STF;
  • Janelas do Congresso, do Supremo e do Planalto;
  • Mesas e armários dos prédios;
  • Galeria de fotos dos presidentes da República, no Planalto. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!