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O Barão de Itararé, as eleições e as consequências econômicas que vêm depois

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  • é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) advogado e sócio do escritório Silveira Athias Soriano de Mello Bentes Lobato & Scaff Advogados.

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25 de outubro de 2022, 8h00

Na reta final desta campanha eleitoral, parece que os candidatos estão muito mais preocupados com a pauta de costumes do que com a economia. Discute-se a bobagem do banheiro unissex, como se discutiu em 2018 a mamadeira de piroca. Nessa pauta, a única notícia que merece atenção é a acusação de assédio do presidente Bolsonaro às meninas venezuelanas. Contudo, não se discute o futuro do país.

Spacca
Muitos fatos apontam para nuvens no horizonte a curto prazo — isto é, primeiro trimestre de 2023. Segundo o jornal Valor Econômico da última sexta feira (21/10/22), a fabricante das conhecidas marcas Cônsul e Brastemp teve redução de lucro em 70%, fruto do cenário macroeconômico adverso — pelo menos ainda teve lucro… A expectativa de saldo positivo nas contas públicas (superavit primário) caiu em R$ 20 bilhões, em razão da queda na estimativa de arrecadação, conforme projeção da  Instituição Fiscal Independente (IFI). O PIB caiu 1,13% em agosto, segundo o Banco Central.

Em um cenário tão devastador, constata-se que o presidente Bolsonaro abriu os cofres públicos na campanha por sua reeleição. O Valor Econômico aponta que foram aprovadas despesas, todas com prazo de vencimento em 31 de dezembro deste ano: (1) com o Auxílio Brasil: R$ 26 bilhões; (2) vale-gás ampliado: R$ 1 bilhão; (3) auxílio a caminhoneiros: R$ 5,4 bilhões; (4) auxílio a taxistas: R$ 2 bilhões; e (5) transporte a idosos: R$ 2 bilhões.

Foram também aprovadas renúncias fiscais, representadas pelo corte de Pis/Cofins e Cide sobre combustíveis até final do ano: R$ 31,5 bilhões.

Total do pacote de bondades eleitorais relacionadas pelo Valor Econômico: R$ 68 bilhões. Só no grupo do Auxílio Brasil constam 21 milhões de pessoas, sendo que, na prática, o pagamento está se tornando per capita e não por famíliao número de famílias unipessoais foi fortemente ampliado desde o início do pagamento desse benefício, o que causa estranheza.

Há também, no grupo de renúncias fiscais, a possibilidade de as pequenas e médias empresas renegociarem parte de suas dívidas tributárias, o que importa em mais R$ 20 bilhões.

De onde vem esse dinheiro? Do cancelamento de programas em prol da educação, saúde, ciência e tecnologia (sobre o assunto, confira as reportagens de Uol, Veja, Folha de S.Paulo e ConJur), para usar na reeleição, sem efetiva transparência. Resultado: população empobrecida e a economia despencando.

Mas não é só. Existe outro grupo nesse pacote de bondades eleitorais, que visa a apagar a pandêmica atuação governamental durante a pandemia, que são os empréstimos, que devem ser quitados futuramente: (1) foram disponibilizados R$ 87 bilhões em crédito para micro e pequenas empresas; (2) os trabalhadores puderam sacar R$ 30 bilhões que estavam depositados no FGTS, reduzindo fortemente seu saldo naquele fundo e comprometendo o equilíbrio do sistema a médio prazo; e (3) ainda sobre o FGTS, foi permitido o uso de parcelas a receber para obter o financiamento da casa própria — e se o indivíduo ficar desempregado, possibilidade gigantesca nos dias atuais, sua dívida só aumentará, e ainda perderá o imóvel. Além disso, (4) quem recebe o Auxílio Brasil, hoje em R$ 600 por decisão do Congresso, poderá obter empréstimo consignado usando o futuro recebimento desse auxílio (que vence em dezembro de 2022), cujas operações, só na semana passada, já chegaram a R$ 1,8 bilhão. Isso é dinheiro injetado na veia desse grupo de pessoas, antecipando benefícios que deveriam ser pagos de forma mensal, visando garantir seu sustento. Alguém tem dúvida de que dinheiro antecipado, sob a forma de empréstimo, vai evaporar? Já dizia uma velha música do Paulinho da Viola, dinheiro na mão é vendaval….

Se você acompanhou até aqui, saiba que ainda tem mais, pois os empréstimos anteriormente concedidos foram perdoados, tendo sido (1) concedido perdão de até 99% das dívidas junto ao Fies (Lei 14.375/22) e (2) também concedido perdão de 90% das dívidas para os inadimplentes com a Caixa Econômica Federal, após o afastamento do presidente da Caixa por assédio sexual.

Tudo isso acrescido do famigerado Orçamento Secreto, que a revista Piauí resumiu em um vídeo com enorme poder de síntese, que comprova a vinculação do presidente Bolsonaro em sua gestão e sua importância eleitoral. Valor do orçamento secreto para esse ano: R$ 19 bilhões.

Nem vou tratar da camisa de força que o governo federal impôs aos estados e, por tabela, aos municípios, com o teto do ICMS, o que os impactou em incontáveis bilhões, comprometendo os serviços públicos que estão a seu encargo, como saúde, educação e segurança pública. Nesse ponto, o presidente Bolsonaro fez uma cortesia com o chapéu alheio, pois apenas garroteou de imediato o ICMS dos estados, pegando carona em uma decisão do STF (Tema 745, Repercussão Geral), que estabelecia sua redução apenas em 2024 — mas, até lá, as eleições teriam passado… O irônico é que o slogan desse governo é mais Brasil e menos Brasília — lembram?

Aliás, o capítulo sobre redução do preço dos combustíveis merece uma análise específica, pois houve redução dos tributos (os federais, até final do ano; e o estadual, de forma perene), mas o preço dos bens e serviços permanece igual ou aumentando (o frete ficou mais barato? Ou o ônibus? O táxi? O Uber? O supermercado?). Além disso, a Petrobras continua gerando lucros, o que demonstra que o problema não foi enfrentado, mas driblado, pois o preço do barril aumenta no mercado internacional, entretanto os preços permanecem os mesmos — até passar a eleição.

Muitas dessas medidas são importantes, mas porque estão sendo realizadas apenas agora, às vésperas das eleições? O jornal Folha de S.Paulo elaborou um infográfico que indica as datas em que várias dessas medidas foram aprovadas, o que demonstra a trilha em busca da reeleição, para um candidato que, em 2018, prometia não se candidatar à reeleição — o que foi esquecido.

A lista de irresponsabilidades fiscais poderia ser ampliada, mas paro por aqui e retorno ao início.

O que todos esses fatos econômicos criaram na economia? A curto prazo (até o final do ano), tudo aponta para um voo de galinha — como você sabe, galinhas não voam longe, quando muito dão uns saltos esvoaçantes e logo retornam ao solo. Essas medidas econômicas podem até dar a impressão de que vamos decolar como uma águia, mas é falso. Quais obras estruturantes estão sendo realizadas com essa dinheirama toda? Nenhuma.

De fato, como dizia o refinado humorista Barão de Itararé, as consequências vêm depois…

E o depois implica em depois das eleições, que ocorrerão no próximo domingo, quando todo o quadro acima começará a ser desmontado e a realidade econômica que surgirá não será nada boa.

Sigamos o dinheiro e constataremos que, qualquer que seja o vencedor, está ocorrendo o abuso de poder econômico — com dinheiro público, representado pelos nossos impostos — ou você acha que todos esses bilhões surgiram em árvores? O Ministério Público Eleitoral está olhando muito mais para a pauta de costumes do que para a rota do dinheiro, rumo às urnas. Não se deu conta que a pauta de costumes é apenas uma cortina de fumaça para esconder o uso abusivo do dinheiro público em busca da reeleição.

Parodiando a frase de James Carville para Bill Clinton em 1992: É o dinheiro, estúpido…

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  • é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP), advogado e sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff Advogados.

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