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Citação a indígena é anulada no TRF-1 por falta de intérprete de língua nativa

25 de fevereiro de 2024, 8h23

Um indígena do povo Enawenê-Nawê, do noroeste de Mato Grosso, recebeu uma citação da Justiça pela acusação de um crime. Por lei, ele deve ser oficiado sobre a denúncia, porém havia uma particularidade: a língua. Falantes de idioma próprio, os Enawenê são povos de recente contato e muitos não falam português, comunicando-se com a sociedade por meio de intérpretes.

Construção típica da etnia indígena Enawenê-nawê, em Mato Grosso

Construção típica da etnia indígena Enawenê-Nawê, em Mato Grosso

Uma vez que o respeito à língua não foi considerado, a Defensoria Pública da União (DPU) pediu a anulação da citação. O pedido foi aceito pelo desembargador federal Marcus Bastos, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), e o indígena do povo Enawenê-Nawê teve garantido o direito justo de acusação, respeitando seu idioma nativo.

A citação acontece quando uma pessoa é notificada sobre a acusação de algum crime e é um direito de todo brasileiro, previsto no Código Penal. A anulação foi feita por meio de Habeas Corpus — proteção da liberdade de locomoção do indivíduo — com pedido de liminar.

“Citado o réu por WhatsApp sem lhe ter sido disponibilizado intérprete ou tradução da denúncia, esta Defensoria Pública apresentou resposta à acusação sustentando a nulidade da citação, requerendo a realização de perícia antropológica e designação de intérprete”, escreveu o defensor público federal Raphael Santoro, integrante do Grupo de Trabalho Povos Indígenas, na ação protocolada no TRF-1.

De acordo com Santoro, é preciso levar em consideração as tradições, territorialidades, culturas e línguas indígenas, de forma a permitir a ciência dos indígenas do conteúdo de toda ação judicial, sem a qual poderia haver exclusão social no acesso à Justiça.

O defensor citou a Resolução 454/2022 do Conselho Nacional de Justiça como base para o pedido de anulação da citação. A resolução diz que a notificação da acusação de crime cometido por indígena deve ser feita de forma pessoal, presencialmente, e explicada em sua língua originária, acompanhada por intérprete.

“As resoluções existem justamente para objetivar o melhor tratamento isonômico aos jurisdicionados indígenas, sempre com observância e respeito às suas particularidades”, destacou o defensor no pedido de Habeas Corpus. Com informações da assessoria de imprensa da DPU.

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