Opinião

A revisão do voto proferido por juiz afastado ou substituído

Autor

  • Bruno Augusto Sampaio Fuga

    é advogado professor doutor em Direito Processual Civil pela PUC-SP (2020) pós-doutorando pela USP membro titular efetivo da Academia de Letras de Londrina (PR) mestre em Direito pela UEL (linha de Processo Civil) pós-graduado em Processo Civil (2009) pós-graduado em Filosofia Jurídica e Política pela UEL (2011) coordenador da Comissão de Processo Constitucional da OAB Londrina membro do IBPD e IAP conselheiro da OAB Londrina e editor-chefe da Editora Thoth.

18 de abril de 2024, 15h24

O ponto central do debate é: é possível alterar voto de julgadores substituídos ou afastados? Aparentemente pelo conteúdo do artigo 941, parágrafo primeiro, [1] não. O assunto tem então relação com o Código de Processo Civil, artigos 941 a 942 [2].

Veja que o texto legal indica a possibilidade de alteração “até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído“. Ou seja, na hipótese de juiz afastado ou substituído, não poderá ter alteração de voto — diz o texto legal.

Mas precisamos avançar no tema para mostrar, inclusive, nosso posicionamento. A hipótese seria juiz substituído e com voto proferido, mas posterior início do julgamento estendido com fundamento no artigo 942.

Primeiro, tendo dois votos desfavoráveis ao julgamento (hipótese de parte perdendo por dois votos a um), um julgador sendo substituído, esse voto estará travado, sem possibilidade de mudança e, assim, impedindo a aplicação do disposto no artigo 942, § 2º: “Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento”.

Diga-se que estando o julgamento em dois votos a um, deverá inicialmente o recorrente que estiver perdendo em votos tentar convencer os outros dois novos julgadores que devem votar, podendo, assim, reverter o julgamento.

Mas importante pensar também que não apenas a análise desses dois novos julgadores será importante, como também a possibilidade de mudança de voto dos outros julgadores que já participaram da primeira fase do julgamento (CPC, artigo 942, §2º).

Esse fato é, inclusive, previsto, como mencionado, no artigo 942, §2º. A existência de um voto com impedimento de mudança fere o próprio direito de atuação do advogado de mostrar elementos aptos a mudança de posição do julgador. Diga-se, inclusive, que o julgamento com fundamento no artigo 942 permite julgamento com esse cenário, com nova sustentação oral, com novos dois votos que podem mostrar elementos aptos a mudança de entendimento dos julgadores que já votaram.

Spacca

Não me parece acertado ter um voto congelado mesmo estando o julgamento em pleno curso, com sustentações [3] e votos novos sendo proferidos.

Possibilidades

São duas, portanto, as possibilidades. Uma, impedir a mudança de voto, ou possibilitar a alteração de votos. Sou da segunda corrente.

Ao novo julgador indicado no julgamento já em curso, com voto já proferido, não poderá ao bel prazer simplesmente mudar o voto do juiz afastado ou substituído. Mas poderá, em situações excepcionais, com demonstração de argumentos aptos a mudança do voto, alterar o voto já proferido do juiz substituído.

Como já afirmamos, o próprio texto legal no artigo 942, §2º, permite a alteração de voto, não devendo, portanto, existir voto congelado antes mesmo de iniciar o julgamento do artigo 942.

Importante também destacar que da decisão proferida em acórdão caberá embargos de declaração [4], esse que por sua essência poderá ter efeito modificativo em seus votos. [5] Novamente, esse é um exemplo de congelamento equivocado do voto, pois o impedimento total de alteração do voto seria violação do próprio conteúdo da lei federal (embargos de declaração) que permite alteração de votos em situações especificas processuais.

 


[1] CPC, § 1º O voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído. (grifo nosso)

[2] Art. 941. Proferidos os votos, o presidente anunciará o resultado do julgamento, designando para redigir o acórdão o relator ou, se vencido este, o autor do primeiro voto vencedor. § 1º O voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído. (…)  Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores. § 1º Sendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado. § 2º Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento. (…)

[3] FPPC – Enunciado 682: É assegurado o direito à sustentação oral para o colegiado ampliado pela aplicação da técnica do art. 942, ainda que não tenha sido realizada perante o órgão originário.

[4] Técnica do julgamento ampliado (CPC, art. 942) deve ser aplicada os embargos de declaração interpostos contra acórdão de apelação quando o voto vencido, nascido apenas nos embargos, for suficiente para alterar o resultado inicial da apelação, independentemente do desfecho não-unânime dos declaratórios — se rejeitados ou acolhidos, com ou sem efeitos modificativos. 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Vencidos a relatora, ministra Nancy Andrighi, e o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. REsp 1.833.497 (Agosto de 2020).

STJ – AREsp 2.214.392/SP. A aplicação do art. 942 do CPC/2015 deve ser observada no julgamento não unânime dos embargos de declaração na hipótese em que, do julgamento dos embargos de declaração opostos contra o acórdão de apelação unânime, surge divergência que altera o resultado inicial. (grifo nosso, STJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 3/10/2023, DJe 5/10/2023) (Informativo 790).

[5] CJF – II Jornada de Direito Processual Civil – Enunciado 137: Se o recurso do qual se originou a decisão embargada comportou a aplicação da técnica do art. 942 do CPC, os declaratórios eventualmente opostos serão julgados com a composição ampliada.

CJF – III Jornada de Direito Processual Civil – Enunciado 190: No caso de serem acolhidos, por maioria e com efeitos infringentes, os embargos de declaração opostos contra acórdão que julgou unanimemen-te a apelação, o julgamento deverá ter prosseguimento nos termos do art. 942 do CPC.

PPC – Enunciado 599: A revisão do voto, após a ampliação do colegiado, não afasta a aplicação da técnica de julgamento do art. 942.

Autores

  • é advogado e professor, doutor em Direito Processual Civil pela PUC-SP (2020), pós-doutorando pela USP, membro titular efetivo da Academia de Letras de Londrina, mestre em Direito pela UEL (linha de Processo Civil), pós-graduado em Processo Civil (2009) e em Filosofia Jurídica e Política pela UEL (2011), ex-coordenador e fundador da Comissão de Processo Civil da OAB-Londrina (PR), ex-coordenador da pós-graduação em Processo Civil do IDCC Londrina (2018-2022), membro do IBPD, IAP e IPDP, conselheiro da OAB Londrina e editor chefe da Editora Thoth.

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