Interesse Público

Aprovação do marco legal que prevê a criação das debêntures de infraestrutura

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21 de dezembro de 2023, 8h00

Recentemente, a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB) [1] conduziu um levantamento que apontou um aumento nos investimentos em infraestrutura no Brasil desde 2020, destacando a significativa influência dos investimentos privados nesse setor que sinaliza, apesar da retomada nos investimentos em infraestrutura nos últimos anos, um déficit entre os investimentos realizados em 2023 e os necessários, totalizando aproximadamente R$ 249,9 bilhões.

O atual cenário de juros altos do país e outros fatores externos (tais como os efeitos da pandemia Covid-19, das guerras entre Rússia e Ucrânia, no oriente médio e, mais recentemente, entre Israel e Palestina, todos com impacto sobre o PIB e a inflação mundial) se apresentam como um desincentivo ao investimento privado e consequentemente impactam a melhoria na prestação de serviços públicos, dado que parte expressiva da infraestrutura necessária está atrelada à citada atividade administrativa.

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Entretanto, no dia 13/12/2023, boas notícias chegaram do Congresso com a aprovação do Projeto de Lei nº 2.646/2020, que dispõe sobre a criação das aguardadas debêntures de infraestrutura. O texto agora aguarda sanção presidencial.

A pretensão do PL é contribuir para a alavancagem financeira de projetos de infraestrutura, promovendo alterações no marco legal das debêntures incentivadas e do Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE), do Fundo de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I) e do Fundo Incentivado de Investimento em Infraestrutura (FI-Infra).

Os recursos captados por meio da emissão de debêntures deverão ser destinados à implementação de projetos de investimento na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação considerados como prioritários observado o regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo Federal. O regulamento deverá ser publicado bienalmente e poderá ser alterado para incluir setores em que investimentos tenham se tornado prementes por imperativos de ordem pública.

Cabe ao citado ato normativo estabelecer os critérios para o enquadramento dos projetos, que devem incluir: setores com grande demanda de investimento em infraestrutura; ou projetos com efeito indutor no desenvolvimento econômico local ou regional.

Vale dizer, a despeito de diferir para o momento futuro a fixação dos critérios, a lei antecipa as balizas que nortearão o regulamento. O viés social está revelado pelo fato de que a lei prevê que o ato normativo fixe os critérios e as medidas destinados a incentivar o desenvolvimento de projetos que proporcionem benefícios ambientais ou sociais relevantes.

Os projetos que envolvam os setores prioritários listados no regulamento dispensarão a exigência de aprovação ministerial prévia.

Substancialmente, o foco é o incentivo tributário autorizando dedução diferenciada, para fins de IRPJ e da CSLL, dos custos com a implementação de projetos na área de infraestrutura em áreas consideradas prioritárias, na hipótese de financiados por meio da emissão de debêntures de infraestrutura.

Até então, a legislação previa apenas a emissão de debêntures incentivadas, que são títulos de dívida emitidas conforme regras estabelecidas pela Lei nº 12.431/2011, e que concedem as pessoas físicas isenção de imposto de renda sobre os rendimentos gerados por esses títulos e para as pessoas jurídicas a alíquota de 15%, de modo a atrair investimentos para financiar projetos que contribuam para o desenvolvimento de infraestrutura no Brasil. As debêntures incentivadas concedem benefícios tributários para o comprador do título, em especial as pessoas físicas.

A proposta legislativa da criação das debêntures de infraestrutura é impulsionar o mercado de debêntures, conferindo benefícios também ao emissor da dívida, que pode: deduzir, para efeito de apuração do lucro líquido, o valor correspondente à soma dos juros pagos ou incorridos, nos termos permitidos pela legislação do imposto sobre a renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e excluir na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, o valor correspondente a 30% da soma dos juros relativos às debêntures em comento.

A tributação incidente sobre os rendimentos seguirá as alíquotas previstas para renda fixa e considerada antecipação do IR no caso de pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado e sujeito a tributação definitiva, no caso de pessoas físicas e pessoas jurídicas optantes pelo Simples Nacional ou isentas.

A alíquota zero no caso das debentures de infraestrutura beneficiou instituições financeiras, inclusive sociedade de seguro, previdência, capitalização, entre outras. A expectativa é a de que o benefício fiscal impulsione os emissores a oferecer taxas de juros mais atrativas, medida concebida também para atrair outros personagens como fundos de pensão.

Nos termos do PL nº 2.646, as pessoas jurídicas, constituídas sob a forma de sociedade por ações, que poderão realizar a emissão de debêntures de infraestrutura, até dezembro 2030, são sociedade de propósito específico, concessionárias, permissionárias e autorizatárias de serviços públicos, além de arrendatárias e sociedades controladoras direta ou indireta das prestadoras de serviços referidas anteriormente.

A primeira versão do texto, quando da aprovação inicial pela Câmara dos Deputados, previa que o benefício legal se estenderia pelo prazo de cinco anos. Mas a redação final recobrou a necessidade de considerar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

As vedações para aquisição das debêntures de infraestrutura alcançam pessoas físicas controladoras diretas ou indiretas, acionistas titulares de mais de 10% das ações com direito a voto ou administradoras do emissor seus cônjuges ou companheiros e parentes até o segundo grau, inclusive por afinidade, pessoas jurídicas que sejam suas controladoras, controladas ou coligadas e os fundos dos quais alguma das pessoas físicas ou jurídicas seja cotista detentora de mais de 10% das respectivas cotas.

Ainda, o PL nº 2.646 aumentou o prazo para que fundos de investimento em participações em infraestrutura (FIP-IE) e fundos de investimento em participação na produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação (FIP-PD&I) entrem em funcionamento, passando de 180 para 360 dias.

Destaca-se também a introdução do princípio da neutralidade cambial, inserida a fim de proteger o investidor da variação da moeda, verificada por meio da autorização do poder executivo federal para a emissão de debêntures de infraestrutura com cláusula de variação de câmbio.

Além disso, por meio do projeto de lei ora em comento, foi aprovada a elevação da tributação do rendimento das debêntures de infraestrutura quando auferidos em país ou dependência com tributação favorecida e por beneficiário de regime fiscal privilegiado, passando de 22,5% para 25%.

Ademais, ao passo que a legislação atual prevê o repasse de 67% e 85% do valor do patrimônio líquido do fundo que investe em projetos de investimento nas áreas de infraestrutura, pesquisa, desenvolvimento e inovação, o PL nº 2.646 introduziu alteração para que a base de cálculo passe a ser o “valor de referência do fundo”, ou seja, o menor dos valores entre o patrimônio líquido na data de referência e a média desse valor nos últimos 180 dias, de modo, assim, a evitar um relaxamento na regra de aplicação mínima dos recursos.

Há que se ressaltar os pontos positivos do projeto de lei aprovado para o mercado de infraestrutura. Entretanto, cabe destacar como ponto negativo o esmorecimento do estímulo aos projetos de investimento que proporcionem benefícios ambientais ou sociais relevantes. Inicialmente, a proposta previa uma ampliação da alíquota de 30% para 50% de dedução na base de cálculo do IRPJ e CSLL para empresas que possuíssem comprovação de boas práticas ambientais e sociais por meio de certificação internacional.

Sabe-se, entretanto, que a exigência de certificação não é prática consolidada e deixaria muitas dúvidas sobre sua implementação. Optou-se pela simplificação, remetendo à análise externa quais as empresas poderão utilizar o benefício, o que sugere um texto subjetivo e pouco aplicável em curto prazo.

Assim, o benefício para empresas comprometidas com a pauta ambiental e social que poderia levar à ampliação de alíquota em 20% restringiu-se à tramitação simplificada, prioritária e baseada em dados autodeclarados, o que pode reduzir em grande medida o interesse das empresas na manutenção dos compromissos ambientais e sociais. O que poderia ser um incentivo às boas práticas nas temáticas soou apenas como uma estrelinha dourada de premiação.


[1] Dados considerando os setores de transporte/logística, energia elétrica, telecomunicações e saneamento. Não foram considerados dos dados para o setor de petróleo e gás.

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