Minúcias da lei

TSE avalia se incorporação partidária tira direito de parlamentar trocar de legenda

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31 de agosto de 2023, 15h48

O Tribunal Superior Eleitoral começou a decidir nesta quinta-feira (31/8) se um parlamentar eleito por um partido que não alcança as cláusulas de barreira nas eleições mantém o direito de trocar de legenda, mesmo na hipótese de ela se incorporar a outra.

Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Constituição dá aos parlamentares o direito de trocar de partido quando suas legendas não alcançarem as cláusulas de barreira
Cleia Viana/Câmara dos Deputados

O julgamento se dá em uma ação ajuizada pelo Solidariedade com o objetivo de manter para si o mandato do deputado federal por São Paulo Marcelo Lima, que se desligou da legenda e se filiou ao PSB por entender que estava autorizado constitucionalmente.

Relator da matéria, o ministro André Ramos Tavares votou pela perda do mandato do deputado federal. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Floriano de Azevedo Marques.

Em teoria, Marcelo Lima poderia trocar de partido sem perder o mandato porque, nas eleições de 2022, o Solidariedade não superou as cláusulas de barreira, previstas na Emenda Constitucional 97/2017.

Sem elas, a legenda perdeu o direito a verbas do Fundo Eleitoral e tempo de propaganda eleitoral gratuita. Isso deu aos seus parlamentares o direito de migração partidária, conforme previsto no artigo 17, parágrafo 5º, da Constituição Federal.

A partir daí, o Solidariedade seguiu o roteiro que a EC 97/2017 buscou incentivar: negociou uma incorporação com outro partido pequeno, de modo que os votos obtidos por ambos, somados, fossem suficientes para ultrapassar as cláusulas de barreira.

Assim, em 14 de fevereiro deste ano o TSE autorizou a incorporação do Partido Republicano da Ordem Social (Pros) pelo Solidariedade. A dúvida que ficou é se esse marco temporal impediria um parlamentar dessas legendas de trocá-las por outras, como autoriza a Constituição Federal.

Alejandro Zambrana/Secom/TSE
Ministro André Ramos Tavares votou por decretar a perda do mandato do deputado
Alejandro Zambrana/Secom/TSE

O ministro André Ramos Tavares propôs uma interpretação segundo a qual o direito de migração deixou de existir no momento em que o partido, devido à incorporação do Pros, superou as cláusulas de barreira.

Ou seja, com a incorporação, a situação dos parlamentares do Solidariedade deixou de se enquadrar na regra do artigo 17, parágrafo 5º, da Constituição. No caso concreto, essa interpretação leva à perda do cargo de deputado federal por Marcelo Lima.

Para deixar o partido, ele teria de informar seu desligamento por escrito ao órgão de direção municipal e ao juízo eleitoral da zona em que está inscrito, conforme exige o artigo 24 da Resolução 23.596/2019 do TSE. O vínculo é extinto apenas dois dias depois.

Marcelo Lima comunicou ao Solidariedade sua decisão de desfiliação em 14 de fevereiro, mesmo dia da incorporação do Pros, mas ele só enviou a notificação ao juiz eleitoral no dia seguinte. Assim, ainda estava ligado à legenda quando ela ultrapassou as cláusulas de barreira.

Interpretação restritiva
Na visão do ministro André Ramos Tavares, essa é a interpretação que se extrai do vocábulo escolhido pelo constituinte derivado ao editar a EC 97/2017.

O texto do artigo 17, parágrafo 5º, passou a dizer que ao eleito por partido "que não preencher" os requisitos das cláusulas de barreira é assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro partido que as tenha atingido.

A escolha do verbo "preencher" no modo infinitivo, de acordo com o magistrado, indica que as condições para trocar de partido sem perder o mandato devem ser preenchidas no momento presente da desfiliação.

Se o objetivo fosse assegurar a possibilidade de migração partidária independentemente de desdobramentos futuros, a redação entregue teria se reportado ao passado, na forma do termo "não preencheu".

A interpretação adotada, diante de uma hipótese constitucional de exceção, é restritiva. O relator destacou os efeitos nocivos da liberdade ampla de migração eleitoral, que reduzem a importância dos programas partidários e gera instabilidade das agendas políticas levadas a efeito com base na força das legendas.

Se o objetivo da EC 97/2017 foi reduzir a excessiva fragmentação partidária, afirmou o ministro André Ramos Tavares, o cenário que permite a migração dos parlamentares é superado quando próprio partido faz um movimento no sentido de se unir a outros para superar as cláusulas de barreira.

AJDesCargEle 0600118-15.2023.6.00.0000

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