Opinião

LGPD, LAI, Lei de Arquivos e o desafio da transparência do processo eleitoral

Autores

  • José D'Amico Bauab

    é bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo) mestre em Direito Civil pela USP membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo membro do Conselho de Orientação Artística da Rede de Museus-Casas Literários de São Paulo da Secretaria de Estado da Cultura gestor responsável pelo Centro de Memória Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo com certificação no 1º Núcleo de História e Memória da Escola Paulista de Magistratura.

  • Cintia Takiguthi

    é bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo) gestora responsável pela Seção de Gestão de Documentos Eletrônicos do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo com certificação no Programa Formativo "Patrimônio Memória e Gestão Cultural" da Casa Mário de Andrade e no 1º Núcleo de História e Memória da Escola Paulista de Magistratura.

21 de setembro de 2022, 10h02

A democracia tem como um de seus pressupostos essenciais o binômio informação-transparência, e o acesso à documentação que compõe o processo eleitoral é indispensável para dar efetividade ao controle que cabe à sociedade fazer, não só para melhorar o nível de ética e de eficiência na escolha, pelo voto, dos agentes políticos que disputam cargos no Poder Executivo e no Poder Legislativo, mas também, e principalmente, para afastar aqueles que não são dignos de exercer funções públicas eletivas. Por outro lado, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), um inegável avanço no campo das garantias e direitos fundamentais, tem sido muitas vezes usada para limitar ou impedir aquele acesso.

Reprodução
Reprodução

Este artigo tem como objetivo analisar, de maneira sistemática e equânime, a citada lei com a Lei de Acesso à Informação (LAI) e a Lei de Arquivos, e propor um caminho razoável para preservar a transparência do processo eleitoral como condição inafastável de aperfeiçoamento do regime democrático brasileiro. Afinal, a partir do momento em que, pelas vias formais, uma pessoa, no pleno gozo de seus direitos políticos, resolve submeter-se ao escrutínio popular para ocupar um cargo público, passa a assumir o papel de figura pública, o que autoriza que, sobre ela, incida um legítimo controle social, muitas vezes concretizado pela ação dos órgãos de imprensa e pressupondo o acesso aos dados pessoais do candidato ao posto eletivo. Antes, a mera filiação partidária já configura uma atividade pública e, como tal, deve ser exposta, com o devido comedimento e aceitável justificativa (como, por exemplo, para fins de uma investigação jornalística).

Aliás, tirante as informações classificadas em ultrassecretas, secretas e reservadas (ou seja, aquelas fundamentais para a segurança da sociedade e do Estado), que exigem um regime jurídico próprio de tratamento, o acesso a informações pessoais, constantes de documentos eleitorais, para fins jornalísticos e acadêmicos, se dá sob o crivo dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, que inspiram a aplicação de todo o ordenamento jurídico e abrem as portas para a hermenêutica simultânea da LAI, da LGPD e da Lei de Arquivos.

O risco de uma colisão entre o direito à informação (e aqui se inclui o direito de consulta a arquivos públicos) e a proteção de dados pessoais não se pode resolver por um bloqueio, prévio e feito às cegas, do acesso informacional. Mutatis mutandis, seria o mesmo que aplicar a medida de censura prévia para resolver um conflito entre a publicação de uma notícia sobre alguém e a alegação de dano à honra, quando a decisão mais sensata indicaria a aquiescência à publicação, passível, se lesiva, de gerar a responsabilização civil e criminal de quem a promoveu.

Dessa forma, o ato preliminar de assinatura de um termo de responsabilidade que situa o consulente na condição jurídica de controlador, no conceito que lhe é dado pela LGPD, com todos os ônus decorrentes dessa posição, quanto ao tratamento dos dados pessoais objetos do acesso, chancela a garantia da observância sincrônica e equânime da LAI, da LGPD e da Lei de Arquivos, consagrando-se assim o direito de consulta a arquivos públicos sem se descurar do respeito aos dados pessoais.

É imperioso observar-se que o uso enviesado da lei protetiva dos dados pessoais não pode se tornar instrumento coadjuvante, ainda que involuntário, num eventual processo de degradação do regime democrático brasileiro e, para evitar-se esse perigo, o princípio da transparência do processo eleitoral há de estar sempre na perspectiva dos controladores da LGPD, no âmbito da Justiça Eleitoral.

Clique aqui para ler o artigo na íntegra

Autores

  • é bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), mestre em Direito Civil pela USP, membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, membro do Conselho de Orientação Artística da Rede de Museus-Casas Literários de São Paulo da Secretaria de Estado da Cultura, gestor responsável pelo Centro de Memória Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, com certificação no 1º Núcleo de História e Memória da Escola Paulista de Magistratura.

  • é bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), gestora responsável pela Seção de Gestão de Documentos Eletrônicos do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, com certificação no Programa Formativo "Patrimônio, Memória e Gestão Cultural" da Casa Mário de Andrade e no 1º Núcleo de História e Memória da Escola Paulista de Magistratura.

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!