Opinião

Estados podem ser obrigados a receber jogos da Copa América 2021?

Autor

  • Marcelo Válio

    é especialista em Direito Constitucional pela ESDC especialista em Direito Público pela EPD/SP mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP doutor em filosofia do Direito pela UBA (Argentina) doutor em Direito pela Fadisp pós-doutor em Direito pela Universidade de Messina (Itália) pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca (Espanha) e referência nacional na área do Direito dos Vulneráveis.

2 de junho de 2021, 20h03

Mesmo após a negativa dos países que sediariam a Copa América, mais especificamente a Argentina, por crise sanitária igual à nossa, e a Colômbia, face crise sanitária e grave tensão social, a Conmebol entrou em contato com a CBF e assessores da presidência, obtendo o "sim" para a ocorrência do torneio em terras nacionais.

Alguns devem estar se perguntando: por que são possíveis campeonatos regionais/estaduais, campeonato brasileiro, copa do Brasil e Libertadores, e não é possível a Copa América?

A resposta é simples, pois com as fronteiras abertas e sem qualquer controle na entrada de turistas no Brasil, os torcedores terão acesso livre ao país e, mesmo não assistindo aos jogos nos estádios, poderão gerar aglomerações, agravando a crise sanitária brasileira decorrente da Covid-19.

Poderão os visitantes também trazer ao Brasil novas variantes do vírus e, conforme a médica Lucia Pellanda, professora de epidemiologia e reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, este "não é o momento, quando o país enfrenta o risco de terceira onda…"

Com a determinação do excelentíssimo presidente Jair Bolsonaro à Casa Civil para priorizar os preparativos para a Copa América, confirma-se o tweet da Conmebol que agradeceu "Bolsonaro e sua equipe, bem como a Confederação Brasileira de Futebol".

Outrossim, nociva e irresponsável a alegação do presidente da Conmebol, Alejandro Domínguez, no sentido de que "o governo do Brasil demonstrou agilidade e capacidade de decisão em um momento fundamental para o futebol sul-americano. O Brasil vive um momento de estabilidade, tem infraestrutura comprovada e experiência acumulada e recente para organizar uma comprovada e experiência acumulada e recente para organizar uma competição dessa magnitude".

Não estamos estáveis na pandemia e nem a União e nem o presidente são órgãos absolutistas, não podendo obrigar os estados federados a aceitar partidas em seus territórios.

Ademais, União, estados, Distrito Federal e municípios têm competência concorrente na área da saúde pública para promover ações de mitigação dos impactos da Covid-19. Esse é o entendimento do STF.

Ou seja, conforme o STF, é responsabilidade de todos os entes da federação adotar medidas em benefício da população brasileira no que se refere à pandemia.

"O STF julgou, didaticamente, que a União tem coordenação geral, mas há determinados locais em que a pandemia se exacerbou e outros em que a pandemia esteve de passagem. Foi sob essa ótica do interesse local que o Supremo regulou essa questão de que estados e municípios também podem legislar", disse o grande jurista e ministro do STF, Luiz Fux, durante uma live promovida em 27/5/2021.

Enfim, os estados têm autonomia na aceitação ou não do torneio e poderão exigir medidas sanitárias mais severas em caso de aceitação.
Além disso, importante esclarecer que é possível a configuração de infração ao princípio do pacto federativo.

O pacto federativo, também chamado de princípio federativo, define a forma de Estado adotada pela nação. A federação é uma forma de estado na qual há mais de uma esfera de poder dentro de um mesmo território e sobre uma mesma população. As entidades integrantes da federação brasileira são a União, estados, Distrito Federal e municípios.

Não são soberanos, mas gozam de autonomia conforme a Constituição Federal. Assim, têm o poder de auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadministração. Nesse sentido, os estados não podem ser obrigados a flexibilizar ou mudar as regras internas relativas ao isolamento social e tutela sanitária em face da Copa América. Enfim, diante da decisão do STF, bem como do princípio do pacto federativo e do risco da terceira onda da Covid-19, temerária a ideia de sediar um torneio dessa magnitude. Imagine-se se o Japão cancelar a Olimpíada, onde será que tentarão sediá-la?

Autores

  • é especialista em Direito Constitucional pela ESDC, especialista em Direito Público pela EPD/SP, mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP, doutor em filosofia do Direito pela UBA (Argentina), doutor em Direito pela Fadisp, pós-doutor em Direito pela Universidade de Messina (Itália), pós-doutorando em Direito pela Universidade de Salamanca (Espanha), e é referência nacional na área do Direito dos Vulneráveis.

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!