Prospective overruling

STJ afasta modulação de "jurisprudência maléfica" em matéria penal

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25 de outubro de 2020, 10h19

Para os ministros que integram a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, não é possível falar em irretroatividade de interpretação jurisprudencial que eventualmente prejudique a situação do réu. O ordenamento jurídico proíbe apenas a retroatividade da lei penal mais gravosa, não cabendo a aplicação do chamado prospective overruling.

Emerson Leal
Tem sido recorrente pedido de modulação dos efeitos de mudança de jurisprudência do STJ, disse o ministro Reynaldo Fonseca
Emerson Leal

Essa orientação foi reforçada em julgamento na última terça-feira (20/10) na 5ª Turma. O ministro Reynaldo Soares da Fonseca destacou que tem sido recorrente pedidos de modulação dos efeitos de mudança jurisprudencial, que não podem ser acolhidos.

No caso, a defesa queria a extinção da punibilidade do réu que cumprira a pena presencial, mas ainda não havia pagado a pena de multa. O STJ aceitava essa hipótese. Em 2015, fixou tese em recurso repetitivo para entender que a alteração do artigo 51 do Código Penal, trazida pela Lei 9.268/96, passou-se a considerar a pena pecuniária como dívida de valor e, portanto, de caráter extrapenal.

Apesar da obrigatoriedade de seguir a tese, ela sempre foi contestada nas instâncias ordinárias. Em dezembro de 2018, o Supremo Tribunal Federal decidiu a matéria em controle concentrado de constitucionalidade: apontou que o Ministério Público tem legitimidade para cobrar multa em condenações penais, com a possibilidade subsidiária de cobrança pela Fazenda.

Emerson Leal
Nós jamais poderíamos modular os efeitos da jurisprudência dos outros, afirmou ministro Marcelo Navarro Ribeiro DantasEmerson Leal

A partir daí, ambas as turmas do STJ fizeram adequação para negar a extinção da punibilidade do réu que ainda não pagou a pena de multa. “Nessa linha, não há que se falar em aplicação do prospective overruling ou do artigo 23 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”, disse o ministro Reynaldo.

A 6ª Turma adotou a mesma postura recentemente, depois que o Supremo decidiu que até a decisão colegiada que confirma sentença condenatória interrompe a prescrição. As turmas criminais do STJ não demoraram a se adaptar.

Em agravo regimental, a defesa sustentou que o STF havia STF reescrito o artigo 117, IV, do Código Penal “in malam partem, é claro” e pediu que, em nome da segurança jurídica, enfrentasse “o tema da retroatividade maléfica da jurisprudência”.

“No caso concreto, não há falar em modulação de efeitos, notadamente porque apenas se verificou a consolidação de entendimento já firmado pelo Pretório Excelso, em sentido contrário ao desta Corte Superior”, afirmou o ministro Sebastião Reis Júnior, relator do recurso especial.

Lucas Pricken/STJ
Não há modulação de efeitos se apenas se verificou a consolidação de entendimento no STF, disse ministro Sebastião Reis Júnior
Lucas Pricken/STJ

Prospective overruling é a modulação temporal dos efeitos de decisões que revogam precedentes, com objetivo de manter segurança jurídica e a confiança justificada.

Já o artigo 23 da Lindb diz que a decisão judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido.

“É inviável pugnar pela modulação dos efeitos de alteração jurisprudencial. A decisão que aqui preservasse o entendimento anterior não estaria imune à tese consolidada pelo Supremo, haja vista a possibilidade de recurso para aquela corte. Estamos vinculados ao Supremo”, afirmou o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, na última terça.

“A tese de irretroatividade da jurisprudência, digamos, maléfica é uma que até me atrai”, disse o ministro Ribeiro Dantas. “Mas nós jamais poderíamos modular o efeito da jurisprudência dos outros. Como que o STJ vai modular os efeitos de uma decisão do STF, e logo em controle de constitucionalidade? Podemos modular as nossas, mas não a dos outros, e muito menos em matéria que cabe ao Supremo”, concluiu.

REsp 1.894.560
REsp 1.851.174

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