Sociedade digital

Anuário: MP-SP investe em tecnologia e inovação para aumentar a eficiência

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24 de dezembro de 2020, 12h27

*Reportagem publicada no Anuário do Ministério Público Brasil 2020, lançado no dia 14 de dezembro no canal da ConJur no YouTube. O Anuário está disponível gratuitamente na versão online e à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa

Espelho do Tribunal de Justiça de São Paulo, o maior do país, o Ministério Público de São Paulo é também a maior entidade ministerial. Supera em número de membros e em volume de processos judiciais o próprio Ministério Público Federal e praticamente dobra esses valores do segundo colocado entre os MPs estaduais. Numa instituição em que a independência de seus membros é uma das prerrogativas essenciais, essa grandeza torna um desafio a preservação da unidade.

“É como se fosse uma empresa que tem um presidente e 1.800 vice-presidentes”, exemplificou o procurador-geral de Justiça paulista, Mário Luiz Sarrubbo em evento on-line promovido pela TV ConJur. “Como construir doutrina, como unificar pensamentos respeitando a independência de cada um?”, pergunta ele e ele mesmo responde: “Temos de ter estratégia com resolutividade”. Segundo Sarrubbo, só se consegue uma estratégia com unidade de pensamento a partir de enunciados propostos e discutidos por toda coletividade do MP. 

Como exemplo, conta o caso da estratégia adotada para enfrentamento da epidemia do novo coronavírus. Um comitê foi criado um dia depois de sua posse na Procuradoria-Geral e era composto por procuradores dos diferentes setores do MP-SP, além de representantes em cada região administrativa do estado. A partir deste comitê, foram traçadas estratégias e unificadas as posições do MP para enfrentar a crise. “Colocamos no gabinete de crise médicos, cientistas e assistentes sociais para que pudéssemos atuar com parâmetros jurídicos e com embasamento científico.”

Um balanço da atuação do MP-SP na calamidade, em 20 agosto de 2020, quando o estado de São Paulo já registrava 735 mil casos de Covid-19 e 28 mil mortes pelo vírus, mostrava que já tinham sido feitos 3.415 procedimentos relativos à epidemia, desde 28 de fevereiro, dos quais 177 foram ações civis ajuizadas, 166 inquéritos civis, 594 notícias de fato, 56 inquéritos policias e 20 autos de prisão em flagrante. Em uma iniciativa de ação direta contra a epidemia, o MP-SP destinou aos fundos de saúde dos municípios e do estado os valores arrecadados com multas, acordos criminais e cíveis, termos de ajustamento de condutas. Até 20 de agosto de 2020, já tinham sido entregues R$ 75 milhões às prefeituras.

“Não podemos ter um MP analógico em uma sociedade digital”, costuma dizer o procurador-geral de Justiça de São Paulo. Por isso uma das apostas de sua gestão é o emprego intensivo de tecnologia e inovação para aumentar a eficiência do trabalho. Digitalização de processos e informatização de procedimentos, projetos de georreferenciamento da criminalidade e de alimentação de bancos de dados são algumas das propostas do MP-SP, assim como a implementação de inteligência artificial, num sistema próprio que permita a superação de dificuldades encontradas com o sistema utilizado no TJ de São Paulo, que o MP-SP também utiliza.

Foi criado o Sisap, o Sistema de Automação de Processos, que visa à diminuição de tarefas repetitivas e que deve gerar uma economia de R$ 70 milhões por ano, assim como o RH Digital, o novo Ponto Eletrônico e o e-Funcional, documento de identidade digital dos membros do Ministério Público.

Foi adotado o Sistema Eletrônico de Informações (SEI), usado para dar continuidade aos trabalhos do MP mesmo durante o período de isolamento imposto com a evolução da epidemia de Covid-19 e desenvolvido originalmente para o Tribunal Federal da 4ª Região. O programa ajuda na transição do papel para documentos digitais, o que facilita o teletrabalho e o compartilhamento de informações. Com o isolamento social forçado pela epidemia, o MP-SP acelerou no uso de videoconferências em âmbito estadual, para aumentar o alcance dos debates e a articulação entre diferentes áreas promovidos pelo órgão.

Outras novidades também incluem a implementação da computação em nuvem usando como base software da Microsoft, a aquisição de quatro mil novos computadores, instalação de mais de 800 estações de acoplamento com notebook e 4G para oferecer mobilidade às Promotorias de Justiça que solicitaram o serviço. Foram lançados o Portal da Comunicação, a intranet do MP-SP, e o Portal do Inativo, que atende aos membros aposentados do Ministério Público.

Houve também investimentos no aumento de velocidade da internet em todas as Promotorias e foi disponibilizado um programa para a conversão de áudio em texto, tecnologia que o Ministério Público credita a diminuição de horas de trabalhos gastas com transcrição de audiências.

Toda esta retaguarda de inteligência dá suporte às investigações, ações de prevenção e repressão da criminalidade desempenhadas pelo MP. Um dos principais recursos do Ministério Público em todas as esferas nos últimos anos são os grupos de atuação especial. Em São Paulo, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) tem tido atuação destacada, devendo permanecer como um dos pontos focais da atual administração, que se diz “entusiasta” do modelo atual.

O modelo está em discussão no Supremo Tribunal Federal. O ministro Alexandre de Moraes, que já foi secretário de Segurança Pública em São Paulo, defende o Gaeco em sua formatação atual e entende que ele é uma evolução aperfeiçoada das forças-tarefas. Já o ministro Ricardo Lewandowski teceu críticas à organização do Gaeco e das forças-tarefa, por ultrapassarem os limites constitucionais e extrapolar o controle dos órgãos hierárquicos, tanto do Ministério Público como das corporações policiais.

O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, entende, por sua vez, que o modelo de grupos permite que sejam designados membros que possuem o perfil adequado à atividade de combate ao crime organizado e qualquer alteração em seu formato atual seria um retrocesso.

No quadriênio 2016-2020, de acordo com relatório publicado em fevereiro de 2020, o Gaeco conduziu 497 operações que levaram à prisão de 5.311 pessoas. A maioria (2.890 pessoas) era de supostos integrantes ou colaboradores da facção criminosa conhecida como PCC. Destas, 1.802 foram denunciadas pelo MP e 792 foram condenadas pela Justiça.

A facção criminosa, originada em São Paulo, é particularmente poderosa no estado, demandando uma atuação que, de acordo com o ex-PGJ, Gianpaolo Smanio, visava sufocar o lado financeiro da organização. Foram ações focadas em recuperação de bens e em interromper atividades de lavagem de dinheiro, com a apreensão de 101 toneladas de substâncias ilícitas, 887 armas de fogo, 20.623 munições, 1.557 veículos e 4.946 máquinas caça-níqueis, além de R$ 340 milhões resultantes de sonegação fiscal e fraude.

Em maio de 2019, o Gaeco coordenou uma operação com mais de 520 agentes, incluindo 485 membros da Polícia Militar, em 20 municípios paulistas para cumprir 50 mandados de prisão e 77 de busca e apreensão contra membros do PCC. 

Na área cível, de acordo com o MP Um Retrato, o MP-SP age principalmente no combate à improbidade administrativa, nos assuntos relativos à infância e juventude e em questões sobre a preservação do meio ambiente. Combinados, os três assuntos representam mais da metade dos processos pertencentes ao ranking com os dez temas mais frequentes e cerca de 40% de todos os inquéritos civis e notícias de fato instaurados em 2019.

Em ações visando a proteção de crianças e adolescentes, o Ministério Público é responsável pela fiscalização da atuação dos conselhos tutelares, para garantir o respeito do ECA e que conselheiros não usem de suas convicções pessoais para abusar de seus poderes. Da mesma forma, tem investigado grupos em redes sociais que criam redes de adoção ilegal de crianças. Com o monitoramento, o MP tenta detectar tentativas de compra e venda de crianças camufladas pela aproximação de casais e gestantes na internet nestes grupos.

Na área ambiental, o MP atuou em 2020 para preservar áreas verdes no estado e na Capital, ameaçadas tanto por atividade criminosa quanto por desígnios do estado. Atuando junto com o MPF, o MP-SP expediu recomendações aos agentes públicos ambientais do Estado e da União com atuação em São Paulo para que se abstivessem de aplicar despacho do Ministério do Meio Ambiente com interpretação da legislação ambiental considerada prejudicial ao bioma da Mata Atlântica. Diante da reação adversa, o despacho foi revogado.

Já em 2020, o MP-SP criou o seu Cira, o Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos. O novo grupo de atuação reúne estruturas do MP, da Secretaria da Fazenda estadual e da Procuradoria-Geral do Estado para combater a sonegação, reprimir a fraude fiscal e recuperar créditos do estado. De acordo com dados do MP, a dívida ativa estadual é de R$ 330 bilhões. Metade desses recursos constitui débitos de empresas em funcionamento, ou seja, são efetivamente recuperáveis.

Em matéria de improbidade administrativa, o MP-SP apresentou denúncia à Justiça Eleitoral por crimes de falsidade ideológica eleitoral, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A promotoria acusa Geraldo Alckmin de ter recebido mais de R$ 11 milhões da construtora Odebrecht nas campanhas ao governo de São Paulo em 2010 e em 2014. A denúncia foi aceita pela Justiça Eleitoral de São Paulo.

Divulgação MP-SP
PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA
Mário Luiz Sarrubbo
Nascimento: Em 1963, em São Paulo
Formação: Bacharel em Direito pelo Mackenzie (1986); mestre pela PUC-SP (2001)
Ingresso no MP-SP: 1989
Mandato: 17/4/2020-17/4/2022

Atuava como subprocurador-geral de Políticas Criminais no MP-SP até se candidatar e ser escolhido para o cargo de procurador-geral de Justiça. Apoiado pelo antecessor, Gianpaolo Smanio, tomou posse em abril de 2020, em sessão virtual por conta do isolamento social imposto para a prevenção da propagação do coronavírus. Ficou em segundo lugar na eleição para o cargo, atrás de Antônio Carlos da Ponte, mas foi o escolhido pelo governador do estado, João Doria.

Como membro do Gaeco, promoveu a política da Tríplice Vertente no combate ao crime organizado, baseada na teoria de que o enfrentamento às organizações deve mirar nos pilares básicos do crime organizado, da lavagem de dinheiro e da corrupção de agentes públicos. Assumiu prometendo emprego de tecnologia e inovação para obter mais eficiência operacional do Ministério Público. Persegue também a modernização não apenas da instituição que comanda, mas de todo o sistema de Justiça.

“Devemos avançar cada vez mais em busca de um sistema de Justiça mais rápido. Não há maior frustração para a sociedade do que um processo que demore mais do que um ou dois anos para ser julgado”, afirmou em entrevista à ConJur, em 2020. Para isso, ele vê a necessidade de avançar nos meios alternativos de solução de conflitos e na reforma processual que determine o fim do processo em segunda instância. “Só casos excepcionalíssimos poderiam chegar ao STJ e ao STF”, diz.

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