Opinião

Sugestões para o aprimoramento jurídico do setor de iluminação pública

Autor

  • Mário Saadi

    é sócio de Direito Público e Infraestrutura do Cescon Barrieu Flesch & Barreto Advogados. É professor do mestrado profissional da FGV Direito SP. Doutor (USP/2018) mestre (PUC-SP/2014) e Bacharel (FGV-SP/2010) em Direito.

9 de fevereiro de 2024, 17h13

O setor de iluminação se notabilizou, dentre outros aspectos, em função do número de contratos de parcerias público-privadas (PPPs) já celebrados no país e, junto a isso, pelas discussões realizadas para seu aprimoramento.

Temas como constituição de garantias públicas, contabilização de gastos e impactos na receita corrente líquida, vinculação de receitas e aberturas de espaços orçamentários e formas de exploração de receitas acessórias são apenas alguns que ganharam relevância como decorrências dos projetos setoriais.

A atual experiência institucional parte daí. Mas fato é que ainda precisa caminhar. Temos entendimento consolidado sobre as formas de contratação e de exploração de receitas acessórias, bem como dos objetos passíveis de enquadramento como tal?

Haverá continuidade da desvinculação de receitas dos municípios e qual será o seu impacto na utilização da contribuição de iluminação pública?

Os municípios terão capital humano para a gestão de contratos de longo prazo? Qual será a visão dos estruturadores a respeito de novas oportunidades?

Quais serão as preocupações da iniciativa privada em projetos em curso e nos que virão? Para onde caminharão os projetos de cidades inteligentes e como se entrelaçarão com as PPPs de iluminação pública? Estas são apenas algumas questões que precisarão ser enfrentadas no curto prazo.

Banco de créditos
Ao lado delas, há discussão sobre o denominado banco de créditos, instrumento utilizado em determinados contratos de PPPs do setor de iluminação pública.

Ele tem como função delimitar as obrigações que as concessionárias precisarão atender como medidas programadas ou emergenciais, solicitadas pelos Poderes concedentes, bem como procedimentalizar como tais pedidos deverão ser realizados pelos Poderes concedentes, na prática.

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Em resumo, o banco de créditos representa saldo de solicitações à disposição dos Poderes concedentes, conforme as especificações de cada contrato de PPP, medido em créditos.

Trata-se de instrumento que visa, por hipótese, atender demandas do Poder Executivo municipal, considerando a impossibilidade de se prever como será a expansão da rede de iluminação pública e certas variações de investimentos necessários, considerando os locais concretos de implantação de cada ponto.

Os créditos não expiram, ou seja, os créditos não utilizados se acumulam, podendo ser utilizados ao longo da vida de todo o contrato.

Assim, os objetivos são trazer segurança jurídica para as concessionárias em relação às obrigações que, de um lado, poderão lhe ser impostas ao longo da execução da concessão e garantir que os pedidos de execução para instalação, operação e manutenção de determinados pontos novos de iluminação pública apenas ocorram caso os Poderes concedentes obedeçam ao procedimento de solicitação estabelecido contratualmente.

Em minha visão, o banco de créditos está amparado em determinadas disposições legais que tratam de contratos de concessão. A Lei 8.987, de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal (Lei de Concessões) [1], define determinados pontos que são essenciais em contratos de concessão.

A lei prevê, por exemplo, que são cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas, dentre outros aspectos, ao objeto, à área e ao prazo da concessão; ao modo, forma e condições de prestação do serviço; aos direitos, garantias e obrigações do poder concedente e da concessionária, inclusive os relacionados às previsíveis necessidades de futura alteração e expansão do serviço e consequente modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos equipamentos e das instalações.

Na prática, o banco de créditos busca delimitar o objeto da concessão, com a previsão de quantidades de pontos adicionais que serão executados pela concessionária, além de definir direitos e obrigações das partes, já que a concessionária deverá executar os serviços solicitados, desde que os procedimentos e os limites estabelecidos contratualmente sejam observados pelo Poder concedente.

Além disso, esse banco trata da expansão dos serviços concedidos, por meio do incremento de pontos que serão executados, operados e mantidos pela concessionária para que haja a sua prestação adequado.

Se as PPPs têm caminhado no setor de iluminação pública de maneira frutífera, o mecanismo do banco de créditos passa a ter um papel relevante. Há contratos que não o previram. Há estruturadores que o utilizam como prática corrente e há experiências nas quais ele não tem sido utilizado. Em qualquer dos cenários, há que se compreender exatamente a sua função, os limites de sua aplicação e as formas de aprimoramento sobre ele.

Estudo com sugestões sobre os bancos de créditos
Para tanto, chamo a atenção para estudo publicado recentemente pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), que trata da forma de sua utilização, de experiências setoriais relevantes e de ideais para o aprimoramento do banco de créditos.

Algumas sugestões que podem ser adotadas, ao longo das gestões contratuais ou em futuras modelagens, para aprimoramento da matéria, segundo o estudo da Abdib, incluem:

(1) necessidade de estabelecimento de rotinas de treinamentos com membros do Poder concedente e com pessoas responsáveis pela gestão contratual;

(2) planejamento das Administrações Públicas na realização dos pedidos realizadas para as concessionárias;

(3) maior detalhamento dos serviços que poderão ser enquadrados nos pedidos referentes ao banco de créditos;

(4) melhoria da dinâmica de expedição de ordens de serviços ao longo da execução contratual;

(5) definição de mecanismo mais fluído para execução pelas concessionárias setoriais;

(6) melhor entendimento de que preços e quantidades de banco de créditos de um projeto não funcionam como simples vaso comunicante para sua incorporação em outro projeto.

Melhorias incrementais são passíveis de adoção em todos os setores de infraestrutura. Ganham os projetos e ganha o desenvolvimento nacional, que tanto se almeja. O estudo da Abdib, aqui disponível, contribui para tanto.

 


[1] Art. 175 da CF/1988: “Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II – os direitos dos usuários; III – política tarifária; IV – a obrigação de manter serviço adequado”.

Autores

  • é doutor (USP), mestre (PUC-SP) e bacharel (FGV-SP) em Direito Sócio de Direito Público e Infraestrutura do escritório Cescon Barrieu.

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