Caiu a punição

CNJ suspende afastamento de desembargador que defendeu fim da PM

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9 de novembro de 2023, 15h45

O afastamento cautelar, antes da instauração do processo administrativo disciplinar, é medida de caráter excepcional que deve estar fundada na gravidade da conduta imputada e na possibilidade de que a continuidade do exercício da atividade jurisdicional traga prejuízo à investigação.

Rômulo Serpa/CNJ
Para corregedor, a independência funcional do magistrado “é pedra de toque do Estado Democrático de Direito”

Por verificar a ausência desses pressupostos no caso, o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, concedeu liminar para suspender o ato do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) que determinou o afastamento cautelar do desembargador Adriano Roberto Linhares Camargo. A medida foi tomada, na terça-feira (7/11), após o magistrado se manifestar a favor do fim da Polícia Militar.

Em 1º de novembro, durante sessão da corte transmitida online, o desembargador criticou os abusos cometidos em operações policiais e disse que a corporação é despreparada. “Isso não pode mais se repetir e, aliás, aqui vai uma reflexão pessoal, para mim, tem de acabar com a Polícia Militar, para mim”, declarou ele.

Camargo disse que é preciso estabelecer uma nova forma de atuar na investigação e repressão ao crime. “Vejam nos jornais a quantidade de confrontos e ninguém leva um tiro. Morrem quatro, cinco, seis, e isso não é por preparo, nós sabemos por que é.”

O pedido de liminar foi apresentado pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB). A entidade sustentou que não há circunstâncias excepcionais que justifiquem a medida, por não haver risco concreto na permanência do magistrado no cargo, nem tampouco possibilidade do investigado prejudicar as investigações. Alegou também que o desembargador se manifestou dentro do contexto de um julgamento, dentro do livre convencimento do magistrado.

Ao analisar o caso, Salomão disse que, em um exame preliminar, não se verificou a presença de pressupostos que justifiquem o afastamento cautelar. “Não se pode excluir do contexto a fala do magistrado, que, no bojo do julgamento, valeu-se de sua independência funcional e teceu uma crítica a uma instituição, inserida dentro da sua prerrogativa constitucional de manifestação de seu livre convencimento motivado.”

O corregedor ressaltou que, ainda que se entenda tratar-se de uma “crítica infeliz ou temerária”, não se trata de ofensa frontal à instituição policial. “Tampouco a afirmação feita pelo Desembargador representa uma ameaça ou risco para o contínuo exercício da jurisdição, de tal modo que sua permanência no cargo e nas funções não parece prejudicar a instrução do possível procedimento disciplinar.”

Para Salomão, a independência funcional do magistrado “é pedra de toque do Estado Democrático de Direito”, assim como o livre convencimento motivado, devendo os magistrados fundamentarem as suas decisões a partir da análise do caso concreto e das provas apresentadas, obedecidos os limites constitucionais.

“Assim, não vislumbro, nesse momento, a gravidade extrema dos fatos, tampouco a ideia de que a permanência do magistrado investigado no cargo representar qualquer ameaça às investigações, impondo-se, dessa sorte, a concessão da liminar pleiteada para suspender o ato impugnado.”

O corregedor agendou audiência de mediação para 21 de novembro. Além de Camargo, o presidente do TJ-GO, desembargador Carlos Alberto França, também deve participar.

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Pedido de Providências 0007217-21.2023.2.00.0000

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