Desrespeito sistemático

STJ afeta HC para fixar precedente contra violação de garantias em reconhecimento

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28 de abril de 2023, 8h48

Responsável por uniformizar a jurisprudência, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça terá a oportunidade de formar precedente em um caso que discute a violação sistemática das garantias processuais penais relativas ao reconhecimento pessoal na apuração de crimes.

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Reconhecimento pessoal deve cumprir
o previsto no artigo 226 do CPP
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A afetação foi feita nesta quinta-feira (27/4) pela 6ª Turma, em Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro e que tem atuação do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). O réu é um homem preso desde 2020 e alvo de 62 ações por crimes em cinco cidades fluminenses.

Em nenhuma das investigações que motivaram as denúncias ele foi ouvido em sede policial. Em todas, foi reconhecido pelas vítimas em dias posteriores aos fatos, por meio de fotografias apresentadas nas delegacias, sendo essa a única diligência que o colocou como autor dos crimes.

A rotina de ser reconhecido por crimes começou em 2018, mas teve um boom entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020, quando 44 investigações foram resolvidas mediante o reconhecimento do homem. As fotos apresentadas foram retiradas de redes sociais. Não se sabe ao certo como foram parar no álbum apresentado às vítimas pela polícia do Rio.

Segundo Pedro Carriello, defensor público em atuação no caso no STJ, trata-se de uma ilegalidade processual sistemática praticada contra o acusado. A ideia da afetação à 3ª Seção é permitir que o STJ forneça uma posição paradigmática que oriente outros casos.

11 condenações
A jurisprudência mais recente do STJ é firme em reconhecer a ilegalidade do reconhecimento pessoal quando feito em desrespeito à norma do artigo 226 do Código de Processo Penal. A indicação é que a mera exibição de fotografias seja uma etapa do procedimento completo, o que inclui a colocação do suspeito ao lado de outras pessoas.

E, mesmo quando a norma é fielmente seguida, é preciso evitar qualquer tipo de indução. A guinada jurisprudencial da corte levou o Conselho Nacional de Justiça a criar grupo de trabalho sobre o tema, a editar resolução e a propor projeto de lei com novas regras.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro recomendou aos seus magistrados que reavaliem as decisões que decretaram prisão preventiva apenas com base no reconhecimento fotográfico, medida que, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, reduz o risco de prender inocentes e combate o racismo.

A orientação é pacífica e, em tese, seria aplicável ao caso do Rio de Janeiro. O STJ tem três Habeas Corpus impetrados em favor do homem. Relatora de um deles, a ministra Laurita Vaz defendeu que era interessante levar o caso para a 3ª Seção, para apreciação por todos os integrantes das turmas criminais.

O caso do homem processado 62 vezes chegou à Defensoria Pública por inciativa do IDDD, e 57 desses processos derivam de fatos apurados em duas delegacias de Belford Roxo (RJ). Ele já foi sentenciado 28 vezes, com 17 absolvições e 11 condenações.

Em alguns casos, as vítimas chegaram a confirmar em juízo o reconhecimento pessoal. Para a Defensoria, isso não basta porque elas agem já sugestionadas a repetir o que disseram na delegacia, de modo a não se contradizer.

HC 769.783

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