Tragédia rubro-negra

Relator vê denúncia indigente e vota por trancar ação do caso do Ninho do Urubu

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3 de maio de 2022, 20h26

A descrição de condutas abstratas a partir de irregularidades administrativas na forma como o Flamengo alojava os atletas de suas categorias de base não basta para oferecer denúncia e processar acusados de incêndio culposo qualificado.

Tomaz Silva - Agência Brasi
Dez jogadores das categorias de base do Flamengo morreram em incêndio no CT
Tomaz Silva /Agência Brasi

Com esse entendimento, o desembargador convocado Olindo Menezes, da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, votou nesta terça-feira (3/5) por trancar a ação penal contra os acusados pelas mortes causadas por incêndio no centro de treinamento do Flamengo, em fevereiro de 2019. O julgamento foi interrompido por pedido de vista da ministra Laurita Vaz.

Para Olindo Menezes, a denúncia oferecida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro e aceita pela Justiça estadual em janeiro de 2021 é "indigente", pois não atribui nenhuma ação ou omissão específica aos denunciados como causa efetiva do fogo que vitimou os jogadores.

No caso, o incêndio se espalhou pelos contêineres usados para abrigar os atletas das categorias de base. Dez deles morreram. Onze pessoas foram denunciadas, incluindo Eduardo Bandeira de Mello, que já não era presidente do clube no momento dos fatos.

Desde então, o processo na primeira instância passou por alterações substanciais, com desmembramento e até absolvição de parte dos denunciados. Isso não afetou o julgamento na 6ª Turma do STJ.

O colegiado julgou recurso ajuizado por Antonio Márcio Mongelli, que era diretor de Meios e foi denunciado por, no exercício dessa função, negligenciar os cuidados com as categorias de base. A defesa apontou que não há ação ou omissão específica que ligue Mongelli à causa do incêndio.

O desembargador convocado Olindo Menezes deu razão a essas afirmações. O voto reconhece a inépcia da denúncia e a falta de justa causa para a ação penal, com o consequente trancamento. Por entender que a situação dos outros dez denunciados é a mesma, estende a eles os efeitos do provimento do recurso em Habeas Corpus.

Denúncia indigente
Ao votar pelo trancamento da ação, o desembargador convocado Olindo Menezes explicou que a omissão só tem relevância penal quando alguém que tem o dever de agir para evitar determinado resultado permanece inerte.

Essa falta de ação deve ser identificada e descrita na cadeia de acontecimentos que levam ao fato criminoso, o que não foi feito pelo MP-RJ.

"Nenhuma ação ou omissão foi atribuída ao recorrente, limitando-se a acusação a descrever imputações abstratas a partir de apontadas irregularidades administrativas nos alojamentos, o que todavia não constitui causa objetiva para o evento", disse o desembargador Olindo Menezes.

"Mesmo porque o fato aconteceu em fevereiro de 2019 e a situação no centro de treinamentos já vinha de anos anteriores. O paciente só assumiu como diretor em novembro de 2017", continuou.

Ou seja, as irregularidades administrativas na forma como o Flamengo alojava seus atletas da base estão demonstradas. Porém, não foi feita a identificação de como as ações ou omissões dos denunciados nesse contexto levaram ao incêndio. "A denúncia afigura-se indigente na demonstração do nexo de causalidade", concluiu o magistrado.

RHC 154.359

*Texto alterado às 11h de 4/5 para correção de informação: Eduardo Bandeira de Mello já não era presidente do Flamengo no momento dos fatos

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