Opinião

A confiança na Justiça Eleitoral: uma visão endógena do sistema

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28 de julho de 2022, 9h07

Construída paulatina e pacientemente, a Justiça Eleitoral representa um ramo especializado do Poder Judiciário que recebeu, da Carta da República, a nobre missão de resguardar a higidez e a legitimidade do processo eleitoral.

Hoje, a Justiça Eleitoral merece ser depositária da confiança e da credibilidade da comunidade, por chancelar uma sistemática eleitoral genuinamente brasileira, a qual veio a realçar, como pano de fundo, os contornos que devem revolver a concretização e a formação da vontade coletiva, remarcados pela transparência e pela confiabilidade, e garantidor do livre debate de ideias políticas e da proteção das regras do jogo democrático.

Costumo dizer que a eleição traduz o embate salutar da democracia. E só ela mesma, a eleição, faz acender a chama da legitimidade popular, representando o último sopro de esperança do povo, o qual nunca poderá deixar de acreditar que os ventos que sopram para o futuro trarão dias mais coloridos e ensolarados.

De fato, a eterna luta do homem para o aperfeiçoamento do mundo em que vivemos e de suas instituições passa, necessariamente, por movimentos pendulares, onde a seiva vital da esperança, ora fenece, ora se revigora.

Nesse horizonte de sentido, o direito ao voto descortina, senão, um poder do qual nenhum cidadão deve abrir mão, sob pena de, com o abandono das urnas, se ignorar todas as histórias de lutas travadas para que, atualmente, o pleito eleitoral tenha o condão de operar a verdadeira e desejada renovação.

Sem delongas, a construção de um ambiente político que faça por merecer o respeito dos cidadãos, certamente está se renovando, em meio às contradições de um passado que ainda persiste e às vezes assume o sutil disfarce da mudança para tentar uma sobrevida.

Aos (e)leitores, desejo o entusiasmo para que se acredite em perspectivas alvissareiras na construção de uma nova nação. E este escriba deixa, aqui, uma única advertência: o momento é de engajamento, sobretudo para àqueles que sonham com dias vindouros mais otimistas e menos turbulentos.

Noutro vértice, não me faço porta-voz do Poder Judiciário, tampouco dos juízes eleitorais. Mas como magistrado, fico, por vezes, estarrecido com o conjunto de bobagens e tolices se irradia como um vírus nas redes sociais e através de ondas odiosas protagonizadas por (in)determinados movimentos ou grupos que, ao seu livre talante, questionam a validade da urna eletrônica e do processo eleitoral, sem qualquer dado técnico ou evidência concreta. Esse reprovável destempero pode se pautar em razões, outras, conhecidas ou desconhecidas, e não raras vezes impulsionado pelo viés político-ideológico ou por preferências partidárias, o que não pode ser incentivado ou tolerado.

Eu retruco: atuei como juiz eleitoral em três eleições nos últimos seis anos e jamais constatei qualquer indício, ainda que mínimo, de fragilidade no sistema de votação eletrônico. Conheci de perto os bastidores, seja do procedimento que antecede o pleito, seja das providências que ultimam-no; fui apresentado a todos os programas, acompanhei a cautelosa seleção e a capacitação de servidores, mesários e demais colaboradores, o planejamento de distribuição e funcionamento das urnas eletrônicas — assim como as recomendações para os raríssimos casos nos quais problemas são identificados —, a escolha dos locais de votação, o trajeto de transporte e de coleta dos dispositivos e, alfim, as apurações. O sistema é consistente. É bastante confiável!

E vou além: essa vivência me faz assegurar que se trata de um mecanismo extremamente seguro e capaz de desvelar, de fato e de direito, o autêntico desejo oriundo da democracia. Defender o contrário anuncia, a bem da verdade, um ambiente dúbio de desconhecimento e de intenção vil ou despropositada.

Em outras palavras: não podemos ser tolerantes com quem pretende sabotar o regime democrático na crença -agora nem tão ingênua assim- de que, mais dia, menos dia, a barbárie pode vencer a civilização. Chega de leviandade e insensatez. Esses ataques deliberados ao sistema eleitoral sugerem uma vã tentativa de forjar a justificativa antecipada para o caso de revés nas eleições que se avizinham.

O meu receio é testemunhar, uma vez mais e desta vez no Brasil, o que fora vaticinado por Steven Levisky e Daniel Ziblatt, no livro "Como As Democracias Morrem". E o prenúncio de como elas morrem é esse: aos poucos. À mingua.

Não bastassem os desafios que lhe são próprios, a Justiça, em geral, vem enfrentando violentos ventos de través. Mas com as manobras certas, e uma determinação sem igual, finalizo esses singelos escritos convencido de que terminaremos bem a singradura.

Em arremate, devo dizer: A justiça eleitoral sem a democracia é como uma máquina robotizada, pois despida de espírito. Somente a democracia faz brotar e germinar as mais belas e virtuosas flores oriundas da soberania popular, a qual encontra, como sua guardiã e derradeiro escudo, ela mesma, a própria justiça eleitoral.

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