Insegurança jurídica

Partidos questionam decisão do TSE que afrontou resolução do próprio tribunal

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16 de novembro de 2020, 9h42

O Tribunal Superior Eleitoral violou os preceitos fundamentais da segurança jurídica e da anterioridade eleitoral ao decidir em desacordo com resolução editada pela própria Corte com relação ao aproveitamento dos votos de candidato cassado.

Roberto Jayme/TSE
Com esse fundamento, o Democratas (DEM) e o PSDB questionaram no Supremo Tribunal Federal uma decisão da Corte eleitoral proferida em outubro. A arguição de descumprimento de preceito fundamental já foi distribuída ao ministro Nunes Marques.

Conforme a ConJur tinha noticiado, o TSE decidiu não mais aplicar a regra disposta na resolução que ele próprio editou para decidir como a nulidade dos votos obtidos por candidato que tem registro cassado seria tratada para todos que concorressem nas eleições de 2018.

Segundo o inciso IV do artigo 219 da Resolução 23.554/2017, esses votos só são totalmente nulos se a decisão condenatória foi publicada antes das eleições. Assim, se o candidato é cassado depois do pleito, a votação pode ser aproveitada pelo partido ou coligação, preservando o quociente eleitoral.

No entanto, o entendimento mudou em uma decisão com placar apertado, de 4 votos a 3. A decisão de derrubar a própria resolução foi tomada após a corte cassar o deputado estadual Targino Machado (DEM-BA) por abuso de poder econômico. Pela resolução das Eleições de 2018, seus votos ficariam para o partido, que manteria o quociente eleitoral.

Os ministros, no entanto, decidiram que os votos deveriam ser anulados. O relator, ministro Sérgio Banhos, argumentou que a aplicação dos princípios da segurança jurídica e da confiança demanda a existência de justa e legítima expectativa do jurisdicionado fundado na boa-fé recíproca, o que não ocorre no contexto de prática de graves ilícitos eleitorais que afetam a legitimidade do voto.

Todos os três ministros que ficaram vencidos, Luís Roberto Barroso, Luiz Edson Fachin e Tarcísio Vieira, alertaram para a violação da segurança jurídica que representaria a superação da própria normativa pelo tribunal, justamente o que os partidos alegam agora na ADPF.

Questionamento
Para o DEM e o PSDB, o STF precisa decidir sobre a questão para evitar a insegurança jurídica. Ao julgar em desacordo com a própria resolução e em decisão com efeitos imediatos, o TSE afrontou o princípio da anterioridade eleitoral, por promover alteração em processo eleitoral já encerrado.

Os partidos citam precedente do próprio STF, que, no julgamento do RE 637.485/RJ, consignou que a Constituição Federal, implicitamente, teve a intenção de resguardar o processo eleitoral também das alterações abruptas de jurisprudência do TSE, e não só das mudanças de legislação. Assim, uma vez que a Constituição prevê que uma nova lei eleitoral só passe a vigorar a partir de sua publicação, da mesma forma uma decisão do TSE não pode alterar resultado de eleição passada.

"A aplicação instantânea desse entendimento representa a inserção de fator surpresa nas eleições, maculando, por consequência, não apenas a segurança do processo eleitoral, como também a participação igualitária entre os diversos partidos políticos e candidatos", alegam na inicial, assinada por Fabricio Medeiros, Ricardo Martins, Celso de Barros Correia Neto e Gustavo Kanffer, do Medeiros & Barros Correia Advogados.

Além disso, o TSE também teria violado os princípios de segurança jurídica e isonomia, de acordo com a peça, uma vez que o próprio TSE, bem como Tribunais Regionais Eleitorais, vinham aplicando a Resolução 23.554 para outros julgados referentes às eleições de 2018.

Os partidos lembraram uma decisão anterior do próprio TSE, também noticiada pela ConJur, em que, para não superar a resolução, os ministros optaram pela solução processual de não conhecer do recurso.

Por isso, as legendas pediram que seja concedida cautelar suspendendo os efeitos da decisão até o julgamento de mérito no Supremo, justificando a urgência pelo fato de que o acórdão, apesar de ainda não publicado, já foi executado pela Assembleia Legislativa da Bahia, e o risco de dano é inegável se a situação atual for mantida.

No mérito, solicitaram que seja declarada a "inconstitucionalidade da aplicação, nas Eleições de 2018, do entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral no RO-EI nº 0603900-65.2018.6.05.0000".

Clique aqui para ler a inicial
ADPF 761

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