Especial do Porta dos Fundos constitui mera crítica por sátira, diz 2ª Turma do STF
3 de novembro de 2020, 18h43
"Retirar de circulação material apenas porque seu conteúdo desagrada parcela da população, ainda que majoritária, não encontra fundamento em uma sociedade democrática e pluralista como a brasileira."
Com esse entendimento, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal manteve no ar a veiculação do especial de Natal do Porta dos Fundos, exibido na Netflix numa produção que faz sátira da história de Jesus Cristo.
A veiculação havia sido suspensa pelo desembargador Benedicto Abicair, do TJ-RJ. Contra a decisão, a Netflix ajuizou reclamação no Supremo. No final de 2019, o então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, deu uma decisão liminar para manter a exibição. "A lei brasileira estabelece a liberdade de expressão", defendeu o ministro.
O julgamento nesta terça-feira (3/11) foi unânime. Os ministros concordaram com o relator, ministro Gilmar Mendes, para quem o filme "não incita violência contra grupos religiosos, mas constitui mera crítica realizada por meio de sátira, elementos caros ao cristianismo".
"Por mais questionável que possa vir a ser a qualidade desta produção artística, não identifico em seu conteúdo fundamento que justifique qualquer tipo de ingerência estatal", afirmou o ministro.
O relator ponderou que se trata de um caso sensível, mas afastou a alegação de que houve ofensa à honra e à dignidade dos católicos brasileiros. A censura, disse, "com a definição de qual conteúdo pode ou não ser divulgado deve se dar em situações excepcionais, para que seja evitada inclusive a ocorrência de verdadeira imposição de determinada visão de mundo".
O ministro afirmou que não é possível promover certa patrulha artística, em referência à outro processo em que a corte proibiu censura na Bienal do Livro do Rio. Gilmar defendeu que o livre debate de ideias deve ser assegurado na medida do possível, "permitindo-se que cada indivíduo forme suas próprias convicções a partir de informações que escolha obter".
Considerou ainda que, no caso, trata-se de conteúdo veiculado em plataforma de transmissão particular, com acesso voluntário e controlado pelo próprio usuário, sendo possível não só optar por não assistir, como também cancelar a assinatura.
Atuou na defesa do Porta dos Fundos o professor da Universidade do Estado do RJ Gustavo Binenbojm.
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Rcl 38.782
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