Freio na atuação

"Presidente do STF pode muito, mas não tudo", diz Fux sobre cassar decisões

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23 de dezembro de 2020, 18h22

Presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux decidiu não cassar a decisão do ministro Nunes Marques que suspendeu trecho da Lei da Ficha Limpa que permite inelegibilidade indeterminada.

Contra a decisão de Nunes Marques, a Procuradoria-Geral da República entrou nesta segunda-feira com recurso, alegando que a liminar criou dois regimes jurídicos diferentes em uma mesma eleição. Hoje, porém, Fux defendeu que o ministro agiu dentro da sua independência.

Reprodução/TV Justiça
Fux deu entrevista à TV Justiça e abordou balanço e definição de pilares da sua gestão à frente do STF
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Em entrevista à TV Justiça nesta quarta-feira (23/12), o presidente do STF explicou que, como Nunes Marques proferiu liminar, apenas ele pode julgar o recurso. "Eu não poderia cassar a decisão dele porque tem recursos que entraram e o recurso é dirigido ao relator", afirmou. Conforme o andamento processual da ação no STF, Fux já determinou o encaminhamento dos autos para o gabinete de Nunes Marques.

A fala de Fux é uma resposta (aguardada) sobre o fato de que quatro ministros informaram que não vão folgar no recesso judiciário. Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes vão continuar despachando durante o plantão. Na prática, isso esvazia um pouco os poderes do presidente, que seria o responsável pela análise dos casos urgentes na ausência dos relatores originais dos processos, em revezamento com a vice-presidente, Rosa Weber.

"As pessoas às vezes imaginam que o presidente do STF pode tudo. Não pode tudo. Pode muito, mas não pode tudo. E ele pode muito só no momento que está sozinho, como agora que estou no recesso", afirmou.

Vacina e ética
Conforme reportagem do Estadão, a Corte pediu à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) a reserva de sete mil doses da vacina contra a Covid-19 para ministros e servidores. O ofício do STF foi enviado no dia 30 de novembro.

O ministro defendeu a garantia da imunização no tribunal, dizendo ser importante para a continuidade dos trabalhos. A fundação recusou o pedido.

"Nós também temos de nos preocupar para não pararmos as instituições fundamentais do Estado. Nem o Executivo, nem o Legislativo, nem o Judiciário, normalmente integrado por homens e mulheres que já têm uma certa maturidade."

Corrupção e "lava jato"
Fux se considera um brasileiro que ama o seu país e caracteriza a corrupção como um "genocídio camuflado". Para ele, "corruptores e corruptos nunca tiveram em mente que afetam não só a maximização da renda deles, através da corrupção. A corrupção rouba a saúde, saneamento, hospitais e alimentos. É inaceitável".

De acordo com o ministro, o STF "deu um belo exemplo no mensalão" — no julgamento da ação penal 470. "Não podemos ter retrocesso nesse particular. A verdade é que corrupção afasta o Brasil do mundo."

Questionado sobre o que o Judiciário pode fazer para ajudar no combate à corrupção, defendeu, na seguinte ordem: leis rigorosas, jurisprudência íntegra, coerente e estável, e imprensa livre e investigativa. "As pessoas não querem ter execração pública. Mas se elas não querem ser execradas publicamente, que não façam", afirmou.

Arena certa
Preocupado com a "vocação constitucional do STF", Fux voltou a dizer que a Corte é sacrificada por questões que poderiam ser resolvidas em outras arenas. "O Supremo Tribunal Federal sofre de uma doença, que é a epidemia de uso promíscuo da Corte Constitucional", criticou.

Para ele, não compete à Corte julgar aposentadoria de funcionário ou procedimentos disciplinares administrativos de servidores e magistrados. "Há atos que poderiam perfeitamente tramitar pela Justiça Federal", sugeriu. 

O presidente do STF fez a ressalva de que alguns processos em particular exigem a atuação da Corte, como foi o da prisão após segunda instância e o da união homoafetiva, nos quais foram fixadas teses. 

Essa não é a primeira vez que Fux aborda o choque nas pautas. Em novembro, ele já havia dito ser favorável a um controle prévio de constitucionalidade, mas ponderou que o Congresso não vai abrir mão do seu órgão de expertise, que é a Comissão de Constituição e Justiça. Também criticou que o Legislativo leve temas ao Judiciário para evitar pagar o "preço social".

Pilares 
Direitos humanos, meio ambiente, e segurança jurídica serão prioridades do Poder Judiciário para 2021, segundo Fux. "É nos direitos humanos que o juiz consegue fazer uma justiça caridosa, uma caridade justa."

Em sua análise, o que colaborou para que o coronavírus se espalhasse, virando uma epidemia, foi a falta de condições básicas. "O trabalhador brasileiro vive no limite da sobrevivência biológica. As pessoas não têm água potável para beber. Isso tudo é cuidar do meio ambiente", disse.

Celeridade e previsibilidade
O ministro também garantiu que outro pilar de sua gestão será focar na tecnologia para dar celeridade aos processos. Fux também continuou o discurso de seu antecessor, Dias Toffoli, de reforçar a importância de  segurança jurídica para atrair investidores. "Ninguém quer investir num país que, de repente, muda tudo. Ninguém vive sem previsibilidade", disse Fux.

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