Justiça Tributária

Repartição policial que dá lucro não deve ser esquecida

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

30 de julho de 2012, 8h00

Spacca
Caricatura: Raul Haidar - Colunista [Spacca]Quando falamos em Justiça Tributária, claro está que o objetivo é fazer com que os tributos sejam aceitos pela sociedade como um preço razoável dos serviços e o pagamento justo pela manutenção do Estado, cujo maior objetivo é sempre o bem comum da sociedade.

Mas quando o poder público não reconhece os esforços de seus servidores, pagando-lhes salário abaixo do que vale seu trabalho e, pior ainda, obrigando-os a trabalhar em espaço inadequado e insalubre, verifica-se que tal iniquidade prejudica a qualidade do serviço e causa transtornos a todos.

Em artigos aqui publicados em 22 de junho de 2005 e 9 de novembro de 2006, registramos a situação vergonhosa em que funcionava a Divisão de Investigações sobre Crimes contra a Fazenda, onde atuam as delegacias chamadas fazendárias, às quais incumbe a investigação de crimes de sonegação fiscal.

Naquela época, tornamos públicas as condições precárias do prédio da Avenida Indianópolis, 3.303, onde servidores trabalhavam num porão antes destinado a garagem, sujeitos até ao contato diário com respingos de esgotos danificados.

Acabou sendo feita uma reforma no prédio, acrescentando-se-lhe uma escada externa, remanejando-se algumas salas ou divisórias, com o que já não havia cartório no porão.

Embora tenha melhorado um pouco, a tal reforma não passou de um remendo. Deu um certo alívio durante um ou dois anos, mas agora se vê que não se resolveu o problema, que apenas foi adiado e se tornou mais grave. O porão já é novamente usado, para desconforto e risco à saúde de várias pessoas.

As salas dos escrivães não possuem espaço suficiente sequer para a guarda dos inquéritos. O desconforto e a falta de segurança de antes, continuam. Recentemente acompanhei uma empresária que prestou depoimento. Só havia espaço para uma cadeira, onde ela sentou-se. Foi necessária a gentileza do escrivão que pediu emprestada uma cadeira em outra sala para que o advogado pudesse sentar-se.

E não é só: as salas são exíguas e feitas com divisórias sem qualquer isolamento acústico. Numa repartição onde se cuida de supostos casos de sonegação, todos os assuntos são sigilosos. Mas não existe ali a menor possibilidade de sigilo. Todas as pessoas que passem pelo corredor ouvem o que desejarem.

Embora tenham sido feitas escadas externas em estrutura metálica, não há qualquer dispositivo de acessibilidade a pessoas com necessidades especiais. O prédio tem três pavimentos e se algum cadeirante aparecer lá para depor nos pavimentos superiores terá que ser carregado.

Os nossos governantes muitas vezes invocam a falta de recursos para não realizar o que o povo pede. Mas, no caso, a situação é particularmente injusta, pois as delegacias que lá funcionam são, até onde sei, as únicas do país que dão lucros.

Graças à atuação dessa repartição, no ano passado foram arrecadados mais de R$ 1 bilhão somente em uma das três delegacias. Calcula-se que cerca de R$ 3 bilhões foram arrecadados no ano passado pelas três delegacias daquela divisão.

Muitos contribuintes resolvem pagar os valores lançados pelo fisco depois de iniciado o inquérito policial. Ou seja: a atuação direta dessa divisão provoca a arrecadação de tributos e multas.

Vemos, portanto, que a Secretaria da Segurança Pública não dá a essa divisão a atenção devida. Claro que há muito serviço a fazer. A segurança é uma prioridade, o combate ao crime é permanente, etc. Mas isso depende de recursos. E se uma determinada divisão da SSP desenvolve serviços que trazem recursos, ela merece atenção especial.

Para que essa repartição possa trabalhar de forma a cumprir sem transtornos seu trabalho, precisa de prédio próprio e tal edifício deve se localizar de preferência na região central, próximo ao metrô. Onde está, não existem sequer locais com serviços essenciais como cópias, reconhecimento de firmas, estacionamentos etc.

Nós advogados não desejamos apenas o nosso conforto, mas também o respeito aos nossos clientes e também que os servidores públicos tenham o ambiente de trabalho que merecem. Um escrivão que trabalha numa salinha apertada, repleta de inquéritos amontoados, dificilmente vive de bom humor. E tem até dificuldade para encontrar autos quando o advogado deles queira ter vistas.

Estamos encaminhando hoje representação à OAB-SP para que a nossa entidade abrace esta causa que é muito justa. Vamos acompanhar o assunto com atenção. Remendos não resolvem mais. O volume de trabalho está crescendo, o que justifica uma solução definitiva para serviço tão importante.

Autores

  • é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!