Opinião

Como foram os julgamentos da Tusd/Tust e do Sistema S no STJ

Autor

  • Bruno Borges

    é advogado da Locatelli Advogados formado em Direito pós-graduado em Direitos Humanos pela Universidade do Minho (Portugal) e Direito Constitucional pela PUC-SP e especialista na área educacional e desenvolvimento de novos negócios e parcerias jurídicas.

28 de março de 2024, 12h22

O Superior Tribunal de Justiça decidiu no último dia 13 de março que as tarifas de transmissão e distribuição de energia elétrica (Tust e Tusd) integram a base de cálculo do ICMS. No mesmo dia, também afastou o teto de 20 salários-mínimos para a base de cálculo das contribuições parafiscais voltadas ao custeio do Sistema S (Sebrae, Sesi, Senai, Sesc, Senac e tantas outras).

Em um único dia, duas importantes decisões de temas que contavam com precedentes favoráveis do próprio tribunal foram julgadas desfavoráveis aos contribuintes, mas com modulação de efeitos. A modulação, de forma geral, beneficia determinados contribuintes que se guiaram pelo entendimento anteriormente favorável do tribunal sobre os temas.

Com relação ao Sistema S, a decisão representou uma verdadeira reviravolta jurisprudencial, tendo em vista que, apesar do STJ ter apenas dois precedentes colegiados sobre o tema, passou 13 anos decidindo monocraticamente que as contribuições parafiscais se submetiam ao limite de 20 salários-mínimos.

Justamente por isso, mesmo diante de uma decisão contrária aos contribuintes, o tribunal modulou os efeitos para beneficiar as empresas que ingressaram com ação judicial e/ou protocolaram pedidos administrativos até 25 de outubro de 2023, quando a 1ª Seção iniciou o julgamento do caso. Isso, desde que, tais contribuintes tenham obtido pronunciamento judicial ou administrativo favorável para restringir a base de cálculo das contribuições.

Cabe destacar que a limitação aos 20 salários poderá ser mantida por estas empresas apenas até a publicação do acórdão com a nova tese. A partir daí, o limite da base de cálculo deixará de valer para todos.

Já no julgamento do Tusd e Tust, o tribunal decidiu modular os efeitos da decisão, estabelecendo como marco o julgamento, pela 1ª Turma do STJ, do REsp 1.163.020, que se deu no dia 27 de março de 2017, uma vez que, até aquele momento, a orientação das Turmas de Direito Público do STJ era favorável aos contribuintes.

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Dessa forma, o STJ fixou que, em relação às ações ajuizadas até o dia 27 de março de 2017, estão mantidos os efeitos de decisões liminares que tenham beneficiado os consumidores de energia, para que, independentemente de depósito judicial, recolham o ICMS sem a inclusão da Tusd e da Tust na base de cálculo. Do mesmo modo que na modulação aplicada ao Sistema S, tais contribuintes deverão passar a incluir as tarifas na base de cálculo do ICMS a partir da data da publicação do acórdão.

Impactos e lições

Ambas as decisões promoverão impactos econômicos muito negativos para um grande número de empresas que não foram abarcadas pelas modulações impostas. Fato que acarretará débitos a estas empresas.

Neste sentido, é muito importante que as empresas analisem sua situação econômica avaliando as possibilidades de enquadramento nas transações tributárias. A transação tributária é sem dúvida uma estratégia que pode ser aplicada para algumas empresas dentro deste contexto para a recuperação da saúde financeira da empresa e a continuidade de seus negócios.

O cenário pós-julgamento fez surgir algumas importantes lições tributárias. A primeira delas reforça o que já reiteramos por diversas vezes. É imprescindível o posicionamento estratégico em temas tributários que possuam materialidade para a operação da empresa. Isso independente dos precedentes, das pautas de julgamento ou mesmo da força dos argumentos jurídicos.

A cada dia fica mais claro que o risco de modulação de efeitos aumenta para quem demora a se posicionar e que a janela de oportunidades para posicionamento judicial em temas tributários está menor.

O jogo tributário está demandando proatividade e resposta rápida diante de qualquer possível ilegalidade e inconstitucionalidade detectada no sistema tributário. A demora nestes casos pode fazer com que as empresas percam a preciosa oportunidade de obtenção de créditos tributários. Créditos fundamentais à competitividade, concorrência e manutenção saudável dos negócios, num ambiente de margens de lucro cada vez mais apertadas.

Outro ponto importante é que em ambas as decisões a modulação de efeitos foi aplicada mesmo diante de decisões desfavoráveis aos contribuintes.  Isso nos chama a atenção para o fato de que podem ocorrer vantagens econômicas expressivas mesmo em teses julgadas favoráveis aos fisco.

Por fim, a partir de agora, temos também que ficar alertas aos cortes temporais que poderão ser utilizados como critérios na aplicação da modulação de efeitos pelos tribunais superiores.

No caso do julgamento do Tusd e do Tust, o corte temporal utilizou-se da data de publicação do acórdão do julgamento que passou a atribuir entendimento desfavorável aos contribuintes. De agora em diante, toda vez que tivermos um acórdão desfavorável, um sinal se acenderá para um possível corte temporal da modulação.

Como vimos, realmente a grande motivação das decisões parece ter sido o impacto econômico que tais teses poderiam promover, caso fossem julgadas de forma favorável aos contribuintes ou até mesmo impactando no modelo de modulação de efeitos.

Mesmo os fundamentos jurídicos sendo extremamente sólidos, os fatores econômicos têm ocupado lugar de destaque na balança da justiça, mas igualmente têm relativizado, de forma preocupante, a segurança jurídica, pilar de todo e qualquer ordenamento jurídico.

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