Opinião

Julgamento do ICMS do Tusd e Tust: velho argumento da 'bomba fiscal'

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5 de março de 2024, 7h00

No último dia 22 de fevereiro, teve início um importante julgamento tributário do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que uniformizará seu entendimento sobre a cobrança de ICMS sobre tarifas cobradas juntamente com a conta de luz para remunerar não a energia elétrica em si, mas sim o uso da estrutura de transmissão e distribuição (Tust e Tusd), que faz essa energia chegar aos lares e empresas.

O julgamento foi sobrestado após as sustentações orais das partes e terceiros interessados (“amicus curiae”) e deverá ser retomado no próximo dia 13 de março.

Alguns veículos de imprensa trataram a questão como “bomba fiscal” que pode estourar no colo dos estados caso o STJ decida a questão a favor dos contribuintes.

O argumento é conhecido e enfoca as perdas de arrecadação para estados que, em sua maioria, já estão com suas finanças em apuros, com sucessivos déficits fiscais.

Esse tipo de argumento, contudo, representa uma verdadeira chantagem para o Poder Judiciário, apelando para as finanças públicas em detrimento do que realmente está em jogo, que é a legalidade do tributo.

Contexto e possíveis benefícios
No caso do Tust/Tusd, a discussão se arrasta no Judiciário há mais de dez anos e a jurisprudência era amplamente favorável ao contribuinte até 2017, quando houve o primeiro precedente relevante pró-fisco, instaurando a divergência a ser solucionada pela 1ª Seção do STJ.

Além disso, a cobrança do ICMS sobre Tusd chegou a ser retirada do ordenamento pela Lei Complementar 194/2022, mas os estados conseguiram reverter a medida com uma decisão liminar no STF.

A questão é, portanto, bem antiga e conhecida e, caso haja uma vitória dos contribuintes, não se pode dizer que os estados foram pegos de surpresa.

Além disso, se raciocinarmos só em termos de finanças, a tese do apocalipse fiscal para os estados pode ser contraposta com os benefícios que uma vitória dos contribuintes pode trazer para o setor privado, que tirará de suas costas um encargo que encarece a energia elétrica, insumo essencial a todos.

arturnichiporenko/freepik

Às vésperas de julgamentos tributários relevantes, os procuradores fazendários sempre apresentam estudos sobre as perdas arrecadatórias de uma decisão favorável aos contribuintes, mas essa mesma decisão também pode trazer um fôlego financeiro capaz de salvar empresas de falências ou aumentar sua capacidade de investimento.

Quantos empregos não foram salvos, por exemplo, com a decisão da chamada “tese do século”, que permitiu ao setor privado a recuperação de bilhões de tributos pagos indevidamente? Em última análise, o tributo indevido retorna à sociedade, fomenta a economia e aumenta a arrecadação de tributos cobrados dentro da legalidade, em um ambiente de negócios mais justo e previsível. Grande parte da perda financeira imediata pode, portanto, ser compensada com ganhos civilizatórios.

Conclusão
A régua para julgamento das chamadas teses tributárias não deve ser as perdas arrecadatórias decorrentes do afastamento de exigências que, em alguns casos, nunca poderiam ter sido implementadas, mas sim a sua adequação à Constituição e às demais leis fiscais.

O sistema tributário brasileiro é complexo e injusto, e não haverá reforma capaz de recuperá-lo se os conflitos entre fisco e contribuinte forem decididos com base em planilhas e projeções financeiras do Estado, relegando-se a um segundo plano os direitos e garantias dos cidadãos.

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