Opinião

Desvios da 'lava jato': não esquecer, para que nunca mais aconteça

Autor

  • Felipe Santa Cruz

    é advogado sócio do escritório Felipe Santa Cruz Advogados foi presidente da OAB-RJ (2013-2018) presidente nacional da OAB (2019-2021) e professor de Direito do Trabalho.

17 de fevereiro de 2024, 15h15

Nos últimos dias, assisti ao cerco de críticas, no mínimo simplistas, às decisões do ministro Dias Toffoli, do STF, para suspender o pagamento de multas (não sua anulação, deve ficar claro) estabelecidas em processos absolutamente irregulares e sob suspeita, até que todos os envolvidos tenham acesso às informações e à devida defesa. Não pude deixar de pensar em como nós, como sociedade, muitas vezes temos a memória curta.

Spacca

Veio à minha lembrança uma tarde em 2019, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que eu então presidia. Recebi o hoje ex-procurador e deputado cassado Deltan Dallagnol, que queria explicar as razões da proposta de montar uma “fundação” privada, gerida pelo Ministério Público, para gerenciar recursos recuperados pela “lava Jato”.

O pleno do Conselho Federal havia aprovado, naqueles dias, sua posição de ir ao STF para defender a ilegalidade dessa iniciativa. Recebi-o, ouvi suas explicações e deixei claro para ele que defender a Constituição era o compromisso da Ordem.

Por isso não poderia fechar os olhos ao uso privado de recursos que deveriam ser destinados à União. O ministro Alexandre de Moraes viria a decidir pela ilegalidade da tal “fundação”.

Poucos meses depois, vieram à tona os diálogos vazados entre os integrantes da força-tarefa e juízes que revelavam um esquema de completa corrupção do processo penal por aqueles que se vendiam como salvadores da pátria.

Sentenças combinadas, relação promíscua entre procuradores e juízes, cerceamento à defesa, escuta ilegal de advogados, envolvimento de entidades no vale-tudo para condenar os “inimigos”.

A essa altura, Sergio Moro já era ministro da Justiça do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro — que ele havia ajudado a eleger com a corrupção do sistema de Justiça a serviço de interesses políticos.

O que foi sendo revelado e exposto desnudou que a tal fundação seria, na verdade, um “fundo eleitoral para chamar de seu”, uma estrutura que equivalia a um partido político dentro do Ministério Público, com objetivos claros de, ao estimular ao máximo a antipolítica, dominar o poder político.

Para isso, contou com o aval de entidades muitas vezes reconhecidas por ser eloquentes na denúncia de desmandos com o dinheiro público.

É preciso não esquecer que advogados foram grampeados e seu sigilo com os clientes foi quebrado, que a defesa foi cerceada, que prisões ilegais e a delação premiada foram usadas como forma de coação de réus e testemunhas, que tudo isso foi usado para beneficiar um candidato de extrema direita.

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!