Opinião

Possibilidade de alteração do medicamento na fase de cumprimento de sentença

Autor

  • Davi Dias de Azevedo

    é assistente judiciário do Tribunal de Justiça de São Paulo graduado em Direito pela Universidade Nove de Julho (2017) pós-graduado em Direito Constitucional pela Damásio de Jesus (2021) e pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Metropolitanas Unidas (2019).

15 de abril de 2024, 19h46

Durante o curso de um tratamento médico, é comum que ocorram alterações na dosagem ou na prescrição de medicamentos. Essas mudanças são frequentemente necessárias para adaptar o tratamento às necessidades específicas do paciente e à evolução do seu quadro clínico.

No entanto, surge a questão sobre a possibilidade de alteração dos medicamentos necessários ao tratamento na fase de cumprimento de sentença, especialmente em processos judiciais que envolvem o fornecimento de medicamentos pelo Estado ou por planos de saúde.

É importante salientar que a simples substituição dos medicamentos inicialmente postulados na petição inicial por outros mais eficazes ou que se tornaram necessários ao longo do tratamento não configura uma modificação do pedido inicial.

Isso se deve ao fato de que tais alterações decorrem do próprio processo terapêutico, não resultando em qualquer ofensa ao ordenamento jurídico.

Jurisprudência

Nesse contexto, a jurisprudência brasileira, especialmente o Superior Tribunal de Justiça (STJ), tem se posicionado de forma favorável à possibilidade de substituição ou acréscimo de medicamentos durante a fase de cumprimento de sentença.

A interpretação predominante é de que a ação judicial que visa a garantir o acesso a tratamentos médicos está amparada pelo direito à saúde, assegurado pela Constituição no artigo 196.

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Em diversos julgados, o STJ tem reiterado que a alteração dos medicamentos postulados na inicial não caracteriza um novo pedido, mas sim uma medida necessária para adequar o tratamento às condições clínicas do paciente.

Por exemplo, no Recurso Especial (REsp) 1.062.960/RS, a 1ª Turma do STJ decidiu que a simples alteração de medicamentos não constitui modificação do pedido, pois a ação está fundamentada no direito à saúde previsto na Constituição.

Além disso, em casos específicos, como quando há necessidade de substituição ou acréscimo de medicamentos em decorrência da evolução do estado de saúde do paciente, a jurisprudência também tem admitido tais mudanças.

Em decisões como o Agravo de Instrumento nº 0132576-40.2012.8.26.0000, a substituição de medicamentos para melhor controle da enfermidade foi considerada legítima, desde que justificada pela prescrição médica e pela evolução do quadro clínico.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. SAÚDE. Antecipação da tutela, para obtenção de medicamentos. Substituição e acréscimo de remédios no curso do processo — Possibilidade — Relação continuativa. Aplicação do artigo 290 do CPC. Substituição e ampliação justificada, de acordo com a evolução da saúde da autora e prescrição médica. Precedentes jurisprudenciais. Decisão mantida. RECURSO DESPROVIDO.”(AI nº 0132576-40.2012.8.26.0000, Relatora: Isabel Cogan, j. 07.11.2012- v.u.).

“Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Pedido de substituição de três dos medicamentos postulados na inicial. Alteração da terapêutica na tentativa de melhor controle da enfermidade. Decisão recorrida que indeferiu o pleito. Substituição dos medicamentos para tratamento da mesma doença que não caracteriza novo pedido. Assegurados o contraditório e ampla defesa ao réu. Recurso provido.”(AI nº 2137927-52.2015.8.26.0000, Relator: Carlos Violante, 2ª Câmara de Direito Público, j. 05.08.2016);

“Constitucional/Administrativo – Ação de obrigação de fazer -Fornecimento de medicamento a hipossuficiente portador de moléstia grave – Denunciação da lide à União e ao Município de Serrana afastada, em não se verificando as hipóteses do art. 70 do CPC Súmula 29 desta Corte. Dever da Administração de fornecer o fármaco indispensável ao tratamento do mal — Inteligência dos arts. 1º, inciso III, 5º ‘caput’ e 196 da Lei Maior — Jurisprudência. Pretensão a fraldas geriátricas -Necessidade do insumo não delineada, ausente receita médica a indicá-lo – Exegese do art. 333, inciso I, da Lei Processual. Alteração do remédio depois da sentença, com vistas à continuidade do tratamento — Extensão do édito à modificação almejada — Substituição com vistas à eficácia do tratamento Possibilidade — Precedentes superiores — Não ocorrência de novo pedido. Procedência mitigada — Recursos providos em parte, com observação.”(AC nº 0002169-45.2005.8.26.0596, Relator: Ivan Sartori, 13ª Câmara de Direito Público, j. 05.10.2011)

Portanto, é possível concluir que a alteração dos medicamentos necessários ao tratamento na fase de cumprimento de sentença não configura um novo pedido, mas sim uma medida que visa garantir o acesso contínuo e eficaz à saúde, conforme preconizado pela legislação brasileira e pela jurisprudência consolidada nos tribunais superiores.

Essa flexibilidade na execução da decisão judicial é fundamental para assegurar que o paciente receba o tratamento adequado e atualizado, de acordo com as melhores práticas médicas disponíveis.

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Referências bibliográficas

REsp 1.062.960/RS, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Primeira Turma, DJe de 29.10.2008

AgRg no Ag 1.352.744/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Primeira Turma, DJe de 18.02.2011;

REsp 1.195.704/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRATURMA, DJe de 17.11.2010;

AgRg no REsp 1.222.387/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, DJe de 01.04.2011;

AgRg no REsp 1496397/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Segunda Turma, DJe 10.03.2015).

Autores

  • é assistente judiciário do Tribunal de Justiça de São Paulo, graduado em Direito pela Universidade Nove de Julho (2017), pós-graduado em Direito Constitucional pela Damásio de Jesus (2021) e pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Metropolitanas Unidas (2019).

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