Situação dramática

É preciso tornar efetivas leis sobre direitos dos presos, diz ministro do STJ

 

28 de novembro de 2023, 12h28

Não faltam leis sobre o trato carcerário e os direitos das pessoas presas, mas é preciso uma mudança de mentalidade nesse segmento. Foi o que apontou o ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça, nesta segunda-feira (27/11), durante a 24ª Conferência Nacional da Advocacia.

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Painel abordou situação das pessoas privadas de liberdade

“Já possuímos uma legislação até bem evoluída, mas falta vontade para tornarmos as medidas efetivas e fazer o controle da efetividade das garantias, por meio de políticas públicas”, pontuou o magistrado, que participou do painel “Direito e Segurança Pública”. O evento ocorre no Expominas, em Belo Horizonte.

“O poder público é responsável pela aplicação das leis que já temos, mas, para além da inoperância, ainda vemos ameaças de retrocesso no Parlamento. Os direitos de transgêneros e travestis que estão encarcerados não podem ser ameaçados pela legislatura da forma que temos assistido nas redes sociais”, acrescentou Sebastião.

No mesmo painel, Isabela Corby, cofundadora e advogada na Assessoria Popular Maria Felipa (APMF), trouxe números sobre a execução penal no Brasil. Existem 27 mil mulheres aprisionadas, de um total de 41 mil que cumprem pena. É a terceira maior população carcerária feminina de todo o mundo. 64% dela é formada por mulheres negras.

“A OAB precisa se posicionar, fortemente, contra o aumento de pena e também contra a criminalização indireta das famílias de quem já está preso”, disse Isabela.

Maria Teresa dos Santos, presidente da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, também tocou nesse último tema: “Toda mãe acaba sendo culpada pelas escolhas erradas de seus filhos e somos muito desrespeitadas na porta do presídio”. Ela defendeu um “abolicionismo penal” para evitar a guerra contra negros e periféricos, justificada por um suposto combate ao tráfico.

O presidente da OAB-RR, Ednaldo Gomes Vidal, denunciou a arbitrariedade do Estado nas execuções penais: “Faz-se de tudo para o preso não ter acesso à liberdade, ao mesmo tempo em que se viram as costas para as ações preventivas. Não há ressocialização nem para o preso e nem para sua família”.

Segundo ele, até o fim deste ano, o Brasil deve superar a marca de um milhão de pessoas, passar a Rússia e se tornar a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos e China.

Vidal também acredita que o advogado tem a missão de lutar pela ressocialização. “A política criminal tem de ser responsável, tem de estar em compasso com a sociedade.”

O advogado criminalista Maurício Campos Jr. frisou a importância do trabalho científico no poder público. “Para fazer diferente, é necessário aplicar uma ciência capaz de interferir diretamente nas taxas de criminalidade, com mapas integrados, com diagnose de espaços e um retrato dos crimes. Isso permite estabelecer metas de redução que podem ser muito efetivas, reduzindo as estatísticas”.

O conselheiro federal Hélio Leitão, ex-secretário de Justiça e Cidadania do Ceará, destacou a herança escravagista na segurança pública e no sistema prisional: “Somos herdeiros de um regime maldito de servidão humana e, também por isso, necessitamos de novos modelos. Há uma vocação no nosso Direito Penal para a repressão da periferia, de determinadas classes, salvaguardando outras. Há uma interferência em favor das classes dominantes desde o Legislativo, que se evidencia nas criminalizações primária, em que o preso é demonizado, e secundária, em que basta ir a qualquer presídio para se ver a realidade”.

A presidente da Comissão Especial de Segurança Pública da OAB Nacional, Yanne Teles (que mediou o debate), pediu que os palestrantes e espectadores pensassem na “militância advocatícia, para acabar com o preconceito e a desigualdade” e assumissem o “compromisso com as pessoas em estado de vulnerabilidade”.

Já Ana Karolina Sousa de Carvalho Nunes, conselheira federal e coordenadora de Política Penitenciária do Maranhão, disse que é preciso atenção “para as dificuldades que as pessoas trans enfrentam no cárcere, para as crianças do cárcere, os filhos de mães que estão presas e que já nascem nesse ambiente”. A advogada foi relatora da mesa.

Promovida pelo Conselho Federal da OAB e pela seccional mineira da Ordem, a conferência tem como tema “Constituição, Democracia e Liberdades”. Até esta quarta-feira (29/11), serão 50 painéis com temas variados, especialmente sobre questões atuais do país. Ao longo do evento, a OAB estima receber cerca de 400 palestrantes e 20 mil profissionais.

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