Opinião

Necessidade de contratação de seguro compreensivo de operador portuário

Autores

  • Ingrid Zanella Andrade Campos

    é sócia do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia vice-presidente da OAB-PE presidente da Comissão Nacional de Direito Marítimo do CFOAB professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) doutora em Direito e juíza suplente do Tribunal Marítimo.

  • Matheus Lourenço de Almeida

    é advogado do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia e membro da Comissão de Direito Marítimo Portuário e do Petróleo da OAB-PE.

20 de novembro de 2023, 12h21

As atividades de movimentação de passageiros ou movimentação e armazenagem de mercadorias, destinadas ou provenientes de transporte aquaviário, dentro da área do porto organizado, somente podem ser executadas pela própria autoridade portuária ou por um operador portuário pré-qualificado.

O procedimento para pré-qualificação de uma pessoa jurídica como operadora portuária foi previsto no artigo 25, da Lei nº 12.815/2013 e regulamentado pela Portaria nº 111, de 7 de agosto de 2013, da Secretaria de Portos da presidência da República (SEP).

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A atividade de operador portuário é desempenhada por conta e risco da pessoa jurídica pré-qualificada (artigo 1º, §3.º, da Lei nº 12.815/2013) e, em razão disso, a portaria SEP nº 111/2013 lhe exige a demonstração de idoneidade financeira mediante a comprovação, dentre outros aspectos, de capacidade para contratação de apólice do tipo seguro compreensivo padronizado para operador portuário no valor mínimo de, pelo menos, R$ 500 mil (artigo 9º, inciso VII).

Em síntese, o seguro compreensivo para operador portuário é um tipo de apólice de seguro projetada para cobrir os riscos associados às atividades realizadas por operadores portuários, incluindo cobertura para danos materiais a embarcações, equipamentos de manuseio de carga, instalações portuárias e terceiros envolvidos nas operações.

A portaria SEP nº 111/2013 não minudenciava o tipo de seguro e as coberturas básicas e/ou adicionais que deveriam ser contratadas pelo operador portuário, somente exigindo a comprovação de proteção securitária que abrangesse danos ao patrimônio público portuário, ao meio ambiente e a terceiros (artigo 9º, inciso VII, alínea “c”).

Com a entrada em vigor da resolução (RES) nº 3.274/2014, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), posteriormente revogada pela  RES-Antaq nº 75/2022, passou-se a prever que a autoridade portuária, o arrendatário, o autorizatário e o operador portuário tinham a obrigação de contratar seguro de responsabilidade civil e de acidentes pessoais para cobertura para os usuários e terceiros, sob pena de infração administrativa sujeita a multa de até R$ 100 mil.

O regulamento exigia do operador portuário a contratação de um seguro de dano, referente à responsabilidade civil, e de um seguro de pessoa, referente aos acidentes pessoais com usuários e terceiros.

A grande dificuldade enfrentada pelos operadores portuários se referia à contratação do seguro de acidentes pessoais, uma vez deveria ser diverso daquele contratado para os seus funcionários, prevendo cobertura para acidentes com frequentadores esporádicos das instalações portuárias, tais como trabalhadores avulsos, transportadores terrestres (caminhoneiros), funcionários de empresas terceirizadas, agentes de fiscalização, clientes do terminal etc.

O mercado securitário resistia em apresentar propostas para essa cobertura obrigatória para o operador portuário, sobretudo diante dificuldade de se estimar e informar a quantidade de pessoas que circulavam pelo porto, anualmente.

A dificuldade no cumprimento da RES-Antaq nº 3.274/2014 e, posteriormente, RES-Antaq nº 75/2022, acabou ensejando a emissão de Notificação para Correção de Irregularidade (Noci) ou mesmo a autuação de diversos operadores portuários. A Antaq então promoveu os estudos internos acerca do impacto e da efetividade da exigência de contratação de seguro de responsabilidade civil e de acidentes pessoais para os usuários e terceiros.

Os estudos resultaram na alteração da RES-Antaq nº 75/2022, mediante a publicação da RES-Antaq nº 104/2023, que especificamente alterou o artigo 33, inciso XVII, daquela norma, para prever a obrigatoriedade de contratação de seguro de responsabilidade civil, contemplando a cobertura básica quanto a danos morais, materiais ou corporais causados a terceiros, honorários advocatícios e custas judiciais, isso se os instrumentos contratuais ou convênio de delegação não previrem coberturas diferentes.

A alteração promove uma mudança no marco regulatório sobre o seguro compreensivo para operador portuário, uma vez que, doravante, somente se passa a exigir a contratação de seguro de dano (artigo 778 a 788, do Código Civil), que, no silêncio de instrumentos específicos de exploração indireta do porto organizado, deverá acobertar danos morais, materiais ou corporais causados a terceiros, honorários advocatícios e custas judiciais.

As coberturas para responsabilidade civil do operador portuário podem ser contratadas no bojo do próprio seguro compreensivo para operador portuário ou mediante apólice própria, nos termos da Circular nº 637/2021, da Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Anteriormente, sob a vigência da circular Susep nº 291/2005, que padronizava as condições contratuais para o seguro compreensivo para operador portuário, não se previa como cobertura básica a referente aos danos morais causados a terceiros, sendo esse risco, por vezes, previsto como excluído.

Porém, com a revogação da circular Susep nº 291/2005 pela resolução nº 407/2021, do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), os seguros do grupo marítimo passaram a ser previstos como seguros para cobertura de grandes riscos (artigo 2.º, inciso I, da RES-CNSP nº 407/2021).

A consequência deste novo enquadramento dos seguros do grupo marítimo interfere diretamente na liberdade negocial entre as seguradoras e o operador portuário, visto que a RES-CNSP nº 407/2021 expressamente previu em seu artigo 4º, caput e inciso I, a liberdade negocial ampla, de sorte que as partes efetivamente podem pactuar os clausulados que servirão como condições contratuais.

Outrossim, a RES-CNSP nº 407/2021 também permitiu que as partes do seguro do grupo marítimo incorporem à apólice regras constantes de regulamentações específicas de seguros de danos (artigo 4º, §3º), o que legitimaria a alteração contratual para cumprimento da RES-Antaq nº 104/2023.

Com efeito, vê-se que o regulamento securitário vigente permite a contratação do seguro compreensivo para operador portuário com ampla liberdade negocial, permitindo se incorporar às coberturas asseguradas os riscos cuja contratação de apólice de seguro é imposta pela lei ou pelo regulamento.

Dessarte, é de extrema importância que operador portuário procure se adequar aos termos da RES-Antaq nº 104/2023, sobretudo porque: 1) É possível que os riscos relacionados a danos morais, materiais ou corporais causados a terceiros, honorários advocatícios e custas judiciais não estejam cobertos ou mesmo sejam previstos como riscos excluídos nas apólices firmadas sob a vigência da circular SUSEP nº 291/2005; 2) O seguro compreensivo para operador portuário é classificado como seguro para cobertura de grandes riscos, conforme RES-CNSP nº 407/2021, permitindo a livre negociação entre as partes e a adoção regras constantes de regulamentações específicas de seguros de danos, o que justificaria a cobertura dos riscos previstos na RES-Antaq nº 104/2023; 3) As adequações aos termos da RES-Antaq nº 104/2023 devem ocorrer no prazo de 180 dias, contados do dia 1º de agosto de 2023, conforme artigo 3.º; 4) A não contratação/renovação do seguro compreensivo padronizado para operador portuário de acordo com a RES-Antaq nº 104/2023 ensejará a responsabilidade administrativa do regulado, conforme artigo 33, inciso XVIII, da RES-Antaq nº 75/2022, com possibilidade de cominação de multa de até R$ 100 mil.

Autores

  • é sócia do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia, vice-presidente da OAB-PE, presidente da Comissão Nacional de Direito Marítimo do CFOAB, professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), doutora em Direito e juíza suplente do Tribunal Marítimo.

  • é advogado do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia e membro da Comissão de Direito Marítimo, Portuário e do Petróleo da OAB-PE.

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