Visões e perspectivas

Vacinação compulsória e direitos fundamentais: o que pensa Gonet, indicado à PGR

 

12 de dezembro de 2023, 13h47

Doutor em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB) e exercendo o cargo de vice-procurador-geral Eleitoral junto ao Tribunal Superior Eleitoral, Paulo Gonet foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o cargo de procurador-geral da República e será sabatinado nesta quarta-feira (13/12) no Senado. Ele deve suceder Augusto Aras no cargo.

Indicado à PGR, Paulo Gonet Branco atua como representante do MP Eleitoral no TSE

Em entrevista em 2022, Gonet defendeu à revista eletrônica Consultor Jurídico uma atuação com mais cuidado e menos exploração midiática. Para o agora indicado à PGR, responsabilidade civil do Estado não é o mesmo que responsabilidade penal, civil e política do governante.

Em outra conversa, desta vez para a série “Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito”, da ConJur, Gonet ainda refletiu sobre o desempenho da função constitucional do Ministério Público para explicar que a busca por justiça não pode extrapolar as balizas do Estado de Direito.

Já em aula publicada no canal do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), ministrada em 2013, Gonet expôs suas posições em relação aos direitos fundamentais pauta que tem sido suscitada no contexto da PGR, em questões como liberdade de expressão e manifestação.

“Que valores são esses? São os que estão no caput do art. 5º, que enumera valores em que os direitos fundamentais são enumerados e proclamados. Vida, propriedade, liberdade, segurança, tanto pessoal quanto jurídica, e igualdade. Se isso é assim, nós temos duas situações a considerar: quando o próprio constituinte enumera quais são os direitos fundamentais, não vamos precisar, raciocinando como juristas, discutir a opção feita pelo constituinte”, disse Gonet.

“Mas será que estão consolidados apenas nesse catálogo, nesse título da Constituição sobre direitos fundamentais? A jurisprudência do Supremo indica que existem direitos fundamentais também fora desse título”, disse, citando como exemplo o princípio da anterioridade em matéria tributária.

Além de tecer suas considerações sobre o que são direitos fundamentais, Gonet pondera sobre a natureza política do Estado (que passou, a partir das revoluções francesa e norte-americana, a adotar caráter de garantidor e interventor) e sobre o absolutismo de determinadas garantias constitucionais.

“Uma outra característica que vocês vão ver, apontada muitas vezes, é a de que os direitos fundamentais seriam absolutos. O que seria isso? Muitas vezes se entende que o direito fundamental é absoluto e seria insuscetível de conflito com qualquer outro valor. Essa é uma ideia que está cada vez menos acolhida na doutrina e na jurisprudência”, argumentou.

“Mesmo o direito à vida está sujeito a uma limitação”, disse, citando a possibilidade de pena capital em tempos de guerra. Depois, afirmou que há, a despeito dessa corrente que defende que não há direito fundamental absoluto, um “núcleo duro” desse tipo de garantia, em que o Estado deve sempre observar determinado ponto quando há concorrência.

“Alguns dos preceitos da Constituição expressam o núcleo essencial de outro direito e, nesse sentido, não podem ser preteridos. No direito de não ser torturado, a expressão é o núcleo essencial do princípio da integridade física, psiquíca, moral do indivíduo. Se se admitir um indivíduo possa ser torturado, nós acabamos com o sentido da proteção do direito à integridade física do indivíduo.”

Gonet citou o mesmo exemplo para se referir à vacinação obrigatória e citar a relatividade dos direitos. “O Estado não pode vir espetar uma agulha em mim. O Estado tem que me proteger contra agulhadas dos outros. Mas ele vai ceder ao seu dever de proteger a saúde pública, e, nesse caso, vai prevalecer o dever de proteger a saúde de todos e vai levar a que o Estado possa me aplicar uma agulhada para me vacinar em uma campanha de vacinação obrigatória.”

Neste trecho da aula, Gonet utiliza o caso histórico da da “Revolta da Vacina” (motim popular contra a vacinação obrigatória para conter a varíola, em 1904) para afirmar que o Direito está submetido às alterações históricas, ou seja, a discussão acerca das normas também é produto de determinado tempo.

Por fim, ele usa outro exemplo para citar o “núcleo duro” dos direitos fundamentais: a condenação por meio de prova ilícita. Para Gonet, o uso de prova ilegal, ainda que para fundamentar crime, fere o princípio do devido processo legal e, por consequência, um direito fundamental do invivíduo. “Nesse sentido, talvez a gente possa dizer que há, na lista dos direitos fundamentais, direitos que valem em qualquer circunstância.”

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