Opinião

Mais da metade das infrações apuradas pelo Coaf são resultado de desinformação

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3 de dezembro de 2023, 6h09

O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), órgão que cuida da prevenção à lavagem de dinheiro, é responsável por receber a comunicação de outros órgãos e de pessoas que são obrigadas, por lei, a comunicarem operações suspeitas. Nos últimos anos, as comunicações de operações suspeitas vêm superando a marca de 7 milhões — até o dia 30 de setembro deste ano, já foram contabilizadas quase 6 milhões de comunicações aos órgãos de supervisão. Da mesma forma, as atividades do Coaf seguem ativas, já tendo elaborado mais de 13 mil Relatórios de Inteligência Financeira apenas em 2023.

No entanto, para que esse trabalho seja possível, são fundamentais as informações fornecidas por cada uma dessas pessoas e empresas que auxiliam na identificação de crimes e de organizações criminosas.

Muitas empresas e pessoas físicas desenvolvem atividades que apresentam maior risco de serem utilizadas como meio para lavagem de dinheiro. Outras desenvolvem atividades que facilitam o mapeamento de operações suspeitas. Sim, estamos falando das instituições financeiras, das joalherias, das revendedoras de veículos, mas não só delas. Existe também uma grande variedade de atividades listadas pela Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro que geram a pessoa ou à empresa regulada o dever de conhecer seus clientes e reportar determinadas operações a um órgão regulador ou ao Conselho, sob pena de sanção administrativa.  

O descumprimento das obrigações previstas na Lei de Antilavagem e nas diversas resoluções e atos normativos do Coaf e dos órgãos reguladores podem resultar em multa (que pode atingir até R$ 20 milhões), em inabilitação temporária, e, no limite, em cassação da autorização para o exercício de atividade, operação ou funcionamento.

O ano de 2023 já é o terceiro com maior valor de multas aplicadas na história do Coaf, totalizando R$ 32.943.491,00 até o fechamento do terceiro trimestre. Fica atrás apenas de 2021 (pouco mais de R$ 35 milhões) e de 2018, que atingiu a marca histórica de R$ 78,5 milhões. Já 2022, por sua vez, foi o ano em que o Coaf mais recolheu valores decorrentes das multas aplicadas, totalizando pouco mais de R$ 18 milhões.

Nesse contexto, o setor de joias é o que concentra o maior valor médio de multa, aproximadamente R$ 441 mil por sanção, e o responsável pelo recolhimento de quase R$ 20 milhões em multas aplicadas, de um valor acumulado que ultrapassa os R$ 71 milhões. As empresas de factoring, por sua vez, são as que concentram o maior número de multas, atingindo um total de aproximadamente R$ 90 milhões.

O setor de bens de luxo e de alto valor é o segundo colocado em número de multas (237), totalizando quase R$ 22,5 milhões. A definição de “bens de alto valor” — bem móvel cujo valor unitário seja igual ou superior a R$ 10 mil ou equivalente em outra moeda —, trazida pela Resolução nº 25 do Coaf, criada em 2013, tem a capacidade de abarcar empresas de diferentes setores que, por desconhecimento da legislação específica, não estão em conformidade com a legislação antilavagem.

Dados divulgados pelo Coaf, atualizados no final de setembro deste ano, revelam que 46,7% das infrações julgadas desde 2013 consistem na ausência de cadastro da pessoa regulada no sistema do conselho. Em 2021, esse número foi ainda maior: representou 66,7% do total das infrações administrativas. Na última década, 22,8% das infrações resultaram da falta em comunicar a inocorrência de operações suspeitas — comunicação anual que deve ser feita em janeiro, quando a empresa não detectou nenhuma operação passível de comunicação no ano anterior. A falta de cadastro no Coaf e a ausência da comunicação anual de inocorrência de operações revelam, acima de tudo, um desconhecimento generalizado da obrigação de conformidade com a lei.  

Dentre as pessoas obrigadas legalmente ao sistema de prevenção de lavagem de dinheiro, encontram-se, por exemplo, entidades cujo funcionamento dependa de autorização de órgão regulador dos mercados financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros; pessoas físicas ou jurídicas que exerçam atividades de promoção imobiliária ou compra e venda de imóveis, que comercializem bens de luxo ou de alto valor – bens móveis com valor acima de R$ 10 mil (inclusive de origem rural ou animal), que atuem na promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou eventos similares; além daquelas que prestam, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza, em operações financeiras, societárias ou imobiliárias, entre outras. As mais recentes integrantes da lista de pessoas obrigadas são as plataformas de apostas esportivas — incluídas em 2019 —, e as prestadoras de serviços de ativos virtuais — as exchanges, incluídas em 2021.

Contudo, não se trata apenas de evitar multas e outras sanções, mas, sim, de contribuir para a prevenção de ilícitos e para a identificação e sancionamento dos responsáveis. Nos últimos dez anos, 12,5% das infrações consistiram na falta de comunicações de operações passíveis e 4,9% em irregularidade ou descumprimento no cadastro e identificação de clientes. Por isso, não basta se identificar como pessoa obrigada e realizar o cadastro, se não houver conhecimento profundo do que deve ser reportado ao Coaf, da forma e da extensão das informações, além do prazo para comunicação de ocorrências.

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