Recurso inadmtido

Retroação do trânsito em julgado pode afetar elegibilidade, decide TSE

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18 de agosto de 2023, 8h26

A retroação do trânsito em julgado aceita pela jurisprudência brasileira quando recursos às cortes superiores são considerados inadmissíveis surte efeitos para a definição das condições de elegibilidade dos candidatos a cargos públicos nas eleições.

Com esse entendimento, o Tribunal Superior Eleitoral deu provimento ao recurso de Celso Cota (MDB). Eleito prefeito de Mariana (MG) em 2020, ele passou os três anos seguintes discutindo a viabilidade jurídica de sua candidatura.

Alejandro Zambrana/Secom/TSE
Ministro Floriano de Azevedo Marques aplicou jurisprudência do STF para entender cabível a retroação do trânsito em julgado
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A conclusão do caso na Justiça Eleitoral permitirá que Cota seja, enfim, diplomado no cargo. Até agora, a função de prefeito da cidade mineira vem sendo exercida interinamente pelo vereador ocupante da presidência da Câmara Municipal — foram três desde janeiro de 2021.

A decisão do TSE foi tomada por maioria de votos, conforme a posição do relator, ministro Floriano de Azevedo Marques. Ele foi acompanhado pelos ministros André Ramos Tavares, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Alexandre de Moraes, presidente da corte.

A candidatura de Celso Cota à prefeitura de Mariana foi indeferida pela Jusitiça Eleitoral mineira por dois motivos: ele estaria inelegível devido a uma condenação em ação por improbidade administrativa e não teria filiação partidária válida no momento do registro.

Confusão de datas
Cota, que foi prefeito da cidade mineira entre 2001 e 2008, foi condenado por improbidade administrativa e teve os direitos suspensos pelo prazo de sete anos.

O acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) que confirmou a condenação foi publicado em 3 de outubro de 2008, momento em que teve início o prazo para recurso às cortes superiores.

A defesa do prefeito interpôs, então, recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, mas não pagou o preparo recursal (o adiantamento das despesas relativas ao processo). Com isso, o STF inadmitiu-o, em decisão de 9 de novembro de 2009.

Isso fez surgirem dois momentos possíveis para o início da contagem da inelegibilidade de Celso Cota: a data da decisão de inadmissão do recurso pelo STF; ou, em caso de retroação, o dia 20 de outubro de 2008, quando a ação teria transitado em julgado, não fosse o recurso incabível.

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Ao divergir, ministro Cármen Lúcia criticou número de idas e vindas administrativas e processuais do caso
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Retroagir ou não retroagir
A jurisprudência do STF e dos demais tribunais brasileiros tem admitido essa retroação do trânsito em julgado. Ela se baseia na ideia de que a decisão que inadmite o recurso tem natureza jurídica declaratória, ou seja, pronuncia algo que já ocorreu anteriormente.

Assim, o trânsito em julgado retroage à data do fim do prazo para a interposição do recurso admissível. A posição, no entanto, tem sido aplicada no âmbito do processo penal, como forma de evitar que recursos procrastinatórios permitam a prescrição da punição punitiva.

Como já mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, os efeitos da retroação do trânsito em julgado na seara eleitoral são motivo de discussão. O TSE, inclusive, afastou essa possibilidade em julgamento de 2021, de relatoria do ministro Carlos Horbach (clique aqui para ler o acórdão).

O relator do caso de Mariana (MG), ministro Floriano de Azevedo Marques, propôs reconhecer a retroação com base em entendimento do STF segundo o qual recursos excepcionais, quando declarados inadmissíveis, não impedem a formação da coisa julgada, a qual retroage ao momento de esgotamento do prazo legal.

Até quando vai?
Definido o momento em que a suspensão dos direitos políticos passou a ser contada, a Justiça Eleitoral precisou decidir quando essa suspensão terminou para saber se Celso Cota poderia, enfim, ter concorrido ao cargo de prefeito em 2020. Outros dois marcos temporais afetaram essa conta.

O primeiro vem do fato de ele ter ajuizado ação rescisória para tentar desconstituir a condenação por improbidade administrativa, o que fez com que os seus efeitos permanecessem suspensos entre 2010 e 2015. A medida foi extinta quando a rescisória foi julgada improcedente.

Esses cinco anos, portanto, não foram computados na pena de suspensão dos direitos políticos do candidato. Logo, essa punição foi estendida até 19 de outubro de 2020.

Em um ano normal, as eleições teriam ocorrido no primeiro domingo de outubro, quando Celso Cota ainda estaria inelegível. Em 2020, no entanto, a epidemia da Covid-19 levou o Congresso a promulgar emenda constitucional para empurrar o pleito para 15 de novembro, o que mudou a situação de Cota.

Divergência
Abriu a divergência a ministra Cármen Lúcia, que, diante de todo esse contexto, classificou o número de idas e vindas administrativas e processuais como lamentável. "Estamos em agosto de 2023 e falando das eleições de 2020. E com decisões que se sobrepõem e se desentendem", criticou ela.

Em sua análise, o candidato não poderia ter recorrido porque a contagem da inelegibilidade não retroagiu e também porque sua situação partidária era irregular. Acompanhou o voto vencido o ministro Kassio Nunes Marques.

REspe 0600213-59.2020.6.13.0171
TPA 0602026-44.2022.6.00.0000

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